Dona Ilaíde conseguiu mobilizar o sentimento de milhares de pessoas na última semana. Um gesto dela perturbou a ordem das emoções a ponto de virar notícia e disputar a atenção dos leitores que acompanhavam o desenrolar do trágico acidente aéreo que matou mais de 70 pessoas na Colômbia.
Dona Ilaíde ganhou páginas de jornal, posts compartilhados nas redes sociais, repetidas imagens de TV e não porque era uma das mães que iriam enterrar o filho morto na queda da aeronave. Ela se tornou personagem simplesmente por ter sido nobremente humana.
Dona Ilaíde, durante uma entrevista, deixou sua dor alguns minutos de lado para perguntar ao repórter o tamanho da dele, que também perdia colegas de profissão. O abraço entre os dois estarreceu as pessoas, que se desacostumaram a conjugar o verbo solidarizar.
Dona Ilaíde foi empática e generosa. Reconheceu que não só seu coração estava dilacerado e abriu os braços para acolher o sofrimento alheio. Tanta gente estranhou porque estamos cada vez mais egoístas e vaidosos.
O homem está virando animal. Deixando sua essência de viver em bando, sua natureza de manada para se isolar, acompanhado apenas do próprio ego. Estamos perdendo a capacidade de nos relacionarmos, com medo de que oferecer afeto ao outro nos roube o amor próprio.
Acusamos de carente quem solicita nossa companhia. Vemos como desespero quem se mobiliza para nos encontrar. Chamamos de solitário quem aprende a gostar de outra pessoa. Não perdoamos quem nos fere porque esquecemos que todos somos feras no instinto: magoamos quem nos magoa.
Mas somos todos humanos. Erramos, amamos, pedimos desculpas e desculpamos. Somos gente, com habilidade de entender a dor e a falha do outro. Obrigada, Ilaíde, por nos lembrar que ainda podemos ser bichos homens.
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