O livro Os onze — o STF, seus bastidores e suas crises (Companhia das Letras, 372 páginas,R$ 49,90), dos jornalistas Felipe Recondo e Luiz Weber, revela como o poder se desenvolve na mais importante Corte judiciária do país. Em parte das vezes, os movimentos dos mais poderosos são tão comezinhos que beiram o jocoso, como no caso das indicações de ministros.
Recondo e Weber mostram que em vários momentos o poder está mais na capacidade de veto (o veto-player) que os ministros têm na escolha da composição do tribunal do que necessariamente na indicação de um nome. Um dos episódios relatados é o processo de substituição de Nelson Jobim, em 2006. O primeiro nome do Planalto — na época comandado por Lula — era o da advogada Misabel Derzi.
A indicação da mineira Misabel era de Fernando Pimentel, na época ainda prefeito de Belo Horizonte. O então senador Antônio Carlos Magalhães (1927-2007), ao questionar o ministro Gilmar Mendes, acabou por avisar ao ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos (1935-2014), que a advogada não passaria no Senado. Sobrou assim para Cármen Lúcia, que não recebeu nenhum dos vetos dos poderosos.
A partir de uma volta à história, as movimentações do presidente Jair Bolsonaro para a troca de ministros no Supremo não são inéditas, afinal uma cadeira na Corte significa o maior de todos os pode-
res no Judiciário, refletindo de maneira direta no Executivo e no Legislativo. Além do mais, desde o mensalão, a visibilidade do cargo é quase futebolística. Hoje, parte da população consegue citar os 11 integrantes da Corte talvez de maneira mais natural do que o time da seleção brasileira. A visibilidade ultrapassou os limites da Praça dos Três Poderes, chegando às ruas, para o bem e para o mal.
Nos casos de popularidade positiva, basta pensar em Joaquim Barbosa, que chegou a vislumbrar uma candidatura ao Palácio do Planalto e, para isso, se filiou a um partido. Desistiu antes mesmo de iniciar a campanha. Mas tais exemplos ficam por aí. De maneira geral, a imagem do Supremo para uma parte da
população — aquela que vai para a rua nas manifestações da direita pró Bolsonaro — está arranhada, principalmente depois de decisões progressistas no campo social e de atos nada razoáveis para a saúde do combate à corrupção. Veja a história do Coaf.
E aqui voltamos ao governo de Jair Bolsonaro e a relação com o Supremo. Um dos aspectos a ser considerado na largada é o barulho feito pelo presidente para as indicações, expondo os candidatos à vaga. Primeiro foi Moro, que como já disse alguém entrou numa sabatina pública quase dois anos antes de alguma vaga ser aberta na Corte. Por mais que a ida do ex-juiz tivesse como propósito a busca pela confortável cadeira no plenário do Supremo, ele sempre poderia dizer que não era bem assim. Perdeu o argumento quando o próprio Bolsonaro revelou a trama, ou pelo menos parte dela. Restou o desgaste.
A ação boquirrota de Bolsonaro se estende em quase todos os compromissos, deixando exposto a cerimônia das disputas internas pelo poder. Vide os casos da Polícia Federal — a fritura do atual diretor, Maurício Valeixo — e a conturbada indicação do chefe do Ministério Público. O eleitor dele pode até gostar de tais espetáculos.
Temos um presidente autêntico, sem papas na língua e corajoso o suficiente para expor os bastidores e as tramoias das negociações políticas. Vale lembrar, entretanto, do veto-player dos ministros do Supremo.
O importante não está na indicação, mas no poder do toco, para usar uma expressão do basquete. A vida não será tão fácil para os indicados de Bolsonaro.
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