Nasci em Brasília. Cresci nessa cidade que é cenário de minhas memórias afetivas. Na infância, me lembro bem da alegria que sentia quando meu pai parava o carro em algum dos estacionamentos do Parque da Cidade para procurarmos amora nas árvores. Felizmente, os galhos eram baixos, ao alcance dasmãos de uma criança. Sorte era quando ninguém tinha passado por ali antes e o pé estava carregado da frutinha. Elas manchavam os dedos roxos. Os lábios também. Nunca mais comi amoras tão doces quanto as que nascem no cerrado da minha terra natal.
No mesmo parque, desbravava o Castelinho. A gente ralava a roupa e as pernas nos bancos, nas mesas e no escorregador de cimento que até hoje estão por lá. Se fechar os olhos, consigo até sentir o cheiro da areia umedecida por urina de cachorro, ou de gente, que passava pelos corredores daquele castelo de tijolos. Na lista de saudades, ainda tem as brincadeiras debaixo do bloco de pilotis, momentos que só quem cresceu por aqui tem o privilégio de levar na lembrança. Os dias no zoológico sempre eram encerrados com compras de cata-ventos coloridos ou garrafas de água com detergente que prometiam virar bolas de sabão. Desconfio que, naquela época, a entrada para visitar os bichos não era tão concorrida quanto hoje, com enormes filas de carros aos fins de semana.
Adulta, tenho reconstruído meu relacionamento amoroso com Brasília. E madura, essa cidade se mostra ainda mais encantadora. Não como mais amoras no Parque da Cidade. Aquele lugar agora é refúgio para respirar, estimular a circulação e a engrenagem do corpo durante caminhadas matinais. Dia desses fui visitar o Castelinho. Já não era o mesmo da minha infância. A primeira impressão foi de ser bem menor do que guardava em meus pensamentos. Não estranhei, afinal, quando se é pequeno tudo ganha proporção exagerada. Não reconheci o cheiro abafado, típico de refúgio de animais e de homens com bexiga cheia, mas não pude deixar de avaliar quanta insanidade é fazer uma criança deslizar — se é que isso é possível —, em um escorregador de concreto.
A cidade com a qual me relaciono hoje inclui a Água Mineral. Quando criança, guardo uma ou duas visitas na recordação. Me vejo encantada pela beleza natural que rodeia as piscinas de águas correntes e um bocado geladas. Ao chegar lá, há poucas semanas, fui reiterada de que os habitantes continuam igualmente brincalhões. Os pequenos macaquinhos ainda roubam objetos das bolsas dos visitantes. Só que agora, em vez de levarem, no máximo, um brinquedo meu, poderiam surrupiar meu celular ou carteira com documentos. O prejuízo certamente seria maior e a brincadeira não teria a menor graça.
Se cresci ouvindo que o Lago Paranoá era poluído, hoje, me vejo “surfando” por aquelas águas. Recentemente, me aventurei no stand up paddle. Em cima de uma prancha, divido minha atenção entre me manter equilibrada e observar a beleza daquele lago inventado. De perigo, descobri que só tem mesmo a chance de esbarrar com um grupo de capivaras nativas. Confesso que quando caio, ou simplesmente me jogo na água para um refresco,me vem àmente a possibilidade de me deparar um jacaré no fundo daquela água escura, onde é impossível ver o próprio pé. Se o pensamento insiste, subo na prancha e continuo o passeio, com a ponte eleita como amais bonita do mundo ao fundo. Prazeres que só Brasília permite levar para sempre na memória.
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