Apuro visual e boas interpretações marcam Desalma. Leia a crítica!

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Série do Globoplay, Desalma tem a cara do mercado internacional e mostra que o Brasil sabe fazer histórias de terror, sim!

Existe uma espécie de maldição sobre o audiovisual brasileiro, que não consegue manter uma boa produção de filmes e séries de terror, embora o gênero caia cada vez mais nas graças de diretores e roteiristas. A primeira temporada de Desalma vem para quebrar essa corrente e mostrar que temos condições de fazer um produto com a cara do mercado internacional. Os 10 capítulos da série escrita por Ana Paula Maia e dirigida por Carlos Manga Jr. estão no catálogo do Globoplay desde 22 de outubro. A segunda temporada já foi anunciada pelo serviço sob demanda da Globo.

A ação de Desalma se passa na pequena Brígida, cidade ao sul do país que teve colonização escandinava, com soviéticos que logo se dividiram entre russos, eslavos, croatas. Era para ser uma cidadezinha simpática, daquelas onde a gente sente que o tempo parou. Mas, em 1988, a tradicional festa de Ivana Kupala foi marcada por uma tragédia: a jovem Halyna (Anna Melo) foi encontrada morta no rio da cidade. O rapaz Aleksey Skavronski (Nicolas Fernando) acaba confessando o crime e passando sete anos na prisão. No dia em que sai da cadeia, ele é misteriosamente atropelado e morto.

A morte de Halyna marca Brígida para sempre. A começar pelas reações da mãe dela, a bruxa Haia (Cassia Kis). Ela acredita que a filha é uma Mavka, ser da mitologia escandinava que ronda as florestas depois de morta em busca de Justiça e de vingança e que, assim como uma Iara, atrai homens para se afogarem por meio do canto. Haia aguarda o momento certo para, numa transposição de almas, trazer a filha de volta e em segurança.

Fotos: Estevam Avellar/ Globo. Casia Kiss vive a misteriosa bruxa Haia

Outra consequência do crime é que a festa de Ivana Kupala nunca mais havia sido realizada. Até que, 30 anos depois, a cidade começa a ser sacudida novamente por lembranças do passado. Primeiro, os moradores resolvem resgatar a festa popular (que rende imagens lindas, com diversos figurantes e ares de superprodução). “Despertar a escuridão tem suas consequências”, alerta a sábia Haia.

Logo na primeira sequência de Desalma, vemos o suicídio de Roman Skavronski (Nikolas Antunes), numa condição completamente envolta por misticismo. Desolada, a esposa dele, Giovana (Maria Ribeiro) e as filhas Melissa (Camila Botelho) e Emily (Juliah Mello) se mudam para Brígida, cidade em que nunca haviam estado e sobre a qual Roman evitava falar. Elas vão morar na casa onde ele passou a infância e a juventude, até misteriosamente deixar a cidade logo após o assassinato de Halyna.

O passado se repete em Desalma

A festa de Ivana Kupala rende lindas imagens a Desalma

O passado de todos em Brígida guarda segredos e rancores ligados àquela noite de 1988. Isso fica bem claro quando Giovana é recebida por Ignes (Claudia Abreu), prima de Roman e irmã de Alexsey, um dos melhores amigos de Roman na juventude. Ignes tem um filho, o menino Anatoli (João Pedro Azevedo), peça-chave para que se entenda os horrores de Desalma. Ele passa, em pouco de tempo, de uma criança dócil a um ser atormentado e agressivo.

A retomada da festa de Ivana Kupala e a morte de Roman servem como sinal para Haia de que a hora de agir está chegando. O passado começa a se repetir, em pequenas coisas, que vão crescendo com o passar do tempo.

E aí Desalma se transforma numa verdadeira série de terror, com direito a sustos pelo meio do caminho, seres esquisitos, mistérios e muitas reviravoltas ー atenção para o episódio 6 (chamado não à toa de Revelações), que quase zera tudo. Apesar da temática pesada ー que só piora quando as relações familiares de Brígida começam a ser apresentadas ー , é fácil maratonar Desalma. Os ganchos de um episódio para o outro são responsáveis por atiçar a curiosidade do público e, quando você vê, Haia já te enfeitiçou.

Fotografia bela e boas interpretações

Claudia Abreu se destaca como Ignes

A atmosfera de terror só tem a ganhar com a caprichada direção de arte. As locações foram muito bem escolhidas e a fotografia é de primeira. Os efeitos sonoros e visuais ganham a chancela da consultoria da mesma equipe por trás do fenômeno Dark, da Netflix. Metáforas como a tradicional sopa de beterraba degustada pelos nórdicos e a linda cena em Iryna (Nathalia Falcão) boia no rio ao lado de porcos mortos vêm embaladas em muito bom gosto.

O som e alguns diálogos continuam sendo um calo a ser contornado pelo audiovisual brasileiro. Mas nada que comprometa a experiência.

Ainda mais porque Desalma conta com a direção de Carlos Manga Jr. A princípio, o tom sóbrio das pessoas no falar, no pouco gesto, no figurino, no olhar sempre indireto incomoda. Logo se nota, porém, que não estão ali à toa. As pessoas de Brígida são assombradas ー mesmo os jovens, que não eram nascidos quando Halyna morreu sofrem com a história. O elenco é certeiro: corresponde às expectativas com raras exceções e alguns destaques.

Claudia Abreu está em um dos melhores momentos da carreira. Ignes exala sofrimento e quando Anatoli passa a ser alvo do mistério que cerca Brígida e a família dela, o desespero é passado a cada olhar da precisa atriz. O menino João Pedro Azevedo mostra que tem futuro num papel introspectivo e muito duro, difícil.

Anna Melo: nome para ser anotado

Duas jovens também se saíram bem em Desalma. Mesmo com pouco tempo de cena, Anna Melo enche a tela quando aparece e sua Halyna conquista o público de cara. Na pele da rebelde e sofrida Melissa, Camila Botelho podia ficar nas caras e bocas de uma adolescente mimada que teve que sair de São Paulo para uma cidade pequena. Mas ela vai além e, assim como a personagem, mostra amadurecimento a cada cena. É bom anotar esses nomes.

Bruce Gomlevsky como Ivan Burko, outro amigo de infância de Roman envolvido nos mistérios de Brígida; Isabel Teixeira, como Anele, misteriosa esposa de Ivan e melhor amiga de Ignes desde sempre; e Giovanni de Lorenzi como um dos filhos deles, Maksym, também têm bons momentos.

Com a segunda temporada confirmada, Desalma tem pela frente mais uma maldição a ser quebrada. A de séries que poderiam ser resolvidas numa primeira leva de episódios e ganham uma continuação. O gancho apresentado soa repetitivo, mas, claro, pode surpreender. Espero que mais esse desafio seja vencido sem custar a alma de nenhum crítico.

Vinícius Nader

Boas histórias são a paixão de qualquer jornalista. As bem desenvolvidas conquistam, seja em novelas, seja na vida real. Os programas de auditório também são um fraco. Tem uma queda por Malhação, adorou Por amor e sabe quem matou Odete Roitman.

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