Uma semana após ter vindo à tona a denúncia de uma funcionária da CBF contra o presidente da entidade, Rogério Caboclo, por assédio sexual e moral, a Seleção Brasileira feminina fez o que tantos brasileiros e cidadãos esperavam: manifestou-se veemente contra o assédio, de forma clara e firme. Nesta sexta-feira (11/6), o time venceu a Rússia, por 3 x 0, no penúltimo amistoso antes dos Jogos Olímpicos de Tóquio, que serão disputados em julho. Mas a vitória mais comemorada foi antes mesmo de a bola rolar, quando jogadoras e comissão técnica, todos juntos, entraram em campo com uma faixa estampando “Assédio não!”.
A cena foi transmitida em TV aberta, pela Globo, e pelo canal Desimpedidos, no Youtube, e comemorada na internet. Antes de o jogo começar no Estádio Cartagonova, em Cartagena (Espanha), as atletas da Seleção publicaram nas próprias redes sociais um manifesto sem meias palavras contra a violência contra a mulher. “Todos os dias no Brasil, milhares de pessoas são acometidas e desrespeitadas com cenas de assédio, seja moral ou sexual, especialmente nós mulheres. São brasileiras e brasileiros, vítimas de abusos e atos que vão contra os nossos princípios de igualdade e construção de um mundo mais justo”, disse parte do texto divulgado.
Na véspera do amistosos, a técnica da Seleção feminina, Pia Sundhage, comentou sobre a seriedade do caso e como ele foi conduzido internamente. “Primeiro, informamos formalmente as jogadoras sobre o que havia ocorrido e elas puderam conversar e terem a opinião própria delas. Cada um de nós deve ser responsável pelas suas respostas”, disse a sueca, em coletiva de imprensa. Nesta sexta-feira, ela estava junto à equipe no posicionamento formal sobre o caso antes da partida.
“Não é fácil fazer isso, é uma grande decisão a se tomar, porque todos devem estar na mesma página para dizer algo que eu acredito ser importante. Fizemos isso e fizemos juntos. Depois disso, deixamos isso um pouco de lado para jogar dois tempos de 45 minutos. Mas acho que fizemos uma boa escolha”, avaliou Pia, após a vitória sobre a Rússia. Durante os 90 minutos de jogo, as brasileiras foram superiores, dominaram a posse de bola e construíram a vitória com dois gols de Bruna Benites e um da Andressa Alves, que entrou no segundo tempo.
Ao fim do jogo, Marta reforçou o quanto atletas e comissão técnica estão alinhadas. “Resolvemos mostrar a nossa opinião, porque somos, obviamente, contra qualquer tipo de assédio, sem fazer pré-julgamento. Os fatos estão aí para serem apurados, mas nós necessitamos mostrar o nosso posicionamento e fizemos em conjunto, como fazemos em todas as outras situações”, disse a camisa 10 do Brasil.
Contraditoriamente, a gestão de Rogério Caboclo à frente da CBF foi a que promoveu as maiores iniciativas por igualdade dentro da entidade. Neste mês, Caboclo anunciou o primeiro patrocinador exclusivo da Seleção e do Brasileirão femininos. Foi ele também quem divulgou, em 2020, o pagamento de diárias equivalentes a jogadoras e jogadores na Seleção, sempre com discurso de tratamento igual entre homens e mulheres. A própria técnica Pia, bicampeã olímpica, foi trazida pelo atual presidente, que teria pensado no nome dela e feito o convite, em 2019, após o sucesso da Copa do Mundo, na França.
Entretanto, como pontuou o manifesto das jogadoras, “dizer não ao abuso são mais do que palavras, são atitudes”. As atletas fizeram o que também espera-se dos clubes e federações de futebol, inclusive os que já levantaram essa bandeira em jogadas de marketing anteriormente, em dias comemorativos. As atletas da Seleção feminina deixaram claro que “encorajam que mulheres e homens denunciem”. Afinal, como elas concluem no protesto, a luta pelo respeito e igualdade vai além dos gramados. Que a atitude corajosa e necessária sirva de exemplo para todos profissionais envolvidos no esporte, principalmente, aqueles que vestem a tão exaltada amarelinha.