Para minha amiga Clarice

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No início dos anos 1950, Clarice Lispector assumiu a identidade de uma personagem chamada Tereza Quadros. O desafio era escrever uma coluna para um periódico de vida muito breve, o Comício, e dar conselhos simples para as leitoras. Não vou aqui tentar discutir a organização da sociedade patriarcal, menos ainda lamentar o papel feminino de coadjuvante daquele tempo. Mas, se possível fosse, adoraria convidar Clarice para um café, hoje, anos 2017.

Alguns dos conselhos dela para as leitoras estão reunidos no livro Correio Feminino. Confesso que, sem tentar ponderar o contexto social, fiquei abusada com as sugestões da tal Tereza. A maioria era de regras de como a mulher “elegante” deveria se comportar para agradar ao marido ou, ao menos, não desagradar aos possíveis esposos.

Mulher tinha que estar bonita e bem cuidada. Sempre impecável em casa para que ele não desviasse o olhar para maiores atrativos na rua. Ela dizia solidária: “A sedução diária é cansativa. Eu sei, amiga, mas o que há de se fazer. Afinal, precisarmos deles para completar a nossa felicidade, não é mesmo? Façamos, portanto, por conquistá-los”.

Eu responderia a ela: não, amiga Clarice, nenhum homem é necessário para completar a felicidade de uma mulher. Um companheiro será bem-vindo se vier para somar, mas não a qualquer custo. Sejamos sedutoras da forma que nos sentirmos atraentes diante do próprio espelho. Que nos olhem aqueles que apreciarem nossos diferenciais e nossa personalidade.

Clarice sugeria não usar muita maquiagem, menos ainda decotes ousados ou roupas justas ao corpo. Joias em excesso era coisa de mulher exibida, e, certamente, “nenhum homem apreciaria esse tipo”. Amada Clarice, ou Tereza, felizmente, descobrimos que podemos nos vestir como bem quisermos. Há mulheres clássicas, mais discretas, mas há as que amam as cores nos lábios e contornos nos olhos. São igualmente belas e atraentes. Não importa se os homens estão de acordo, graças a Deus. Aliás, eu, por exemplo, te sugeriria encontrar um companheiro que te desse de presente um lindo vestido com recorte sexy, seja no busto, nas costas ou com uma fenda nas pernas. E, eu, só não desfilo com joias por lamentável falta de verbas.

A escritora também criou uma lista do que chamou de “manias que enfeiam”. Na ordem, dizia que os homens “detestavam” mulheres que estavam sempre comendo um “chocolate, caramelo ou sorvete. Minha cara, lamento pelas minhas amigas que tenham ao lado um parceiro que lhes controle o cardápio. Torço é para encontrar um que me encha de bombons, me convide para jantar com direito a uma gorda sobremesa ou assista a um filme comigo, dividindo uma lata de sorvete de doce de leite.

Rir alto ou falar muito também foram consideradas “manias prejudiciais, que costumavam fazer os homens fugirem apavorados desse tipo de mulher”. Clarice, eu, por exemplo, quero mais que esse sujeito desapareça mesmo da minha vida, na velocidade da luz. Que se mantenha longe um tipo que me impeça de gargalhar ou de desembestar a falar se tenho uma boa história para contar.

Desejo que você também esbarre com alguém que, ao contrário, ria muito com você, que, aliás, te faça rir exageradamente alto, aquela risada que precisa ser extravasada por ser deliciosa demais para ser contida. Minhas preces é para que eu, você e a moça que me lê agora conheçamos um cara que não só nos deixe falar, como se interesse por nosso falatório, pergunte e queira saber mais. Mas, cara Clarice, cada um sabe de si, e não estou aqui para dar conselhos, nem mesmo a você, que, como Tereza, sugeriu que as mulheres deveriam virar bonecas imóveis e perfeitas para serem merecedoras de um amor.

 

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