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“O voluntariado te traz uma razão a mais para viver”

Dione, voluntária no projeto Correndo Com Você/ Foto CV 2024

Nesse período de fim de ano o espírito solidário fica mas evidente e multiplicam-se as ações que beneficiam pessoas que vivem em situações de mais necessidades. É uma boa época pra falar de voluntariado, de pessoas que se dedicam, não só no Natal, mas durante o ano inteiro, tempo e diferentes tipos de colaboração a instituições e projetos, no exercício de um olhar mais amoroso com o outro.
No último post eu apresentei ao leitor o projeto Correndo Com Você, um grupo de voluntários que correm no Parque da Cidade aos domingos guiando deficientes visuais.
Depois de conhecer o projeto, falei Com Dione Tupino, uma voluntária que participa há dois anos guiando DVs.
Dione, é gaúcha de Porto Alegre, 64 anos, viúva, tem uma filha, é engenheira civil e trabalha acompanhando reformas de casas para venda. Ela é voluntária em 3 projetos diferentes e defende o voluntarismo como uma forma de praticar o bem para as pessoas e, principalmente, pra si mesmo.

Dione guiando o corredor venezuelano Anderson, deficiente visual. Foto CV novembro 2024

Perguntas para Dione:

P- O que é pra você esse trabalho de guia?
R- É um trabalho voluntário. Eu conheci o projeto porque morava aqui no Sudoeste e outro dia eu estava pedalando aqui no Parque e eu vi o pessoal correndo, um guiando o outro. Aí vi eles reunidos aqui na administração, parei e perguntei: como é que funciona isso, é uma corrida que vocês estão fazendo, como é? Ela me explicou que eram pessoas com deficiências visuais e que tinha voluntários que poderiam se inscrever e guiar eles, porque eles queriam fazer exercício físico.
Ai eu disse: então domingo que vem eu venho. Eu comecei a vir e a guiar. O Marcos (um dos idealizadores) dá sempre uma instrução pra quando a gente começa. Eles fazem um trabalho treinamento, põem uma máscara na gente e fazem outro guia guiar a gente pra gente ver a sensação que eles têm de serem guiados, e assim a gente vai aprendendo a guiar. E eles participam de corridas também, a gente guia eles nas corridas. Todo ano eles participam daquela corrida “De olho na saúde”, que dá premiação em separado para os DVs e é uma emoção enorme, ver a alegria deles chegando e podendo fazer uma atividade física, é muito gratificante.

P- Quando você entrou para o projeto já estava correndo?
R- Eu estava treinando pra fazer a São Silvestre, fiz, e já fiz também duas meias maratonas. Mas tem gente aqui que é guia e já fez mais de 20 maratonas, o Arnaldo. Ele está guiando uma menina que começou com 5km, já está correndo 10km e ela tem vontade de fazer uma meia maratona.

P- Normalmente você corre quantos quilômetros com eles?
R- Aqui a gente corre de 4km a 10km, porque a volta total do Parque é de 10km. Mas a gente está com um projeto esse ano dos guias pegarem a turminha deles pra fazer uma meia maratona.

P- Quando vocês chegam, pegam qualquer um que queira correr ou já tem corredor definido por guia?
R- A gente tem um grupo de Whatsapp e os DVs põem lá se vão vir e os guias também. Quando a gente chega aqui o Marcos faz o pareamento de acordo com o pace de cada um, diz quem vai correr com quem. E tem o pessoal de caminhada também. Uma pessoa quer ser voluntária e não corre, só caminha, tem os DVs que não podem correr porque têm problema físico, além de visão, então eles caminham. Então tem vaga pra todo mundo, pra correr, pra caminhar.

P- Você sempre frequentou o Parque?
R- Sempre, porque morei sempre aqui perto. Eu adoro o Parque, eu digo que é o maior parque urbano da America, então nós somos privilegiados. Hoje mesmo o Anderson, que correu comigo, ele é venezuelano e disse que a qualidade de vida aqui em Brasília é completamente diferente da Venezuela, porque esse parque aqui é maravilhoso. Eu corro muito no Ibirapuera mas o Ibirapuera é um terço disso aqui. Então ter essa área aqui no centro, no meio da cidade… O Central Park, em Nova York, também é bem menor do que esse, então nós somos muito privilegiados por ter o maior parque urbano da América Latina dentro da nossa cidade.

P- Você frequenta o Parque só aos domingos?
R- Não, eu venho quase todos os dias porque eu participo de uma assessoria de corrida e a gente corre aqui com a assessoria 3 vezes por semana, então eu venho de 4 a 5 vezes por semana aqui.

P- O que você diria para as pessoas sobre participar dessa comunidade esportiva?
R- É acho que é um projeto de vida e uma alegria muito grande você poder colaborar com a satisfação e a felicidade do outro, do próximo, né? Então o projeto de ser voluntário aqui é mais ou menos sobre isso. Você consegue levar uma atividade física, mas além da atividade física, a amizade, o carinho e a resiliência com o próximo.

P- Essa alegria você também sente por parte deles?
R- Na realidade eu sou voluntária em 3 projetos, esse é um deles. Eu participo da vela adaptada com pessoas com deficiência e de um outro que distribui sopas para os moradores de rua. Então, já faz parte da minha vida o voluntariado, porque eu acho que o voluntariado te traz uma razão a mais pra viver.

P- Era isso que ia lhe perguntar agora, o que você acha do voluntariado?
R- Eu acho fundamental o voluntariado, inclusive eu não entendo porque que no Brasil eles não incentivam tanto. Uma amiga da minha filha fez um intercâmbio nos Estados Unidos e lá, no High School, é uma matéria obrigatória da escola. Eles fazem voluntariado, tem voluntariado com pessoas com deficiência, tem voluntariado com crianças, com animais, e é uma matéria do currículo. Então porque o Brasil não faz isso, gente? Pra já começar desde criança a incentivar as pessoas a ter compaixão com o próximo e ajudar tanta gente que precisa.

P- Desses 3 projetos que você participa, esse aqui você sente o resultado mais próximo?
R- O da vela também, a gente levou uns competidores para a Alemanha e a menina ganhou o segundo lugar, foi uma emoção incrível.

P- São também deficientes visuais?
R- Não, são deficientes físicos, a maioria com lesão medular, com pernas paralizadas, braços. Nós ajudamos uma menina lá que era Filipina, logo que chegamos para montar os barcos a menina nos pediu ajuda e eu e o técnico ajudamos, ela nunca tinha montado aquele barco e chegou em terceiro lugar. Então a nossa atleta chegou em segundo e a que nós ajudamos chegou em terceiro, foi uma emoção muito grande.

P- O que mais você pode falar sobre essa satisfação de participar do projeto correndo com alguém guiado por você?
R- Olha, só vindo aqui e correndo, porque a maioria deles pegam pódio em corridas, nessa “De olho na saúde”, sempre tem uns 3, 4 que pegam pódio, então a alegria deles é muito grande e da gente também, porque a gente faz parte. E quando o pessoal vê… agora mesmo eu tava correndo e um menino passou de bicicleta e falou “que legal”, e chamei pra participar com a gente. Esse, que já correu 20 e tantas maratonas, foi eu que chamei, ele estava passando e eu chamei pra nos ajudar. Então se alguém vier participar, vai continuar vindo sempre.

P- Dione, como é você como pessoa?
R- Eu acho que eu sou uma pessoa normal. As pessoas dizem que eu sou fora da curva e eu não acho, sou uma pessoa normal. Por causa da minha idade, por tudo o que eu faço, o povo acha que sou fora da curva das outras pessoas da minha idade. Eu acho que sou normal, as pessoas que não fazem o que eu faço é que são anormais (risos).

P- E no que você acredita?
R- Eu acredito que fazer o bem, faz bem pra você e para o outro. Não tenho religião, não acredito em religião nenhuma, acredito em Deus e em fazer o bem. Eu sou contra religião, mamãe até brigava comigo porque eu não tenho religião, mas eu não tenho porque não quero ter regra, eu já tenho regra demais na minha vida, pra quê vou pegar uma religião pra ter regra? Não quero que ninguém mande em mim, eu mando em mim e faço o que eu acho que é certo. E o que é certo é isso, é você olhar para o próximo como realmente se fosse seu irmão e, se precisar de ajuda, você poder ajudar dentro das suas possibilidades, e ser feliz e não fazer mal pra ninguém. Acho que isso é uma religião, não ficar seguindo regra, ir numa igreja, ficar rezando quinhentas Ave Marias, acho que isso não tem nada a ver. Mas cada um tem a sua opinião e eu claro, respeito a de todo mundo.

P- Qual o seu recado para as pessoas?
R- Venham para o Parque participar do projeto, vocês vão ter uma alegria imensa no coração quando virem a alegria deles tendo concluído 4km, andado 3km. Correr 10km, correr uma meia maratona e chegar num pódio com alegria e um sorriso enorme, porque isso é o que recompensa.

Voluntários do projeto Correndo Com Você/ Foto CV novembro de 2024
cilenevieira

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  • Ledor do CB há décadas, agora é que fui conhecer este interessante blog. Em cinco postagens escritas há dez anos ou mais, formulei algumas sugestões que a meu ver incrementariam o fantástico espaço verde, pertencente a todos(as). Se um dia tiver curiosidade, acesse tais postagens. A primeira está em http://mapati.com.br/blogmapati/parque-da-cidade-3/ Abraços

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