Caso Tifanny: Proibir transexuais no esporte é solução?

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Primeira jogadora transexual a atuar na Superliga feminina, Tifanny Abreu marcou 39 pontos em um mesmo jogo nesta terça-feira (30/1/2018) e quebrou o recorde da principal competição nacional de vôlei — que antes pertencia a Tandara (37), mas que quase tinha sido batido nesta edição por Bruna Honório (33). Fato que atiçou ainda mais o questionamento sobre a permissão de atletas trans atuarem no esporte de alto rendimento. O debate, no entanto, não deveria ser se transexuais devem ou não ser excluídos. Mas sim sobre as possíveis mudanças no regulamento para conciliar as duas partes: a inclusão de trans e uma maior igualdade de desempenho entre todas as atletas.

Antes de entrar nas estatísticas do vôlei, porém, é importante entender que qualquer pioneirismo envolve polêmicas, testes, adaptações e, principalmente, conquistas. Ao entrar em quadra por uma liga profissional, Tifanny carrega com ela a representatividade de toda uma minoria social, que busca abrir oportunidades de inserção em vários âmbitos da sociedade, inclusive no mercado de trabalho. Então não seria diferente no esporte, que vem se profissionalizando cada vez mais nas últimas décadas.

Limitar o debate exclusivamente ao aspecto biológico não abrange a complexidade do tema. Transexuais encontram barreiras para conseguirem emprego, têm índices de escolaridade baixo por sofrem preconceito nas ruas e nas próprias famílias e são alvo de violência, sendo o Brasil o país que mais mata transgênero no mundo. Ver o esporte abrindo portas à uma minoria tão estigmatizada é louvável. Proibir esse acesso seria um retrocesso. Debater para que haja regras mais rígidas pode ser uma saída.

Tifanny na Seleção Brasileira feminina de vôlei, será?

“É necessário garantir, na medida do possível, que atletas trans não sejam excluídos da oportunidade de participar da competição esportiva”, ressaltou o Comitê Olímpico Internacional (COI). Tifanny é a primeira transexual a competir em um dos esportes mais populares do Brasil, mas o debate sobre a transexualidade no esporte começou há mais tempo. Em 2015, o COI autorizou trans no esporte, estabelecendo algumas condições. Desde 2003, porém, a entidade diz que reconhece a importância da autonomia da identidade de gênero na sociedade, com modificações na legislação em diversos países.

Para as Olimpíadas do Rio-2016, o COI fez a última atualização no regulamento e inclusive deixou de exigir a cirurgia de mudança de sexo, além de ter passado a cobrar um ano de tratamento hormonal, em vez de dois anos. Para competir atualmente, a atleta que passar pela mudança de sexo biológico de masculino para feminino tem de ter a identidade de gênero feminina declarada e manter o nível de testosterona, o hormônio masculino, abaixo de 10 nmol/L. Ou seja, atletas transexuais podem competir inclusive nas Olimpíadas, segundo o regulamento vigente.

Ao ser questionado sobre uma possível convocação, o técnico da Seleção Brasileira feminina de vôlei, José Roberto Guimarães, foi conciso: “Uma questão simples. Se dentro de quadra fizer o esperado e fizer a diferença, tecnicamente falando, passa a interessar como qualquer outra atleta. Eu quero o melhor. Se for o caso, consultarei a CBV. Não vejo problema nenhum na convocação. Basta que esteja elegível”.

Há ou não vantagem na performance de transexuais em disputas femininas?

Voltando às quadras da Superliga feminina, Tifanny integrou o elenco do Bauru no meio da primeira fase da competição. Até a sexta rodada do returno, somou 160 pontos em 30 sets disputados. Com o recorde de pontos na partida contra o Praia Clube, decidida no tie-break (por 3 sets a 2), a média dela chegou a 5,33 pontos por set. Com a segunda melhor média, Tandara marcou 4,79 pontos por set. Mas atuou bem mais, já que foram 316 pontos em 66 sets.

Os números mostram uma atuação de gala de Tifanny, estreante na Superliga feminina, mas também apontam que ela é a jogadora mais acionada do Bauru. Contra o Praia Clube, ela recebeu 75 bolas e teve 44% de aproveitamento (33 de ataque e seis em bloqueio). A grande questão, então, é se transexuais levam vantagem física ou não por ter vivido a puberdade masculina, que a fez ter um esqueleto e memórias celular, motora e musculares de um homem?

Antes de passar pela mudança de gênero, Tifanny atuou pela liga profissional masculina. A transição dela foi aos 29 anos e ela voltou a jogar profissionalmente aos 31, em 2016, quando atuou na segunda divisão da liga italiana. Os estudos atuais sobre o tema, no entanto, não comprovam conclusivamente um ganho de performance por atletas trans. Também não provam o contrário, que não há vantagem. A falta de exemplos semelhantes ao de Tifanny dificulta as pesquisas.

O documento em que o COI define as diretrizes para a participação de transexuais assume que as condições podem ser repensadas caso novas descobertas médicas e científicas sejam feitas. A entidade pretende discutir o tema novamente após os Jogos Olímpico de Inverno, que serão disputados a partir de 9 de fevereiro na Coreia do Sul.

Maíra Nunes

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