A real de Portugal: Segurança Social cassa abonos pagos a brasileiros

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O governo de Portugal decidiu dar uma sova nos imigrantes que vivem no país. Não bastasse todo o constrangimento imposto aos estrangeiros que estão na fila de espera por uma autorização de residência — são quase 400 mil pessoas, a maioria, brasileiros —, a Segurança Social, correspondente à Previdência Social no Brasil, decidiu cassar os abonos pagos a várias famílias de imigrantes.

A alegação para a suspensão dos abonos têm a ver com o vencimento das autorizações de residência, que não são renovadas porque o governo não tem competência para fazer isso. Ou seja, os imigrantes estão sendo punidos pela Segurança Social por erros do próprio governo. “O que estamos vendo é um absurdo, um desrespeito”, diz a advogada Priscila Corrêa.

Segundo ela, é de conhecimento de todos que vivem em Portugal que os órgão públicos não falam a mesma língua. “São vários os exemplos dessa dissonância de informações, como é o caso da Autoridade Tributária, que faz a penhora de bens sem a devida citação do cidadão”, afirma. “Agora, o órgão a praticar arbitrariedades é a Segurança Social, entidade que, em última análise, existe para garantir benefícios sociais à população, inclusive, a imigrante”, complementa.

O aviso sobre a cassação dos abonos pela Segurança Social começou a chegar aos imigrantes nos últimos dias, causando constrangimento e apreensão. “Tudo isso está acontecendo por causa da morosidade da Aima (Agência para Integração, Migrações e Asilo), que não consegue fazer o seu trabalho, isto é, prestar serviços à população estrangeira”, explica a advogada.

Vítimas da CPLP

Os casos mais emblemáticos da morosidade dos processos de renovação de residência pela Aima ou mesmo da falta de protocolos para a renovação desses documentos são os títulos ligados à Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). As autorizações para viver em Portugal estão vencendo, sem perspectiva de atendimento pela agência, e os abonos sendo cortados.

“O cancelamento do abono impacta, consideravelmente, o orçamento de famílias carenciadas, cuja maioria conta com um agregado familiar que ganha apenas um salário mínimo. Há exemplos repetidos em famílias monoparentais, nas quais as mães respondem por todo o recurso financeiro que sustenta a casa”, detalha Priscila.

Para ela, o mais trágico disso tudo é que, para os imigrantes que aderiram aos títulos de residência via CPLP, o próprio governo português instituiu a prorrogação desses documentos de residência até 30 de junho de 2024, em cumprimento ao decreto lei 10-A/2020. “Será que tudo se resume à falta de conhecimento dos funcionários lotados na Segurança Social a respeito do que está em vigor no próprio governo que lhes paga o salário?”, questiona.

No entendimento de Priscila, é possível dizer que se está diante de um flagrante ato de desobediência por parte da Segurança Social. “Mas é claro que os únicos prejudicados são os mais frágeis dessa relação, imigrantes que, como a senhora Jandira Rodrigues, cujo abono de família será cassado em breve, sob o falso argumento de que seu título de residência se encontra vencido”, afirma.

Força dos imigrantes

Priscila ressalta que o governo precisa olhar para essa fatia da população, pois os imigrantes vivendo em Portugal passam de um milhão. “Temos de ser vistos e ouvidos. Até quando o governo vai nos tratar como invisíveis? Numa realidade alternativa, se, do dia para noite, todos os imigrantes deixassem Portugal, o país quebraria, seja pela falência na arrecadação de impostos, seja pelo colapso no mercado de trabalho”, assinala.

Portanto, acrescenta a advogada, não basta apenas aceitar o dinheiro dos imigrantes. “Já passou da hora de entregar nossos direitos.
Quando os órgãos que asseguram as políticas públicas nesse país vão acertar os ponteiros e agir todos em uníssono em respeito ao cidadão, seja ele nacional ou imigrante? É exaustivo ver os impostos sendo gastos para custear uma máquina governamental altamente precária, que não garante a proteção dos diretos das pessoas comuns”

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Na avaliação da advogada, Portugal precisa de um “puxão de orelhas”. “Não é crível que, em pleno 2024, ainda não se tenha criado mecanismos eficientes de comunicação entre os órgãos públicos, que impliquem no cumprimento da Lei ao invés de ações desordenadas que perpetuam o desrespeito ao cidadão”, conclui.

Vicente Nunes