Karolini Bandeira*- Portadora de um Cardioversor Desfibrilador Implantável (CDI), aparelho implantado no coração similar a um marcapasso, uma candidata do concurso da Procuradoria Geral do Distrito Federal (PGDF) alega ter sido retirada da sala de prova e impedida de realizar o exame para o cargo de técnico jurídico por não ter informado o uso do desfibrilador no ato de inscrição. “O aparelho em questão não me faz ser considerada portadora de necessidades especiais e não me faz necessitar de nenhuma ajuda na hora da prova”, argumentou a mulher. A prova do certame foi aplicada em 29 de agosto.
Ao advogado Max Kolbe, Flávia Rocha explicou que portava a carteira do CDI no dia dos exames e que, inclusive, inicialmente foi liberada e entrou na sala de aplicação: “Fui fazer a prova para PGDF e entrei às 13h45, horário informado quando fiz a consulta ao horário e local de prova. Entreguei à chefe de sala minha CNH e a Carteira de portador de CDI e expliquei que tinha um CDI. A chefe mandou entrar normalmente, sem nenhum questionamento.”
Segundo a candidata, entretanto, a equipe a retirou da sala pouco antes da prova começar. “Faltando uns 30 minutos para a prova começar, chegou um senhor e pediu para eu lhe acompanhar até a sala da coordenação. Me informou que era o procedimento padrão. Perguntei a ele se precisava levar meu material e ele falou que precisava apenas do meu documento, que podia deixar meus materiais na sala e que ele iria apenas informar a coordenação e eu voltaria para fazer a prova”, disse.
Ao chegar na coordenação, de acordo com a mulher, ela foi informada por uma das organizadoras que passaria por um detector de metais e, caso não apitasse, poderia retornar à sala. Conforme conta, o detector apitou no local do CDI e, mesmo assim, foi assegurada de que não tinha problema e que ela deveria aguardar apenas o Cebraspe, organizador do concurso, ser comunicado.
“Ela ficou esperando uma resposta e nada… Começou a prova e ela falou que eu não me preocupasse porque eu teria esse tempo a mais para fazer a prova. Uns 10 minutos depois do início da prova, ela informou que eu não poderia fazer, pediu para uma pessoa me escoltar até a sala para buscar meus materiais e depois até a saída da faculdade”, disse.
A candidata foi informada de que deveria ter esclarecido, no ato de inscrição, que possuía o CDI. A candidata alega que já participou de outros concursos públicos e sempre requisitavam apenas a carteira de portadora do implante.
Para Flávia, o pedido para atendimento especial não era necessário por ser um implante interno e não interferir na execução do exame. “O CDI ou marcapasso não nos torna pessoas com deficiência e não necessitamos de ajuda para realizar as atividades”, afirmou.
A mulher, que alega ter saído do local de provas escoltada por organizadores, descreveu a situação como humilhante: “Infelizmente é muito humilhante ser retirada de um local de prova como eu fui. Se isso é normal para o Cebraspe, não é normal para mim. Fui impedida de fazer uma prova porque tenho um aparelho que não incapacita em nada.”
Em resposta ao Papo de Concurseiro, o Cebraspe afirmou que o edital de abertura do certame informa a obrigatoriedade de pedido de atendimento e uso de aparelhos nas provas. Confira, na íntegra, o pronunciamento da banca:
“O Cebraspe informa que, ao se inscrever no certame, os participantes aceitam as normas contidas nos editais e comunicados da seleção. No caso em comento, o edital prevê a regra de solicitação de atendimento especial caso haja necessidade, por parte do candidato, de utilização de dispositivos durante a realização das provas.
Para melhor clareza, o subitem está copiado abaixo.
8.4.8.6 O candidato que, por motivo de doença ou por limitação física, necessitar utilizar, durante a realização das provas, objetos, dispositivos ou próteses cujo uso não esteja expressamente previsto/permitido neste edital nem relacionado nas opções de recursos especiais necessários elencadas no sistema eletrônico de inscrição, deverá, conforme o prazo descrito no subitem 8.4.8.7 deste edital:
Para o advogado Max Kolbe, que analisa o caso da candidata, o edital de abertura não é claro o suficiente quanto à declaração do uso de CDI nas inscrições. “Não há nenhuma regra clara, ou sequer expressa e objetiva, quanto à necessidade de se informar a banca examinadora da utilização do marcapasso, até porque, friso, seria teratológico afirmar que a candidata, por motivo de doença, teria de usar durante a realização da prova o seu CDI”, argumentou. E reforçou: “A candidata só conseguiria utilizar o seu CDI se ela na realização da prova estivesse passando por um procedimento cirúrgico, algo absurdo de se imaginar.”
Para Kolbe, o certame deve ser suspenso, com nova realização dos exames: “É óbvio que a regra expressa é para a utilização de equipamentos externos. Assim, em virtude de ausência de previsão legal ou sequer de norma contida no edital do concurso, não nos resta outra saída a afirmar que o concurso deve ser suspenso com a reaplicação da prova, em virtude de ato discriminatório e antijurídico praticado pela banca examinadora”, defendeu.
*Estagiária sob supervisão de Mariana Fernandes
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