Lugar de criança é em realities? Especialistas e pais se dividem sobre os benefícios que participar de uma competição traz para os pequenos
A presença de crianças e jovens em trabalhos televisivos e cinematográficos eventualmente coloca os telespectadores com o coração na mão a se perguntar: será que esse tipo de trabalho é saudável ao mais jovens?
Ainda mais se levadas em consideração as diversas vertentes que englobam estar na tevê e no cinema, especialmente a fama. Entre um crescimento ao redor dos olhos do mundo e pouca privacidade, os jovens têm de aprender a lidar com desafios únicos para a idade.
Agora, além da atuação, um novo tipo de atração tem contado, cada vez mais, com a participação de crianças: os reality shows. Desde The voice kids, até MasterChef júnior e Júnior bake off Brasil, os programas de competição são uma atração à parte, se composto por crianças.
Laércia Vasconcelos, especialista em análise do comportamento e professora do Departamento de Processos Psicológicos Básicos do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília (UnB), explica que há maneiras de os pais protegerem os pequenos no mundo do entretenimento.
Dentro de um contexto trabalhista, Laércia deixa que claro, que antes de tudo, qualquer atividade realizada pela criança tem de estar amparada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). “Nós precisamos, em primeiro lugar, proteger os direitos das crianças dentro de qualquer situação e a melhor forma de fazer é olhando as leis relativas a isso. O Brasil tem uma legislação específica pra as crianças junto ao estatuto que tem sempre de ser respeitada”, aponta.
Para além dos aspectos legais, a professora ressalta alguns pontos que merecem atenção. O primeiro deles é entender a entrada no mundo das artes como algo desejado pela criança e jamais imposto pelos pais. “O adulto precisa entender se o repertorio dessa criança é harmonioso com as novas demandas, refletir se a criança tem um perfil que é adequado a essas novas escolhas. A introdução gradual no universo das artes, é apenas um dos exemplos, de um processo de aprendizagem que deveria estar sendo feito em um passo a passo com prazer. Isto é muito diferente de impor novas tarefas a serem executadas pela criança. Ao contrário, o ‘gostar de’ foi desenvolvido em um ritmo que respeita as opiniões da criança”, defende a professora.
Laércia ainda completa: “Seria agressivo e nocivo para a criança se esse caminho fosse imposto pelo adulto. Isso seria muito perigoso para a criança, porque está sendo apresentada subitamente, sem preparo gradual, uma nova demanda. Mais grave ainda, seria estarmos diante de uma nova demanda com foco exclusivamente financeiro”.
Gradual
Uma atitude importante por parte dos pais é ouvir os filhos sobre a participação deles no programa, estando atentos ao que os pequenos querem dizer sobre a experiência. “O importante é a introdução de forma gradual das situações da vida, isso tudo é uma base para um repertório de desenvolvimento. Isso pode ser feito pelo esporte, por atividades lúdicas e etc., é muito importante que aprender é uma via de mão dupla. Então a criança aprende na relação com os outros e o adulto aprende na relação com essa criança. Nessas trocas de aprendizado, é necessário que tenhamos adultos que sejam bons ouvintes, mas o que mais encontramos são falantes, que gostam de mandar, utilizam em alta frequência ordens, pedidos e conselhos, sem manterem um verdadeiro diálogo, escuta da criança,”, defende a professora. Mas fica a dúvida: entre atuar e participar de um reality show competitivo, qual pode ser o mais nocivo à criança? Laércia propõe uma análise equilibrada sobre o assunto, vendo pontos positivos e negativos na prerrogativa competitiva.
“A relação entre cooperar e competir está presente na vida de uma criança, em vários segmentos, do desenvolvimento biológico até o psicológico. Ao considerarmos um contexto de programa de televisão essa situação deveria ser cuidadosamente adaptada a cada criança, com um passo a passo. Assim, evitaremos potenciais efeitos adversos para a criança, favorecendo também o seu potencial criativo minimizando pressões e críticas”.
A professora sustenta: “Nós precisamos considerar a relação da criança em um contexto de fama precisa, antes de tudo, de um acompanhamento familiar amoroso, atendimento escolar continuo e enfim, ter suas necessidades básicas sendo atendidas”.
Cantora mirim
Semifinalista do programa The voice kids 2016, a jovem Iris Pereira, foi um daqueles talentos prematuros que enchem os olhos do público. A garota fez a inscrição no programa com apenas 8 anos, e logo ganhou a atenção dos jurados, especialmente do seu treinador, o cantor Carlinhos Brown.
A mãe de Iris, Kelen Pereira, contou ao Correio que o sonho de cantar sempre foi algo perseguido pela filha, e que a participação no reality foi quase impossível de negar.
“Ela sempre gostou de cantar, escolhia os brinquedos para isso, gostava de desenhos de cantar. Ela assistia ao The voice adulto e queria muito cantar lá. Eu sempre falava que só mais velha e ela insista”, lembrou a mãe, que ainda completou: “Um dia eu cheguei em casa e ela tava pronta pra gravar um vídeo, tinha se arrumado e tudo mais, então nós gravamos. Eu tive receio de mandar, porque ela era muito pequena, mas ela me cobrava muito e eu acabei mandando”.
Kelen ainda aponta que o nervosismo do começo não foi absoluto, é que existiram sim muitos pontos positivos durante a experiência. “Pra ela foi um aprendizado muito grande, o convívio com outras crianças, foi uma experiência de vida incrível. Foi importante também pra acreditar na força dos sonhos, agora ela sabe que se a gente sonhar, se a gente batalhar, pode alcançar as coisas. Foi positivo também pra ouvir críticas construtivas”, defende.
Mas a mãe não é ingênua a ponto de achar que tudo foi um mar de rosas e lembra aos parentes mais preocupados que podem existir percalços. “Eu acho que esses pais preocupados em colocar os filhos em realities têm alguma razão. O meio artístico é meio cruel em alguns aspectos, tem de entender que a criança vai ser um pouco de produto. Com a Iris eu converso muito sobre os prós e os contras e sobre tudo que acontece. Digo que ela tem de tirar o melhor da experiência. Tanto os pais quantos as crianças precisam ter muita dedicação, muito estudo. Mas ela tem de entender que a vida é assim: vai ter altos e baixos sendo na televisão, ou não”. ressalta Kelen.
Mais
A carreira mirim deu certo para eles…
Michelle Williams
A talentosa Michelle chegou na tevê com apenas 13 anos na série Baywatch e agora brilha no cinema. Ela concorreu ao Oscar quatro vezes, sendo a última ano passado por Manchester à beira mar.
Ariana Grande
A cantora teve a infância e pré-adolescência marcada por protagonismos em séries, e isso não a impediu de se transformar em uma das maiores estrelas pop do mundo atualmente, com 24 anos.
Ryan Gosling
Com participação cativa no The Mickey Mouse club, Gosling cresceu no meio do furacão de Hollywood, mas isso não afetou sua qualidade da atuação dele, que brilhou em longas como La la Land.
…, mas não foi tão feliz assim para outros
Britney Spears
A cantora que também cresceu à frente das câmeras com o The Mickey Mouse club. Mas, em meados de 2009, o excesso de fama parece ter levado a artista a uma crise. Mas tudo bem, hoje, ela já está brilhando novamente.
Lindsay Lohan
A atriz começou a atuar com apenas 12 anos, e alcançou grande fama mundo a fora. Entre festas e muitos flashes teve a carreira quase arruinada após perda de contratos. Agora ela está se restabelecendo, e voltando as telas.
Macauley Culkin
O ator concorreu ao Globo de Ouro quando era criança, mas uma adolescência baseada em abusos parentais acabaram levando Culkin a caminhos atribulados. Atualmente, ele tenta voltar a atuar.