Rafael Delgado se diverte, mas levanta questões sérias sobre a sociedade brasileira ao viver o marido de uma recém-eleita governadora na série Eleita
Não é de hoje que o humor é uma poderosa arma de crítica social. A série nacional Eleita, em cartaz no catálogo do Amazon Prime Video, é um claro exemplo que abusa de piadas e situações absurdas para colocar o dedo na ferida de muitos políticos da vida real.
A ação de Eleita se passa num distópico e caótico Rio de Janeiro em que Fefê Pessoa (Cecília Falcão) sai da vida de influenciadora digital direto para a cadeira de governadora, mesmo sem ter menor experiência política.
“Pela sociedade ainda ser muito machista, muitas pessoas não conseguem encarar o fato de uma mulher ocupar um cargo importante. Acabam esquecendo que mais da metade da população brasileira é composta por mulheres, assim como no eleitorado”, aponta Rafael Delgado, intérprete de André, namorado de Fefê e chamado pejorativamente de “primeira dama” por alguns personagens.
A situação de André pode ser comparada pelo preconceito ao do governador eleito do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, cujo namorado foi hostilizado na campanha. “Não é questão de a sociedade estar preparada (para aceitar), é questão de aceitar e pronto. O que não podemos é observar essas atitudes criminosas acontecendo e deixar passar batido. Acredito que de 2018 para cá, houve uma forte onda extremista – guiada pelo presidente eleito nesse período – onde ele deixava claro em uma de suas frases que ‘as minorias devem se curvar às maiorias’. Dessa forma, muitas pessoas passaram a legitimar a sua opinião, criminosa, como algo normal. Não só estamos preparados para ver, mas como já está mais do que na hora”, critica o ator.
O próprio André tem falas politicamente incorretas que demonstram que a sociedade ainda está no processo de evolução. “O André é um cara que se atentou para os seus privilégios recentemente e quer fazer uma reparação histórica sobre tudo o que puder. Ele dá umas bolas fora justamente por estar tentando o tempo inteiro se desconstruir. Por conta de sua ingenuidade e impulsividade, acaba roubando o protagonismo de pautas que não dizem respeito a ele”, defende Rafael.
Outra conexão de Eleita com a realidade está no Rio de Janeiro retratado ー que poderia ser uma outra grande cidade brasileira. “Estamos caminhando a passos largos para chegar nesse futuro, infelizmente. Hoje podemos observar pessoas sem preparo algum alcançando cargos importantes na política, não só no Brasil, como no mundo também. Se não nos atentarmos ao que está acontecendo na política do nosso país, não saberemos escolher o nosso destino”, reflete o ator, que muitas vezes se espantou em estar vendo a realidade nas telas ou no roteiro.