Faz tempo que comprei o livro Amor Líquido, de Zygmunt Bauman. Ele está na minha lista de futuras leituras desde então, mas sempre seguindo para o fim da fila. Como uma criança que sabe que Papai Noel não existe — mas insiste em lhe escrever uma carta, pedindo o presente desejado só para não perder a magia do Natal —, eu também tenho me recusado a ler a tese do sociólogo polonês só para que ele não me furte as fantasias do meu coração.
No livro, ele defende que os relacionamentos estão cada vez mais voláteis e virtuais. As pessoas preferem manter romances em rede, em que basta um clique para conhecer o “amor da sua vida”, que dura alguns dias, ou bloquear, para sempre, quem você “adorava” até ontem. Gente que cada vez menos sabe manter laços verdadeiros e a longo prazo.
Eu concordo com ele, talvez por isso me recuse a ler o livro, pois terei ainda mais solidificada a minha tese e perderei, de vez, a crença no amor. É que tenho andando desgostosa ao ver que os amantes se satisfazem com azarações virtuais e acham que descolado é dizer em alto e bom tom que “não se apega a ninguém.”
Invejo esses de corações liquefeitos, pois o meu funciona à moda antiga. E, se estabelecer vínculos fortes e reais está fora de moda, ao que parece, eu sou mesmo démodé.
O amor que escorre pelos dedos é a sensação do momento. Virou tema de música de sucesso. Todo mundo quer ser o desapegado. É cool a indiferença pelo outro. Com Wesley Safadão, Anitta, uma das cantoras brasileiras mais badaladas do momento, declara em Chuva de esquema, que ela “nunca quis seu coração/Amor demais só dá problema”, sendo assim, ela preferia ter só um “pedacinho” da agenda dele, ocupada a semana inteira por romances que evaporam.
Em outra canção, ela solta o verbo com Pabllo Vittar, dizendo que não vai esperar o garotão porque “está cheia de opção”. Afinal, ninguém é mesmo especial. Todo mundo é descartável e facilmente substituível. Quem precisaria investir no outro?
Mais um sucesso que “canta o amor” em tempos modernos, é o do colombiano Maluna. Em Felices los quatro, ele transforma o desprendimento em melodia: “Se você fica comigo /ou se vai com outro/ eu não dou a mínima/ porque eu sei que você vai voltar.”
Assim, minhas tentativas de evitar a verdade dita por Bauman estão cada vez mais fracassadas. Se eu não queria filosofar sobre o fim do amor como desconfio que deveria ser, o tema está latente em todas as conversas que ouço, na rádio, entre os amigos, entre os que te mandam mensagem te querendo em um dia e no outro te ignoram porque a empolgação já foi, literalmemte, pelo ralo. Afinal, os sentimentos são líquidos, eu que tentei esquecer.
Talvez, seja melhor mesmo aceitar que Papai Noel, ops, o amor, não existe. Ou que talvez ele tenha mesmo mudado de cara, como li, na última semana, em um grafite nos muros da UnB: “Tinder é amor”! Talvez, eles estejam certos e eu que precise mesmo parar de acreditar em contos de fadas.
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