A classificação inédita do Paris Saint-Germain para a final da Uefa Champions League no domingo, às 16h, contra o Bayern de Munique, é mais do que uma vitória pessoal de Neymar, jogador mais caro da história do futebol, e do clube francês. Há um forte impacto geopolítico na guerra de vaidades entre dois países vizinhos na região do Oriente Médio.
Sede da Copa 2022, o Catar é o responsável pelo sucesso do PSG. Em 10 anos, o projeto da Qatar Sports Investment (QSI) liderado pelo xeque Tamim bin Hamad Al-Thani investiu mais de € 1.255,5 bilhão (R$ 8,4 bilhões) no sonho de levar o time de Paris ao status de símbolo da ostentação financeira da pequenina nação de 11,581 km² e 2,8 milhões de habitantes — menos do que a população do DF. Do total, 222 milhões de euros (R$ 1,5 bilhão) foram investidos na compra de Neymar (leia quadro com todas as contratações no fim deste post).
Considerado “patinho feio” da região, o Catar, via QSI, ousou peitar o vizinho Emirados Árabes Unidos, dono do City Group. A multinacional da bola tem como matriz o Abu Dhabi United Group. O grupo é proprietário de uma rede de clubes pelo mundo que vai do badalado Manchester City, na Inglaterra; New York City, nos Estados Unidos; e Girona, na Catalunha; a Lommel SK (Bélgica), Melbourne City (Austrália), Yokohama Marinos (Japão), Sichuan FC (China), Mumbai City (China) e Montevidéu City Torque (Uruguai).
Como se não bastasse a corrida pela hegemonia na produção de petróleo e gás natural, pelo turismo, poder de influência na região e até entre duas das melhores companhias aéreas do mundo — Emirates e Qatar Airways —, estava aberta a disputa no futebol por quem chegaria primeiro à final da Liga dos Campeões da Europa.
De um lado, o Catar, do xeque Tamim bin Hamad Al-Thani, mecenas do PSG. Do outro, os Emirados Árabes Unidos, de Khalifa Bin Zayed Al Nahyan, financiadores do Manchester City. Curiosamente, eles poderiam até protagonizar a finalíssima, em Lisboa. Estavam em lados diferentes nas chaves. Porém, a trupe de Pep Guardiola perdeu para o Lyon nas quartas.
A presença do PSG na decisão é mais um gol do Catar contra os rivais políticos. Quando lançou candidatura para receber a Copa 2022, o país virou piada na região. Quando vizinhos como os Emirados Árabes Unidos perceberam que a possibilidade de vitória do Catar ganhava força na mapa-múndi da Fifa, sugeriram parceria para receber o megaevento. Era tarde demais. O Catar conseguiu o que desejava ao superar de maneira polêmica a concorrência de Estados Unidos, Japão, Coreia do Sul e Austrália.
Acusado de apoiar grupos terroristas como a Al Qaeda e o Daesh (acrônimo árabe para Estado Islâmico), o Catar viu Arábia Saudita, Bahrein, Egito, Emirados Árabes Unidos, Líbia, Maldivas e Iêmen cortarem relações diplomáticas. Com direito, inclusive, ao fechamento das fronteiras.
Aviões que partem em direção a Doha são impedidos de sobrevoar, por exemplo, o espaço aéreo dos vizinhos Emirados Árabes Unidos. Logo, a viagem torna-se mais cara, longa e cansativa. A Arábia Saudita também fechou a fronteira, única ligação do Catar por terra com o restante da Península Arábica. A questão preocupa a Fifa a dois anos do Mundial.
Mesmo isolado, invejado e mal falado, o Catar celebra uma vitória atrás da outra. Tirou Neymar do Barcelona. Viu a Fifa desistir de realizar a primeira Copa com 48 países em 2022. Isso obrigaria o emirado bordado a ouro a pedir ajuda a alguns vizinhos devido ao aumento da quantidade de jogos e delegações. O Catar foi campeão da Copa da Ásia, em 2019, na casa dos Emirados Árabes Unidos. Inclusive eliminou os donos da casa nas semifinais. Torcedores locais chegaram a atirar chinelos em jogadores da seleção catari — um dos maiores insultos na cultura árabe. Na última terça, celebrou a conquista da vaga inédita do PSG para a final da Champions League. No domingo, o rico dinheirinho aplicado no clube francês pode render o título. Por sinal, só um time gaulês ergueu a orelhuda: o Olympique de Marselha, em 1993.
Alheio às nuances geopolíticas, Neymar faz a parte dele. Pode-se afirmar que “pagou” metade do investimento feito nele ao classificar o PSG para a final. A melhor campanha do clube havia sido em 1995. No entanto, a geração de Raí, Ricardo Gomes, Ginola e Weah foi eliminada pelo Milan nas semifinais. Os outros 50% do projeto bilionário idealizado pela QSI podem ser quitados na decisão de domingo contra o Bayern de Munique.
O feito de Neymar é enorme. Astros como o inglês David Beckham e o sueco Zlatan Ibrahimovic não conseguiram a proeza do brasileiro na passagem pelo clube. Independentemente do resultado da decisão contra o Bayern neste domingo, a tendência é que o PSG seja ainda mais forte na temporada 2020/2021. Comenta-se que Cristiano Ronaldo teria sido oferecido ao clube. Já imaginou um ataque CMN? Cristiano-Mbappé-Neymar!
Carrinho de compras
Os investimentos da QSI no PSG por temporada
(Valores das transações em milhões de euros)
- 2011/2012
Pastore (42)
Thiago Motta (11,5)
Gameiro (11)
Mohamed Sissoko (8)
Mènez (8)
Matuidi (8)
Alex (5)
Sirigu (5)
Maxwell (3,9)
Bisevac (3,2)
Lugano (3)
- 2012/2013
Thiago Silva (42)
Lucas Moura (40)
Lavezzi (30)
Ibrahimovic (21)
Verratti (12)
Van der Wiel (6)
David Beckham (custo zero)
- 2013/2014
Cavani (64,5)
Marquinhos (31,4)
Cabaye (25)
Lucas Digné (15)
- 2014/2015
David Luiz (49,5
Aurier (empréstimo)
- 2015/2016
Di Mária (63)
Kurzawa (25)
Aurier (10)
Trapp (9,5)
Stambouli (8,5)
- 2016/2017
Draxler (36)
Guedes (30)
Krychowiak (27,5)
Jesé (25)
Lo Celso (10)
Meunier (6)
- 2017/2018
Neymar (222)
Yuri (16)
Daniel Alves (custo zero)
- 2018/2019
Mbappé (145)
Paredes (40)
Kehrer (37)
Bernat (5)
Buffon (livre)
Choupo-Motting (custo zero)
- 2019/2020
Abdou Diallo (32)
Idrissa Gueye (30)
Sarabia (18)
Keylor Navas (15)
Total: € 1.255,5 bilhão (aproximadamente R$ 8,4 bilhões na cotação atual)
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