Cresci em uma família de poucos afagos. Trago uma genética do “não me toques”. Não concluo isso como um lamento ou com qualquer crítica, mas é algo que se repete por gerações. Quando abraço minha avó, por exemplo, só sinto os tapas apressados dela em minhas costas, como quem diz:”Vamos acabar logo com isso!”.
O mesmo acontece com meu pai, que fica imóvel quando o abraço. Uma mistura de constrangimento, com a falta de jeito, e hábito de ser enlaçado por braços alheios desde muito pequeno. Já minha mãe, nos acostumamos aos beijos que são na verdade uma aproximação de bochechas. Os lábios só fazem o estalo.
Talvez eu seja diferente. Preciso de braços ao redor do meu corpo, mas igualmente tenho dificuldade em fazê-lo. Essa semana, porém, cheguei em casa tarde da noite e tudo que mais queria era ter alguém para eu abraçar e por quem eu fosse abraçada. Quando assumi isso, ouvi que tal necessidade era se mostrar carente, dependente do outro em demasia.
Eu já acho corajoso compreender que não somos autosuficientes. Assim, liguei para uma pessoa querida. Tarde da noite, ela estava pronta para dormir e pedi para que descesse até ao estacionamento do seu prédio só para que eu pudesse abraçá-la. Ela foi. E agradeci, com choro contido, literalmente, por aquele aperto físico.
Quem não precisa de um? Abraço tem poder de juntar os cacos da alma. É o momento que o outro sente seu odor. É a única chance de carregar o perfume alheio nos próprios cabelos, tamanha proximidade entre os corpos. Abraço esquenta a pele, alivia a tensão do pescoço que se acomoda no cangote do outro e desacelera o coração.
Criadora da “Terapia do Abraço”, Kathelenn Keating defende que abraço é curativo. Além de melhorar a autoestima – afinal, alguém deseja se pendurar em seu pescoço -, também emagrece – já que, com as mãos ocupadas e enroscadas em alguém, não há como comer.
A Sociedade Brasileira de Inteligência Emocional reforça a tese e garante que se amassar mutualmente libera hormônios de prazer e reduz estresse. Tudo por causa de braços simultaneamente estendidos.
E, acredite, ninguém está imune à essa necessidade. No livro O antropólogo de Marte, o neurocientista Oliver Sacks narra a história de Temple Grandim uma autista, que, como vítima dessa condição mental, se tornava arredia a qualquer contato humano.
O especial funcionamento do cérebro dessa engenheira não lhe roubou, porém, as necessidades mais instintivas. Com inteligência aguçada, ela transformou uma calha de conter gado em uma máquina compressora na qual ela se acomodava e ajustava a pressão para sentir a sensação de um abraço. Dizia sair mais calma dali e sentir-se tocada, já que o funcionamento de sua mente resistia que isso fosse feito por uma pessoa.
Por isso, ao terminar de ler todo esse devaneio, abrace os seu amigos, parentes, companheiros, colegas de trabalho. Entregue seu corpo e suas emoções aos braços de outro. É sanador. Outra opção, pode ser ir para Nova York e encontrar um dos gatos sarados e sem camisa que carregam um cartaz em plena Times Square pedindo e oferecendo abraços, “free”. Garanto, no mínimo, alguns minutos de diversão e prazer. Além de uma bela foto, claro.
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