Apresentadora Olga Bongiovanni comemora nova fase, conectada à internet e sem perder o público de vista. Em entrevista, ela fala sobre machismo, a volta à televisão e os 50 anos de carreira
Por Vinicius Nader
A apresentadora Olga Bongiovanni se aproxima dos 50 anos de carreira e dos 70 de vida. A experiência mostra que de uma coisa Olga não tem medo: de mudar, de se atualizar. Mas uma certeza também fica: a de que ela não deixa para trás a essência que a consagrou na televisão e no rádio.
“Quem não mudou, não sobreviveu, mas minha relação com a internet vem desde o início dos anos 2000”, afirma Olga, em entrevista ao Correio. “Falo direto com a dona de casa e mostro a realidade, como sempre fui: transparente com quem me assiste, e mesclando informação, entretenimento, receitas…”, completa a apresentadora, que hoje está à frente do Divina receita, no YouTube e na TV Evangelizar, e do Revista CBN, na rádio CBN.
“Aprendi a ter tranquilidade com as coisas em meus quase 50 anos de carreira. Porém, nesse momento, estou feliz, e me sentindo mais segura do que mais nova”, comenta Olga. Nem sempre foi assim.
Na entrevista a seguir, a apresentadora lembra das dificuldades de enfrentar o preconceito por ser mulher em ambientes dominados por homens, orgulha-se de ter participado da libertação feminina, não descarta a volta à televisão aberta e fala sobre a idade: “Os anos não me tiraram nada, me trouxeram leveza, segurança, experiência e sabedoria”.
Entrevista //Olga Bongiovanni
O Divina receita é gravado em sua casa e isso fica bem claro no programa. Esse é um meio de se aproximar do público?
Faz parte de um planejamento de alguns anos. Sonhei com essa possibilidade e isso automaticamente aproxima, sim. Trago todos para dentro da minha casa. Fãs e seguidores gostam. Eu já idealizei essa casa para que isso fosse feito. Então, tudo é muito genuíno. O que sai da horta vai direto para a receita e para o programa. Gosto de colocar a mão na massa. No início da pandemia, fui muito cobrada pelos meus seguidores para fazer receitas práticas, econômicas. Muitas pessoas nunca tinham cozinhado na vida, precisava realmente ser coisa fácil, então passei a fazer uma live por semana, a TV viu, gostou e me contratou.
Ao mesmo tempo não é uma exposição de sua vida particular? Como lidar com esse limiar, tão tênue?
Projetei casa, jardim e horta para serem mostrados nas redes sociais, então, para a TV nada muda. Outras dependências não exponho, e é tudo bem tranquilo… Só me aproximou mais do meu público por entender que tudo é de “verdade”. Estamos nesse momento e faço questão que seja. Ainda quando estava em São Paulo, pensava nessa possibilidade, cheguei a construir uma casa lá, mas depois vendi, dei um tempo e construí aqui (em Cascavel, no Paraná). Quando a internet começou a crescer, sabia que seria possível, e olha que foi rápido. Tudo que estamos vivendo me mostra que eu não estava errada. Faço gravações em minha casa há pelo menos oito anos, mas, com essa estrutura de hoje, há pouco mais de três anos. Trabalhar de casa não é futuro, já é o presente.
O retorno do público deve ser muito grande…
Fiz muita coisa, gravei muito vídeo e sei que, com isso, me mantive viva, saudável e ajudei muita gente. Meus seguidores me viram plantar, cuidar, colher e fazer a receita… Estivemos juntos o tempo todo. Lembro de uma planta que é o maior sucesso, ora-pro-nóbis, que é rica em proteína, fibras e vitaminas, e dos muitos pães que fizemos. Digo ‘fizemos’ porque as pessoas me retornam e, num retorno desses, me emocionei demais. Ela dizia: meu pai com 82 anos fez seu pão e ficou maravilhoso. Ele nunca havia colocado o pé na cozinha. Esse pão ao qual ela se refere foi um dos que tiveram mais de um milhão e meio de visualizações. Creio que nunca se fez tanto pão na vida (risos), mas foi muito bom. Plantar e cozinhar é pura terapia.
Com quase 50 anos de carreira na televisão, você migrou para a internet. Quais foram os principais desafios dessa mudança de plataforma?
Quem não mudou, não sobreviveu, mas minha relação com a internet vem desde início dos anos 2000. Lembro que, tanto na Band quanto na RedeTV, a produção dizia que era loucura querer responder os e-mails que chegavam a cada programa. Meu hábito do rádio, de responder os ouvintes que me enviavam cartas, me acompanha até hoje. Veio a tecnologia, agora o WhatsApp, mas nisso não mudei (risos). Aliás, até hoje recebo cartas. Quem escreve quer resposta. O desafio é dar atenção a todos.
O retorno do público da internet e da televisão é diferente? O pessoal da internet é mais imediato?
É diferente, sim, e no meu entendimento o público de TV se parece muito com o do Facebook, ambos diferentes do Instagram, por exemplo. Continuo sentindo o carinho e o retorno do meu público.
Você também está no Revista CBN, na rádio CBN. Dizem que o rádio é a melhor escola para quem quer fazer televisão ao vivo. Você concorda?
Com certeza, a maior escola. No rádio, o raciocínio precisa ser rápido, você tem de estar bem informado. Trabalhamos com um programa prévio, mas nada impede que eu tenha de falar com uma autoridade que resolva visitar a rádio por exemplo, um acidente grave, um evento importante que mereça destaque. Isso já aconteceu muitas vezes e continua acontecendo.
Mesmo estando no YouTube e no rádio, sente falta da televisão? Tem planos para voltar?
Daquela loucura do ao vivo? Hoje, vejo a loucura que sempre foi minha vida dentro de um estúdio. Continuo na TV, na rádio e, agora, na internet. Estou bem, tranquila com a TV Evangelizar, sem estresses e só alegrias. Se vier outro projeto em breve, vou encarar, se achar que, no momento, tem a ver comigo. Aprendi a ter tranquilidade com as coisas em meus quase 50 anos de carreira. Porém, neste momento, estou feliz, e me sentindo mais segura do que mais nova.
Você tem algum controle das receitas que mais agradam a seu público. Quais são elas? Elas também são as que você mais gosta de fazer?
Temos, sim, um retorno muito grande do nosso público de todo o Brasil, o que me deixa muito feliz. Poderia citar algumas, mas fico apenas com a receita de pão que ultrapassa um milhão e meio de visualizações. Receitas naturais também são bem-vindas, principalmente coisas fáceis e econômicas, que cabem no bolso de qualquer um. Falo direto com a dona de casa e mostro a realidade, como sempre fui: transparente com quem me assiste, e mesclando informação, entretenimento, receitas…
Nesse tempo de carreira dedicada especialmente ao público feminino você pôde acompanhar muitas mudanças sociais. Você se considera uma desbravadora, que ia levando as novidades para as mulheres que estavam em casa?
Posso me considerar, sim, pois sou muito chamada para falar sobre aquele tempo. As pessoas me colocam nesse lugar, pois sempre fui questionadora e procurava levar essa mulher, aquela jovem a questionar-se também, a não aceitar determinadas coisas, como a não ser submissa, a empregada dentro de casa fazendo tudo para marido e filhos. Fazia com que enxergasse seus sonhos, traçasse seus objetivos e fosse à luta. Lá pelos anos 1980, tive problemas com os conservadores, mas sobrevivi (risos).
Como você vê a condição feminina na sociedade brasileira de hoje? Ainda há muito preconceito, não?
O preconceito é endêmico em nossa sociedade e não só no Brasil. Fomos educadas para servir. Um absurdo isso. Ainda recentemente, no dia 24 de fevereiro, celebramos o direito de votar, que foi regulamentado em 1934. Como vês, falta muito ainda, e buscar por cidadania é um exercício diário para nós, mulheres, um pouco mais difícil — aliás, bem difícil. Mas temos eleições que se avizinham. Veja nossa falta de representatividade: de 513 deputados, somente 77 são mulheres. É por aí que as coisas também acontecem.
Imagino que, quando você começou, o ambiente da televisão era ainda mais masculino. Como foi lidar com isso? O assédio moral era muito grande por você ser mulher? Você percebia?
Em 1974, quando comecei no rádio, mulher, só a do cafezinho e a da limpeza. Foi preciso provar que tinha capacidade, um absurdo. Quando comecei em TV, em 1982, o ambiente era menos hostil para mulheres, mas desafiador. O assédio sempre foi escrachado, de todas as formas, mas sobrevivi.
Você está perto de completar 50 anos de carreira e 70 de idade. Esses números pesam para você?
Muito pelo contrário. Estou num momento muito bom da minha carreira, descobrindo coisas interessantes, aprendendo sempre. Os anos não me tiraram nada, me trouxeram leveza, segurança, experiência e sabedoria.