Não dá para negar: o projeto de fazer uma série de zumbis brasileira por si só já soa ambicioso. Nem que seja por curiosidade Reality Z, da Netflix, merece uma espiadinha. O problema é desgrudar da tela e abandonar a esperança de que, não é possível, isso vai melhorar uma hora. E não é que a hora chega?
Reality Z é daquelas séries que poderiam ser divididas em duas: uma muito ruim e outra até que boa. As intenções da produção dirigida por Cláudio Torres (da galera da Conspiração Filmes) e Rodrigo Monte (premiado diretor de fotografia) eram muito boas, mas sabemos onde algumas delas vão parar…
A série começa quando o reality show Olimpo, uma espécie de Big brother Brasil em que os participantes estão vestidos como deuses e são comandados pela voz de Zeus, está às vésperas de mais uma eliminação ー chamada de “noite do sacrifício”. O clima nos bastidores do programa não é dos melhores: o diretor Brandão (Guilherme Weber) trata todos mal, a apresentadora Divina (Sabrina Sato, que parece se divertir muito em cena. E é engraçado ver uma ex-BBB nesse papel) está insatisfeita e a criadora do programa, Ana (Carla Ribas), foi demitida e entrou em depressão. Em meio a tudo isso, o Rio de Janeiro é palco de um apocalipse zumbi.
As terríveis criaturas ー que parecem ter surgido direto da Sapucaí ー saem destruindo tudo o que vêm pela frente e transformando em zumbi quem é mordido por elas. Até que Nina (Ana Hartmann), espécie de faz-tudo do programa, percebe que dentro do olimpo eles estão seguros, devido ao esquema de segurança do confinamento. Ali, ela e os participantes estão a salvo.
Mais tarde, outros personagens vão se juntar a eles, como Ana e o filho Léo (Ravel Andrade), o próprio Brandão e o deputado Alberto Levi (Emílio de Mello). O problema é que esse lenga-lenga de gente fugindo de zumbi, virando zumbi e matando zumbi demora muito ー são pelo menos cinco episódios em que isso só é compensado pela ótima trilha sonora, que vai de Panis et circensis à belíssima Rosa de Hiroshima, na interpretação definitiva de Ney Matogrosso.
Se o roteiro dessa primeira parte não ajuda, o elenco não tem muito o que fazer. Carla Ribas segura bem o personagem dela, Ravel Andrade e Ana Hartmann não fazem feio também, mas os outros são um desfile de caricaturas sem fim ー mais por fragilidade dos personagens do que por falta de entrega dos atores. É tudo meio previsível: o diretor bravo, os bonitões burros, o policial truculento, o deputado corrupto e demagogo, a paixão à primeira vista da heroína Nina pelo herói TK (João Pedro Zappa).
Quando tudo parece perdido e a vontade é de eliminar Reality Z, surgem o 5º e, principalmente, o 6º episódios ー são 10 ao total. É quando os zumbis vão virando pano de fundo e perdendo espaço para os humanos que Reality Z decola. Pois é.. A série de zumbis não precisava tanto deles.
Com um pé na realidade e assumindo um tom mais cômico, a série se vale da micro sociedade que acaba se formando com os sobreviventes. E aí entram em cena questões ligadas ao poder ー quem é que vai comandar o grupo? Haverá um comandante? É interessante ver o como aquelas pessoas são capazes de tudo por poder. Só elas? Será?
Entre uma cena de ação e outra, numa dose tolerável e necessária para que o roteiro ande, Reality Z vai levantando a bola para que sejam discutidos homofobia, divisão de classe social, racismo, violência contra a mulher, machismo. Tudo meio às pressas, mas está lá o incentivo que se discuta o assunto.
É interessante notar que justamente a primeira metade de Reality Z é baseada numa minissérie britânica, Dead set, do mesmo criador de Black mirror, Charlie Brooker. Ou seja, é sob o comando total dos brasileiros que a série deslancha, o que dá certo alívio, pois o gancho para a segunda temporada está muito claro na cena final.
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