A saída de Vágner Love do Flamengo, em 2013, foi um marco, uma espécie de símbolo impopular do passo atrás no início do plano de reengenharia financeira pensado pelo grupo que havia acabado de assumir a presidência em meio a dívidas altíssimas. Eduardo Bandeira de Mello, Wallim Vasconcelos, Fred Luz, Luiz Eduardo Baptista, o Bap, e companhia, avisaram ao jogador e a 40 milhões de torcedores que o clube carioca não tinha a mínima condição de continuar desembolsando o salário de R$ 1 milhão por mês acertado com a antecessora Patrícia Amorim e a dívida de R$ 6 milhões com o CSKA-RUS, que teria perdoado os débitos e recebeu o atleta de volta. Muito menos comprar um substituto à altura da perda. Sete anos depois, o atacante deixa o Corinthians novamente rumo ao time russo graças a um acordo amigável em meio ao caos econômico do Corinthians. Coincidência à parte, a pergunta é: alguma chance de a história se repetir e a saída de Love dar início a uma guinada na gestão corporativa do segundo time mais popular do país? A minha resposta é não.
Quando Vágner Love trocou o Rio por Moscou, o Flamengo tinha dívidas a pagar. Ao perder o centroavante, o Corinthians contabiliza dívida de R$ 665 milhões e mais R$ 536 milhões cobrados pela Caixa relativo no financiamento da Arena, a casa própria. Faz toda a diferença. Essa é a minha percepção, mas vamos à palavra de um especialista em finanças dos clubes.
“O grande ponto de um clube como o Corinthians é conseguir controlar os seus custos. O primeiro passo é esse. A gente vê, especialmente nos últimos dois, três anos de gestão, uma série de contratações, aumento nos custos com pessoal, muito investimento, e tem um ponto que atrapalha muito que é o clube social que drena muito o caixa do futebol. Uma ordem de R$ 40 milhões de perdas que o social drena do futebol. Você imagina: R$ 40 milhões, a gente está falando de cerca de R$ 3 milhões de receita mensal que poderiam estar entrando na gestão do futebol ajudando a reduzir problemas da redução de dívida e dos salários em dia”, analisou o economista Cesar Grafietti em entrevista ao programa Bola da Vez da ESPN.
“O Corinthians gera R$ 350 milhões, R$ 450 milhões de receita. Em situações normais vai receber provavelmente neste ano, com a venda do Pedrinho e tudo mais, por volta de R$ 300 milhões por cauda da queda de bilheteria, que é importante, como o sócio torcedor. O trabalho no Corinthians tem que ser muito forte com redução de custos, redução de investimentos, usar mais a estrutura de base e, de certa forma, tentar se reinventar nas receitas de marketing e de publicidade, onde o clube é muito forte”, alerta Grafietti.
Sem Vágner Love, o Flamengo se virou com o que tinha no elenco, Hernane “Brocador” — artilheiro do Brasil em 2013. Sem Vágner Love, o Corinthians ignora economia estimada em R$ 3,5 milhões, está prestes a fechar com Jô e pode elevar a folha de pagamento.
Segundo o consultor do banco Itaú, o Corinthians deveria estar tendo receitas de marketing semelhantes à do Flamengo. “Ali na casa de R$ 100 milhões, R$ 120 milhões. Hoje, é muito menor do que isso, na casa de R$ 60 milhões, R$ 70 milhões”, compara. “Então, deveria ter um trabalho muito forte no que diz respeito a estruturação de receita, mas especialmente de custo, que é algo difícil de ver no Corinthians hoje. A gestão do Andrés Sanchez e a anterior se notabilizam por volume enorme de contratados que drena o caixa e gera compromisso de pagamento por dois, três, quatro anos”, avalia Grafietti. Na projeção dele, se o Corinthians fizesse o dever de casa, “igualaria o Flamengo financeiramente em cinco ou seis anos”.
Mas, ao que parece, a política atual é continuar fazendo investimentos. Em 2013, o Flamengo perdeu Vagner Love, deu sorte ao se virar com Hernane “Brocador” — artilheiro do Brasil naquela temporada, contratado em meio de 2012 — conquistou o título da Copa do Brasil, amargou temporadas cambaleantes no Campeonato Brasileiro, mas segurou-se na elite, e deu o primeiro sinal de poderio financeiro ao tirar Paolo Guerrero do Corinthians no meio da temporada de 2015.
O Corinthians despede-se de Vágner Love, mas não se contenta com Mauro Boselli, Yoni González, Everaldo, Janderson ou Matheus Davô. A tendência é que o clube acerte com Jô nas próximas semanas. A economia com a saída de Love é estimada em R$ 3,5 milhões. O jogador, inclusive, abriu mão dos salários que receberia até dezembro deste ano. Dois anos mais jovem do que Love, Jô dificilmente receberá menos. Os setoristas do clube informam até que a primeira proposta salarial feita pelo jogador teria sido acima das possibilidades do caixa alvinegro. O indicativo é de elevação na folha de pagamento.
Portanto, a julgar pelo momento, as coincidências entre as saídas de Vágner Love do Flamengo em 2013; e agora do Corinthians em 2020; não vão além do momento de dívida dos dois clubes e do destino comum do jogador — o CSKA Moscou. O perrengue financeiro tem tudo para se agravar. O balanço financeiro aponta contas no vermelho pelo terceiro ano consecutivo e aumento da dívida para R$ 665 milhões. O prejuízo era de R$ 469 milhões em 2018, ou seja, crescimento de 42%. Sem considerar o financiamento da Arena Corinthians…
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