» CRISTIANO ÁVILA MARONNA
Presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais
» ILONA SZABÓ
Diretora-Executiva do Instituto Igarapé
» RENATO SÉRGIO DE LIMA
Diretor presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública
Publicação: 27/04/2018 04:00 – Correio Braziliense
Neste mês, a Câmara dos Deputados pode votar em regime de urgência uma lista de 15 projetos de lei indicados como prioritários pelo Grupo de Trabalho de Segurança Pública. Coordenado e relatado por parlamentares que integram a chamada “Bancada da Bala”, o GT tornou-se uma forma de aprovar com urgência propostas que, de maneira geral, podem agravar ainda mais a terrível situação da segurança pública em nosso país. Se aprovadas, tais propostas podem render votos aos seus autores e patrocinadores nas eleições de outubro, mas, em sua maioria, não contribuem para a construção de um Brasil mais seguro.
Os projetos de lei (PL) insistem em estratégias que já se mostraram ineficientes para reduzir a violência: prender mais e armar mais a população. Já temos a terceira maior população carcerária do mundo e o maior número absoluto de homicídios do planeta, mais de 60 mil por ano, e 70% deles cometidos com armas de fogo. Os PLs que passam pela ampliação de hipóteses de criminalização, como a de terrorismo (PL 9555/18), a criação do regime penitenciário de segurança máxima (PL 7223/06), a restrição a audiências de custódia (PL 8358/17) e até o ressarcimento do Estado pelos gastos com a captura do preso (PL 9525/18), ignoram o custo insustentável de uma população carcerária crescente, e o fato de que o crime organizado opera e recruta de dentro das prisões. Dessa forma, a alteração da Lei de Execução Penal (PL 9054/17), facilitando políticas de alternativas penais, é bem-vinda. Assim como são importantes as 16 medidas contra o encarceramento em massa, propostas pelo IBCCRIM e já apresentadas por diversos parlamentares, na Câmara e no Senado.
Com relação ao controle de armas, os projetos indicados como prioritários dobram a aposta em tudo aquilo que vai na contramão das evidências no que diz respeito à redução da violência. É o caso, por exemplo, da proposta que revoga o Estatuto do Desarmamento (PL 3772/12). De acordo com pesquisa realizada pelo Ipea em 2012, o aumento de 1% na circulação de armas de fogo corresponde a 2% de aumento no já estratosférico número de homicídios. Não há como insistir nesse caminho.
Matéria da revista britânica The Economist, em 5 de abril, apresentou dados do Instituto Igarapé que demonstram a gravidade da situação no Brasil e na América Latina, onde vivem 8% da população mundial e onde ocorrem 38% de todos os homicídios do planeta. A pesquisa também mostra que a violência é extremamente concentrada: 80% dos homicídios na região ocorrem em apenas 2% das ruas. Ou seja: a estratégia para reduzir a violência deve ser focada nos locais e grupos de alto risco, aliando prevenção e policiamento inteligente, investigação, integração dos atores do sistema de segurança e justiça criminal, foco na redução dos crimes violentos e na corrupção dos agentes da lei e na lavagem de dinheiro para desmantelar as organizações criminosas. Nesse sentido, o PL 2443/2015, que torna obrigatória a publicação da taxa de elucidação de crimes de forma padronizada, está no caminho certo.
A população brasileira está amedrontada e indignada com os altos índices de violência, que, como demonstrou pesquisa realizada em 2017 pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, incentiva a adoção de respostas autoritárias. As propostas selecionadas pelo GT da Câmara buscam aproveitar a justa preocupação da sociedade para obter ganhos políticos em ano eleitoral. Mas a popularidade não pode ser mais importante que a efetividade, pois os ganhos políticos terão custos imensos para toda a sociedade. Segurança pública não é lugar para populismo.
É importante que o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, não ceda ao caminho fácil — e equivocado — de pautar tais projetos em regime de urgência, para que sejam aprovados de forma açodada no Plenário. É preciso aumentar a participação social no debate, dando valor às evidências e ao conhecimento sobre o que funciona e o que não funciona para a redução da violência. A sociedade brasileira merece que o tema seja discutido com a responsabilidade que lhe é devida.
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