O homem que eu gostaria de ser me encanta pela estética, pelos trejeitos e pelos gestos. Não conheço os dramas nem os segredos dele, caso contrário, deixariam de ser confidências. Desconheço também quais os pesos leva dentro de si, só estou certa de que, se eles existem, não roubam sua leveza. Sei de sua personalidade o que ele decide deixar transparecer. E essa escolha me fascina.
O homem que eu gostaria de ser não é o mesmo que eu gostaria de ter. Ele me seduz, não por despertar meu desejo de fêmea, mas por me fazer invejar a sensualidade de lado seu lado feminino. Roberto é o nome dele e fomos apresentados pela dança. Ele é professor de stiletto, um ritmo que faz o corpo se mover com certa dose de luxúria. Em cima de um salto, ele é mais sexy do que muitas de suas alunas, entre elas eu, desajeitadas e pesadas com um sapato alto nos pés.
O homem que eu gostaria de ser pode até vestir terno, mas usa com desenvoltura a bota desenhada para ser calçada por elas. E faz isso com maestria. Caminha como se estivesse em uma passarela. Ah, como cobiço a sua elegância, que dispensa o rebolar vulgar de um largo quadril. O compasso de suas longas pernas, por si só, hipnotiza. Que mulher não amaria ter o charme desse homem? Eu sim!
O homem que eu queria ser não poda a essência feminina. Ao contrário, pelos passos da dança, quer resgatá-la do esconderijo em que foi ocultada por medo de repressões pudicas. Como homem, ele reconhece a beleza e até se apropria um pouco da delicadeza atribuída a elas. Assim, vira espelho para tantas mulheres endurecidas nessa despropositada luta para se livrarem de características tão nossas, mas, lamentavelmente, ainda consideradas inábeis e frágeis.
O homem que eu tinha vontade de ser é dono de um belo sorriso. De gente que sabe que encanta pela alegria e pela espontaneidade. Se, em algum momento, não for uma risada completamente genuína, ao menos é capaz de ofuscar qualquer padecimento dele e dos outros. Roberto é debochado, mas é o mesmo que se concentra e incorpora o personagem de alma lasciva, em apenas um segundo. Nenhuma mulher naquele salão é capaz de lhe roubar o olhar sedutor, parte da encenação que orienta aqueles passos.
O homem que eu gostaria de ser é viril não pela brutalidade. Ele mostra que o masculino é forte quando consegue ser gentil e generoso com o feminino: o dele e o das mulheres. Seu magnetismo está justamente na suavidade. Como me sinto desgraciosa diante da coordenação perfeita de seus braços, pernas, cabeça e quadril. Todas as partes de seu corpo conduzidas em harmonia pelo som. Enquanto me movo com a graça de um paquiderme, como se meus membros pesassem toneladas, ele desliza. E me desconcerto diante dele, tanto por frustração como por admiração.
Além de me conduzir pelo movimento do stiletto, Roberto me ensina a cada aula a me deixar ser levada pelo ritmo. Sem amarras, sem algemas, sem vergonha. Ele nos mostra, a todas nós mulheres, que é possível, simplesmente, deixar o corpo ter vontade própria; que está permitido ceder a um desejo liberto, e, por que não, por vezes, até libertino? A verdade é que o homem que eu gostaria de ser é o mesmo que me mostra, pela dança, a mulher que eu quero e posso ser.