Não foi difícil para ela, que prefere se manter no anonimato, conseguir um emprego em um restaurante em Setúbal, cidade a 50 quilômetros de Lisboa, com algumas das mais belas praias portuguesas. Ficou bastante feliz por ter garantido um fonte de renda, mesmo sendo uma trabalhadora na informalidade.
A felicidade com que ia para o trabalho não demorou, porém, para se transformar em decepação. Em poucos dias, ela percebeu quem, na verdade, era o dono do restaurante que havia lhe estendido a mão. “Um português preconceituoso, que usa o fato de seus empregados estarem em situação irregular no país para humilhá-los e explorá-los“, diz a brasileira.
Ódio e preconceito
Ela relata que os mais agredidos pelo dono do restaurante são os negros, em particular, as mulheres negras. Há uma caboverdiana entre os empregados que chora todos os dias. O português não se cansa de chamá-la de “preta burra”. A mulher se sujeita às agressões porque precisa levar dinheiro para casa.
A brasileira se diz indignada com o comportamento do patrão. “Fico com ódio. Sou branca, mas sofro o preconceito de ser imigrante. Com os negros, é muito pior”, comenta. Ela espera que, tão logo consiga regularizar sua situação, possa abrir mão do atual emprego e obter uma vaga em uma empresa que pelo menos respeite a dignidade humana.
Para a carioca, o governo de Portugal tem facilitado muito a entrada de imigrantes no país devido à grande necessidade de mão de obra. O problema é que a burocracia do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), órgão que deveria auxiliar os trabalhadores que vêm de fora, dificulta a vida de todos, abrindo espaço para a exploração daqueles que estão indocumentados.
Golpistas em ação
Mudar de um país para o outro requer muito cuidado e planejamento. Há, inclusive, a possibilidade de se tirar vistos temporários de trabalho nos consulados de Portugal no Brasil, com validade de 90 dias, podendo ser renovados por mais 90. De posse dessa autorização, é possível procurar um emprego digno, legal, com registro e contribuições à Receita Federal e à Segurança Social (Previdência).
O advogado Bruno Gutman diz que muitos dos brasileiros que se mudam para Portugal acabam caindo no conto de influencers e de pessoas que se passam por advogados. Esses golpistas vendem facilidades e entregam prejuízos e transtornos de todos os tipos. São especialistas em se alimentar do sonho de imigrantes que lutam por uma vida melhor.
Gutman já fez quase 20 denúncias contra esses golpistas à Ordem dos Advogados de Portugal e ao Ministério Público. Vários processos estão em andamento. Para o advogado, um planejamento adequado, com o auxílio de profissionais capacitados, pode facilitar muito a vida dos brasileiros que desejam se mudar para Portugal.
Há, sim, boas oportunidades no país europeu, mas, também, muitas armadilhas. Nos últimos anos, tudo ficou muito caro em Portugal, sobretudo, a moradia. O aluguel de um quarto em Lisboa não sai por menos de 700 euros (R$ 3.850) por mês, praticamente o salário mínimo bruto, de 760 euros (R$ 4.180). Quem se submeter a pagar um aluguel nesse valor não terá sequer dinheiro para comer.