Neymar e Cavani Neymar e Cavani na marca do pênalti. Foto: Christophe Simon/AFP

O genioso Neymar, o complexado Cavani e o omisso Unai Emery: opinião e números sobre a crise no PSG

Publicado em Esporte

Neymar não é santo. Muito menos Cavani um anjinho. Não tenho procuração para defender nenhum deles, mas as críticas ao episódio envolvendo os dois na vitória do Paris Saint-Germain sobre o Lyon por 2 x 0, no último domingo, pelo Campeonato Francês, precisam ser menos bipolares — principalmente no que diz respeito ao mimado e genioso brasileiro.

Quando Neymar colocou a bola debaixo do braço, ofuscou Messi e liderou a fantástica virada do Barcelona sobre o PSG, em março, pelas oitavas de final da Liga dos Campeões — coincidentemente assumindo a responsabilidade de uma cobrança de pênalti e de uma falta nos minutos cruciais —, houve quem exaltasse a personalidade do brasileiro e imediatamente chamasse Messi de amarelão.

Cinco meses depois, Neymar está em outro patamar. É o jogador mais caro da história. É o mais bem pago do PSG. O segundo salário mais alto do futebol, atrás apenas de Carlitos Tévez. O contracheque cobra que Neymar bata no peito e assuma com a responsabilidade em qualquer situação. Foi contratado para decidir. Não pode se esconder. Por isso, não vejo nada demais no fato de ele ter pedido a bola para cobrar o pênalti quando o placar apontava 1 x 0 a favor do PSG. Nem em Cavani negar a entrega da bola a Neymar. Faz parte do jogo. Uma vez, Neymar pediu a Messi para bater uma falta no Barcelona e o argentino não permitiu. O argentino colocou Neymar em seu devido lugar, assumiu a responsabilidade e bateu.

Há quatro questões maiores: a guerra de vaidade; a omissão do técnico Unai Emery em delegar funções; a mania de Neymar achar que todos devem ser seus parças, mimá-lo e serem reféns de suas vontades; e um Cavani complexado.

 

» Aproveitamento em cobranças de pênalti no futebol europeu

  • Cavani: 76,7% (35 acertos em 46 cobranças)
  • Neymar: 71,4% (10 acertos em 14 cobranças)

 

Se Neymar pediu para bater o pênalti a fim de ganhar as manchetes dos jornais e conquistar jurados no projeto pessoal de ser eleito o melhor do mundo em 2018 — hipótese mais provável — cometeu o pecado da vaidade. Se Cavani fez o mesmo pensando em si, na artilharia do Campeonato Francês, na Chuteira de Ouro, no bônus de R$ 4 milhões, em ultrapassar Ibrahimovic para se tornar o maior goleador da história do PSG, ou simplesmente agiu como veterano da turma diante de um calouro abusado, pisou na bola também.

Cavani é inegavelmente um baita centroavante, mas sofre do complexo de coadjuvante. Quando jogou ao lado de Ibrahimovic, tentou comprar briga com o sueco em 2015, ao questionar o sistema tático de Laurent Blanc em uma entrevista concedida ao L’Équipe. Perdeu a queda de braço e foi colocado em seu devido lugar, deslocado para fora da área, com Ibra mantido no papel de centroavante. Ambos se aturaram.

Coadjuvante também na seleção do Uruguai, Cavani criou climão até com o parceiro Luis Suárez — maior artilheiro da história da Celeste — ao criticar a expulsão do compatriota na semifinal da Copa do Rei da Espanha neste ano. “Devemos nos comportar”, alfinetou. Na Copa América de 2015, o uruguaio levou dedada do chileno Jara. Em um jogo de 2015 da Ligue 1, tirou satisfação com Belay, do Bordeaux, e a temperatura subiu dentro do gramando… Portanto, Cavani também não é flor que se cheire, diria minha saudosa vó Maria.

O técnico Unai Emery sabe disso. Trabalha pela segunda temporada com Cavani e tem a maior parcela de responsabilidade no episódio. É dele a obrigação de apontar o sistema tático, escalar o time, eleger o capitão, o cobrador oficial de pênaltis, faltas, escanteios… O treinador do PSG é omisso ao dizer que a decisão é de Neymar e Cavani. Numa boa, não se paga uma fortuna a um líder para que ele terceirize suas decisões.

A prova final de que falta comando a Unai Emery é a cena patética em que Daniel Alves toma a bola de Cavani e a entrega a Neymar para a cobrança de uma falta na partida contra o Lyon. Um dos deveres de um técnico de futebol é delegar as funções. Pelo jeito, isso não foi definido e o técnico está se anulando perante as estrelas.

 

» Divisão das cobranças de pênalti no PSG na era Cavani

  • 1. Ibrahimovic – 26
  • 2. Cavani – 19
  • 3. Outros (Lucas Moura e Jesé) – 5

» Divisão das cobranças de pênalti no Barcelona na era Neymar

  • 1. Messi – 33
  • 2.Neymar – 14
  • 3. Luis Suárez – 5
  • 4. Outros (Fàbregas, Xavi, Iniesta e Mascherano): 6

 

O maior erro de Neymar, gravíssimo na minha opinião, é a tentativa de transformar o PSG em um time dos parças. Está claro que ele deixou o Barcelona porque perdeu o sócio Daniel Alves para a Juventus e sentiu-se fragilizado no elenco. É evidente que Neymar convenceu Daniel Alves a preferir o PSG ao Manchester City por um motivo simples: precisava de um parça, do irmão mais velho, de alguém capaz de comprar seus caprichos e de brigar por eles.

Unai Emery e Cavani são os lados mais fracos da crise. Cabe ao técnico estabelecer a ordem. O PSG não é o clubinho do Neymar. Não é o time dos parças Neymar e Daniel Alves. Muito menos a equipe do Cavani. O espanhol tem tudo para perder o emprego se não tomar as rédeas. Cavani tem 30 anos. Se o PSG tiver de escolher entre ele, Neymar e/ou Mbappé, não tenho dúvida de que tomará a decisão com base na idade, projeção, preço e merchandising.