Podem me chamar de covarde, esquizofrênica e até de habitante de uma realidade paralela. Mas, preciso confessar: faço parte do grupo de brasileiros que não conseguiu, em todos esses meses, assumir fortemente uma opinião diante dos rumos políticos que arrastam o nosso país. No dia em que a Câmara dos Deputados decide pelo processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, ainda não sei qual posição escolher.
Não queria no comando uma Dilma coagida, um Lula investigado, um inexpressivo Temer, menos ainda um Eduardo Cunha, que mudou o foco dos holofotes e conseguiu se livrar de uma apuração feita do Conselho de Ética, ao colocar a presidente na linha de tiro e transformá-la na protagonista da indignação brasileira. Desde que a possível retirada de poder da presidente começou a ser debatida, me abri a ouvir opiniões distintas. Estava disposta a escutar argumentos de quem defende a permanência dela no governo e de quem quer vê-la bem longe dali.
Não consegui chegar a uma conclusão pacífica com minha consciência, porém. Então, me questiono se sou a única a ter esse sentimento de caminhar em uma “rua sem saída”. Não fecho os olhos para os erros de quem atualmente comanda o país, mas como me tranquilizar diante da solução apontada? A nova possibilidade também não me traz sossego.
Na dúvida, não me vesti de vermelho nem fui para a Esplanada dos Ministérios com camisa verde e amarelo. Não fiz selfies, enrolada na bandeira brasileira. Não acordei cedo para ir à manifestação em família ou entre amigos sorridentes, certos de estarem fazendo parte da história do país. Não cheguei em casa com a pele tostada pelo sol, depois de horas “protestando”. Também não fiz discursos emocionados no facebook defendendo minha opinião, menos ainda criticando quem não a compartilhava. Alienada, eu? Alienado você que também não o fez?
Moro em Brasília. Simbolicamente é a cidade onde os gritos, que pedem pelo fim da corrupção e por uma verdadeira democracia, serão ouvidos mais de perto. Soarão mais alto, ao menos. Afinal, a multidão se concentra ao lado da máquina política. Ontem, no entanto, enquanto os deputados votavam pela aprovação, ou não, do impeachment de Dilma, eu não reforçava o grupo de manifestantes, divididos por um muro na Esplanada dos Ministérios.
Aliás, por uma semana esse muro, construído para separar os grupos pró e contra Dilma, virou ponto turístico, tema de charge, reportagens de todos o Brasil. Piadista, o brasileiro esqueceu a polêmica dentro do Congresso e o transformou em rede para jogar vôlei. Houve quem brincasse de telefone sem-fio ou usasse o alambrado como mural para escrever e desenhar suas aspirações. Alguém teve a sutileza de colocar uma flor branca na extremidade do paredão. Talvez fosse esse um convite a unir esforços para que o Brasil volte a respirar.
Para mim, o muro significou a máxima materialização das divergências de pontos de vista dos brasileiros. No último mês, ouvi relatos de pessoas que foram verbalmente agredidas na rua porque estavam, despretensiosamente, vestidas de vermelho, em um momento que a cor da roupa diferencia politicamente os cidadãos. Li histórias de quem foi fisicamente violentado pela mesma razão. Vi amigos se alfinetarem e se criticarem nas redes sociais porque defendiam crenças distintas. O muro, na verdade, já existia. Ele só ganhou forma na capital do poder. Se o muro existe, há dois lados. E quando meus netos perguntarem em qual deles eu fiquei, serei obrigada a responder: “Em nenhum, meu filho! Eu estava, literalmente, em cima dele.”
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