O conceito de louco está banalizado. Há muito deixou de ser referência apenas de diagnóstico psiquiátrico. Pode-se dizer que todo mundo ficou maluco de vez. Se você é sincero demais, certamente é pinel. Caso fale de menos é igualmente tantã. Moça que ama em demasia é desequilibrada, e a que nunca teve uma paixão precisa urgentemente de um divã. Quando o cara liga no outro dia é carente digno de terapia; caso não telefone nunca, é inseguro traumatizado. Talvez um tarja preta ajude o pobre rapaz.
E assim estamos todos surtados. O que não precisa ser interpretado como algo ruim, porém. Ser louco virou predicado, parte da essência humana. O louco é ser também engraçado, encantadoramente autêntico. Em tempos de tantas máscaras e relações superficiais, se a maluquice traz à tona verdades pessoais, então, prefiro viver em um manicômio.
A loucura coletiva e popularizada, essa sem CID psiquiátrico, revela a alma de cada pessoa. Aquilo de mais genuíno que levamos dentro de nós mesmos. A escritora Tati Bernardi acaba de lançar o livro Depois a louca sou eu, em que faz graça do próprio descontrole emocional. Em um dos capítulos, ela fala que temos todos um bicho interno, reprimido, domado, justamente por ser imprevisível. Concordo com ela. A diferença é que algumas pessoas libertam essa fera. Dizem o que pensam, fazem o que manda o coração e ganham o título de totocas da cabeça.
Eu mesma já tentei subjugar meu animal interior — algumas vezes, arredio, e, outras tantas, dócil em demasia —, com a química da indústria farmacêutica. Não só eu, quase a totalidade das pessoas que conheço já tomaram umas gotinhas da serenidade. Ritalina e rivotril estão aí disponíveis para amansar a mente e roubar um pouco da personalidade.
Prefiro ser doida. Daquelas de jogar pedra. Prefiro os igualmente malucos. Gente fora da casinha tem alma liberta e, por isso, incomodam tanto. Fazem o que os outros não têm coragem de assumir. Já dizia Osho, o guru indiano e mestre da meditação, que, ficar louco vez ou outra é necessidade básica para ser são.
Por isso, não me ofendo se me definem desequilibrada. Gosto da imprevisibilidade do pensamento descontrolado. Em cartaz, está o filme Nise, que conta a história da psiquiatra brasileira que revolucionou, nos anos 1950, o tratamento de pacientes esquizofrênicos. Atribui-se a ela, justamente a médica do domínio da mente, uma frase de grande lucidez:“Não se curem além da conta. Gente curada demais é chata!” Estou com ela. Acredito que destempero dos pensamentos tem, verdadeiramente, seu charme.
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