Solução distante

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POR PAULO SILVA PINTO

Será só amanhã a cerimônia de posse de Pedro Parente, no Planalto. Mas hoje ele já é presidente da Petrobras. É chegar e começar a trabalhar. Há muito o que fazer. Inicialmente, a troca de comando  foi mesmo marcada para esta data, assim que o nome foi anunciado, na semana passada. Depois, foi adiada para a próxima quinta-feira, devido aos procedimentos de aprovação do nome pelo Conselho de Administração. Ontem, com a oficialização da renúncia de Aldemir Bendine, o processo se acelerou.

Analistas no mercado de petróleo e gás são unânimes em dizer que não haveria nome melhor para o cargo. Parente reuniu vasta experiência no setor público e no setor privado. “Qualquer outro executivo de sucesso teria dificuldades para lidar com esse ser estranho que é o governo”, sublinha um deles. Parente foi o segundo homem do Ministério da Fazenda na consolidação do Plano Real. Depois, o presidente Fernando Henrique Cardoso nomeou-o ministro-chefe da Casa Civil. Ele teve a missão de equacionar nada menos do que imbróglio do apagão. Coordenou a transição para o governo de Luiz Inácio Lula da Silva e, desde então, vem comandando empresas de grande porte e lucrativas.

Ao elogiar suas credenciais, os analistas ressalvam, porém — e por isso falam reservadamente — que, mesmo tão capaz, Parente pode não conseguir resolver os problemas da maior estatal brasileira. “Não sei nem se Jesus Cristo conseguiria”, brinca um deles. A estatal tem obrigações de aproximadamente R$ 640 bilhões, incluindo a dívida líquida e contratos de leasing. Desse total,  80% são em moeda estrangeira. No primeiro trimestre, a empresa teve prejuízo de R$ 1,25 bilhão. Foi melhor do que os R$ 36,9 bilhões do período anterior.

A estatal perdeu R$ 20 bilhões só no que é investigado no âmbito da Lava-Jato. A Refinaria de Abreu e Lima deveria ter custado R$ 3 bilhões e saiu por R$ 20 bilhões, e ainda não está completa. No Comperj, no Rio de Janeiro, foram enterrados R$ 100 bilhões. Bendine ontem escreveu na carta de despedida que, em 15 meses , “são muitas as vitórias que podemos comemorar”. Para os analistas, não é bem assim. A dívida só fez crescer em sua gestão.

O presidente que sai se esforçou para reduzir cargos de gerência. Cortou cerca de 2.300. Mas isso é apenas 30% do total de 7.500 posições desse tipo. São pessoas que recebem até R$ 70 mil por mês, fora a participação nos resultados. Sim, mesmo com um rombo crescente, a empresa tem o costume de pagar esse tipo de incentivo. E Bendine não acabou com isso. Os programas de demissão voluntária (PDVs) implementados desde o início de 2015 serviram, em muitos casos, mais para que talentos saíssem da empresa do que para enxugá-la de fato, segundo os observadores de mercado. Os que foram colocados lá pelo que se chama de aparelhamento político, ao contrário, não têm  interesse em sair, pois não vão conseguir remuneração nem de longe no mesmo nível.

Resistência interna

A resistência das pessoas que ficam será uma grande dificuldade para Parente, na avaliação de analistas. Isso pode minar seu trabalho. Há quem tenha visto com grande desconfiança a estratégia anunciada pelo governo, de trocar apenas o presidente. É a solução mais rápida. Mas ele entra com uma diretoria e um conselho escolhidos por Dilma Rousseff, que não necessariamente lhe dará apoio para o que pretende fazer. “Seria preciso fazer o que Maquiavel recomenda: todo o mal de uma vez”, argumenta um especialista.

Desde o início do ano passado, a Petrobras parou de perder dinheiro com a venda de combustíveis, que estavam represados desde 2010, depois de acumular prejuízos de R$ 160 bilhões, nas contas do diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (Cbie), Adriano Pires. Foi possível à estatal recuperar cerca de R$ 20 bilhões desde então. Mas, a partir de duas semanas atrás, voltou a perder dinheiro por conta da recuperação do valor do petróleo. “É preciso que o país tenha uma política de preços de combustíveis”, aponta. Se houvesse algo sistematizado, seria possível até mesmo vender parte das refinarias. Do contrário, não haverá comprador.

Não se pode, porém, tomar decisões isoladas. “O que a Petrobras mais precisa é de um plano estratégico”, avisa Pires. Sem isso, não é possível nem mesmo vender ativos para reduzir o endividamento. Há risco de só conseguir valores muito baixos ou então de provocar outros desarranjos na economia. Gasodutos estão atualmente em processo de análise de compra por um grupo canadense. Pires alerta para o risco de que a venda de algumas propriedades desse tipo provoque a troca de um monopólio público por um privado. É preciso que a Petrobras diminua de tamanho. Mas decidir o que vender — e sobretudo como e quando — está longe de ser uma tarefa trivial.

Na avaliação de Pires, a empresa deveria migrar aos poucos para ficar apenas com a exploração de petróleo, e, mesmo assim, de forma desidratada. A lei dos contratos de partilha, em vigor para a exploração do pré-sal, exigem que ela tenha pelo menos 30% de participação em cada projeto. Mas essa participação chega a 40% em muitas das operações do Campo de Libra. Faltaram interessados para o restante no momento dos leilões. Dos 60 mil funcionários que a empresa tem, o ideal seria ficar só com a metade. Legalmente, é possível demitir, afinal são contratados pelo regime CLT. Conseguir fazer isso é outra história. Como outros integrantes do governo Temer, Parente entra com planos para dois anos e meio de gestão. Se conseguir fazer uma parte do que precisa ser feito, já acumulará imensas e reais vitórias. Não apenas um arremedo de discurso de despedida.

Brasília, 00h01min

Vicente Nunes