Novela Um lugar ao sol não deixa de falar sobre tabus, como diferença etária entre casais e masturbação feminina, mas dá show de sensibilidade em cenas delicadas e necessárias
Afastada das novelas desde As filhas da mãe (2001), Andréa Beltrão é um dos destaques de Um lugar ao sol, atual trama das 21h. Não é novidade o talento de Andréa, mas a personagem dela, a ex-modelo Rebeca, traz assuntos tabus para a ala careta da sociedade e vem chocando alguns lares recatados por aí. Além do show usual de Andréa, é de se notar o tom escolhido pela autora Lícia Manzo: o da delicadeza.
Está lá para quem quiser ver: as cenas sensuais de Um lugar ao sol são bem mais sensíveis e bem dirigidas do que a alarmada Verdades secretas 2 e provam que a sensualidade e o explícito não estão necessariamente juntos.
Rebeca tem vários arcos que geram polêmica: o medo de envelhecer e a relação com um jovem amigo da filha dela, por exemplo. Dois deles, porém, se sobressaíram recentemente: masturbação e estupro.
Em uma cena aparentemente banal ー Lícia é das autoras para quem não existem cenas à toa ー Rebeca dá um chega pra lá no marido, Túlio (Daniel Dantas), e diz que não quer relações sexuais naquela noite. Ele vai tomar banho e, quando volta, encontra a esposa se masturbando e tendo prazer daquela forma. Depois de um breve diálogo, Túlio se mostrou conformado e compreensível, embora estivesse magoado por dentro. Magoado porque ela, mulher, não pode se masturbar. A cena viveu o céu e o inferno nas redes sociais. Quem aprovou destacou a beleza, a sutileza, o diálogo, a atriz. Quem não gostou simplesmente concorda com Túlio.
Semanas depois, Cecília (a ótima estreante Fernanda Marques, com quem o Próximo Capítulo vai bater um papo especial em breve), filha de Rebeca e Túlio, descobre que a mãe foi o motivo que levou Felipe (Gabriel Leone) e terminar o namoro com uma das melhores amigas dela, Bela (Bruna Martins). Arrasada, Cecília vai a uma festa da faculdade, bebe demais e é estuprada por um rapaz que se aproveitou do fato de ela estar bêbada.
Mais uma vez, Lícia Manzo acertou no ponto em cena que poderia seguir vários caminhos. Poderia ser simplesmente narrada ou beirar o mau gosto. Mas não. A autora brilhou ao escolher, novamente, a trilha da delicadeza, deixando claro o “não” de Cecília ao rapaz, minando desde a raiz os internautas que diriam que o sexo ali era consensual.
Um lugar ao sol veio com cara de “tapa buraco” na Globo, que investe todas as fichas na sucessora, o remake de Pantanal. Mas mostra, a cada capítulo, a força de uma novela construída por boas histórias narradas da maneira certa.