No velho normal, a Copa das Confederações era aquele torneio disputado um ano antes da Copa do Mundo, quase sempre com título do Brasil, mas que se tornava uma fábrica de ilusões para a sequência do trabalho. O tetra no torneio, em 2013, antecedeu o 7 x 1. O tri, em 2009, precedeu a queda nas quartas de final contra a Holanda, em 2010. A exibição de gala contra a Argentina no bi, em 2005, parecia trailer do hexa. Só que não! Virou filme de terror no ano seguinte contra a França. O baile contra a Austrália na decisão de 1997 enganou bem sete vezes antes do vice na Copa da França.
Tite faz ótimo trabalho, mas precisa se vacinar contra o oba-oba. Em 56 jogos, venceu 42, empatou 10, perdeu 4 e tem aproveitamento de 80,9%. O domínio do Brasil nas Eliminatórias para a Copa do Qatar e na Copa América, como mostrou, mais uma vez, a goleada por 4 x 0 desta quinta-feira sobre o Peru, no estádio Nilton Santos, no Rio de Janeiro, arrisca virar nossa “Copa das Confederações”. Como brasileiro adora se iludir, é bom ficar com um pé atrás.
O Brasil não perde há nove jogos. A última derrota foi para a Argentina no amistoso de 15 de novembro de 2019. Desde então, sofreu gol apenas na vitória contra o Peru na segunda rodada das Eliminatórias Sul-Americanas, por 4 x 2. Ninguém se atreveu a balançar a rede verde-amarela nos últimos seis jogos. Uma análise rasa indica que a Seleção está no caminho certo. Uma análise mais aprofundada cobra cautela, sobretudo diante do que estamos observando na Eurocopa. Itália, França, Bélgica, Holanda, Inglaterra e Portugal têm ótimas seleções.
Soa contraditório, mas a Seleção precisa se blindar contra o excesso de positividade. Repete-se que o Brasil só perdeu quatro jogos sob o comando de Tite, dois para a Argentina, um contra a Bélgica e amistoso diante do Peru; que o time dificilmente sofre gols; que Neymar está a nove de gols de alcançar o recorde do Rei Pelé na lista dos maiores artilheiros do Brasil; que faltam adversários à altura na América do Sul, blábláblá…
A evolução da Seleção vai muito além da carência de amistosos contra adversários europeus. Requer variações táticas. Uma delas, a observação de uma defesa com três zagueiros, sistema tão usado na Eurocopa por algumas seleções. Há material humano para isso. Eder Militão e Marquinhos são beques velozes. Um bom argumento para testá-los ao lado do “veterano” Thiago Silva no papel de líbero. Talvez essa variação seja útil mais à frente.
Não seria nada de outro mundo para Tite. O Grêmio campeão da Copa do Brasil em 2001 contra o Corinthians é umas das melhores demonstrações de organização tática no portfólio do técnico da Seleção. Sim, algumas variações durante os jogos transformam o time em 3-2-5, por exemplo, mas falo de começar o jogo com linha de três — sistema que Tite provou no passado que domina. A Copa América pode ser a última oportunidade para esse tipo de reinvenção.
Neymar está comendo a bola, mas os adversários sul-americanos são frágeis. Quando precisou jogar no limite, por exemplo, nas semifinais da Liga dos Campeões da Europa contra o Manchester City, o craque não conseguiu vestir a capa de super herói e levar o PSG à final em um duelo de altíssimo nível contra a trupe de Pep Guardiola. Também deixou a desejar na final de 2020 da Champions League contra o Bayern de Munique. A maturidade do craque será muito mais testada no Qatar, em 2022. Como foi, aliás, há três anos, na Rússia.
Variações táticas à parte, o Brasil provavelmente avançará em primeiro lugar às quartas de final da Copa América. A vida no mata-mata não será tão fácil como nesta etapa de grupos. À exceção da Colômbia, os times mais fortes do continente estão no Grupo A. Como o torneio seria originalmente na Argentina e na Colômbia, a tabela parece ter sido construída para facilitar um pouco mais o caminho da trupe de Lionel Scaloni no mata-mata, desde que Messi e companhia façam por onde na primeira fase. Os adversários mais temidos seriam Brasil ou Colômbia. Peru, Venezuela e Equador são acessíveis. Enquanto isso, Tite, Neymar e companhia sabem que o duelo do Brasil pode ser contra Argentina, Chile, Uruguai, Paraguai ou Bolívia. Arrisco que, para variar, o adversário será o Paraguai. Há uma atração fatal na Copa América.
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