Após uma semana de Copa do Mundo, encontrei um engenheiro aposentado de Recife que me perguntou sobre a minha sensação em relação à segurança na Rússia. Mais precisamente, em Moscou. Disse a ele que eu tinha duas respostas. A primeira, para a questão que ele se referia, era sobre roubos e assaltos. Já a segunda, era sobre ser uma mulher na Rússia em meio a uma Copa do Mundo masculina.
Para a primeira questão, percebi realmente uma diferença assustadora em relação à violência dos centros urbanos do Brasil. Na capital russa, senti-me segura ao andar pelas ruas do centro em plena madrugada com o celular na mão para acompanhar o GPS de volta para o hostel. O que não significa que não senti medo. A apreensão ocorre pelo simples fato de ser mulher em meio a um esporte que ainda é muito machista e em um país que pouco coíbe casos de assédio ou outros episódios de violência feminina.
O maior evento do futebol mundial reúne clima festivo e amantes do esporte — e, para quem gosta, é uma experiência realmente incrível. Mas também expõe o quão machista é o pensamento dos torcedores, que se sentem libertos longe de casa. Os assédios contra mulheres ocorrem no meio das ruas, sem que os autores se sintam nem um pouco constrangidos por estarem envoltos por aglomerados de pessoas. Nem a câmera de uma emissora de televisão ou o alcance de um meio jornalístico intimidam os assediadores, a calcular pela quantidade de repórteres mulheres atacadas enquanto trabalham.
Isso se deve ao fato de os assediadores não enxergarem problema em fazer “brincadeiras” com mulheres, como no vídeo em que um grupo de brasileiros cantarolou para uma russa palavras obscenas e depreciativas. O vídeo caiu na internet e gerou revolta. Cheguei a ouvir outro brasileiro puxar o mesmo canto ontem em um bar. Imediatamente, porém, um colega o avisou das polêmicas geradas no Brasil — não que ele concordasse necessariamente. Ambos seguiram a conversa dizendo o quão está “chato” a seriedade com tais “brincadeiras”. Portanto, eles podem até não concordar, mas sabem que fica feio fazer piadas com conotações sexuais.
A atual Copa do Mundo encorajou a Associação do Futebol Argentino (AFA) a criar uma cartilha distribuída a jornalistas que indica “as melhores práticas para conquistar mulheres russas” — que, vale ressaltar, também foi rechaçado na internet. A grandiosidade do Mundial também motivou o Itamaraty e o Ministério do Esporte a lançarem um guia aos torcedores gays do Brasil recomendando que evitem demonstrações públicas de afeto por causa da intolerância a LGBTs na Rússia. Agora, instruções para os torcedores homens sobre como se comportar diante de uma mulher ao longo do Mundial, não vi em lugar algum!