“Questão de lisura, de ética, de compromisso com valores que eu tenho”. Essa foi a justificativa de Marco Aurélio Cunha, 66 anos, em entrevista ao blog, para trocar a coordenação das Seleções Femininas da CBF pela pré-candidatura à presidência do São Paulo Futebol Clube e evitar desgastes desnecessários. Ele sabe onde pisa. Lembrança do blogueiro para refrescar a memória: recentemente, Washington “Coração Valente” perdeu o cargo de diretor de Desenvolvimento da entidade por causa de conflito de interesses. Juninho Paulista balançou no cargo de coordenador da Seleção Masculina pelo mesmo motivo após denúncias de Lúcio de Castro na Sportlight.
Fiel aos próprios princípios, Cunha não pagou pra ver. Tratou de sair numa boa e cortar o mal pela raiz. “Completei cinco anos na função em maio. Em meio a esse momento difícil, estou pensando em novos rumos, a eventual candidatura ao São Paulo. Hoje, sou pré-candidato. Quero cumprir meus valores. Não seria correto permanecer e, aos mesmo tempo, ter um projeto pessoal. Conversei com o presidente (da CBF, Rogério Caboclo) sobre essa expectativa. Ficaria até os Jogos Olímpicos de Tóquio-2020, mas como mudou para o ano que vem, considero incompatível seguir até o meio do ano que vem e participar, ao mesmo tempo, do processo do São Paulo”, disse, emocionado, no bate-papo da noite desta terça-feira.
Enquanto conversava com o blog, Marco Aurélio Cunha conferia cada recado das meninas, como ele chama carinhosamente as jogadoras com quem trabalhou. “A Marta mandou uma mensagem lindíssima. Um belo texto que fala sobre gratidão”, disse, com voz embargada.
“A Marta mandou uma mensagem lindíssima. Um belo texto que fala sobre gratidão”
A decisão de Marco Aurélio Cunha teve uma forte opositora. “Ainda não tive coragem de falar com a Pia (Sundhage). Ela pedia para que eu permanecesse. Sabia da minha intenção. Quero conversar face a face, olho no olho com ela”, revelou Cunha. A treinadora da Seleção feminina principal cumpre a quarentena na Suécia em tempos de pandemia da covid-19.
Marco Aurélio Cunha falou várias vezes sobre valores. Cunha quis cortar o mal pela raiz. “Tenho que começar de uma forma correta. Saio com o coração partido, mas fiz inúmeros amigos e amigas. Não sei qual será o resultado, mas mas decidi partir para esse caminho”.
“Ainda não tive coragem de falar com a Pia (Sundhage). Ela pedia para que eu permanecesse. Sabia da minha intenção. Quero conversar face a face, olho no olho com ela”
Antes de falar sobre a ambição de assumir o São Paulo, Marco Aurélio Cunha mais uma vez emocionou-se ao fazer um balanço dos cinco anos a serviço do futebol feminino. “Além dos títulos na Copa América, participações olímpicas e em mundiais nas diversas categorias, conseguimos levar o futebol feminino a um patamar de divulgação que ele nunca teve. Há igualdade na estrutura de trabalho para homens e mulheres na Seleção, as mesmas condições. Fizemos trabalhos relevantes, como a consolidação das séries A1 e A2 do Campeonato Brasileiro. O futebol feminino é transmitido em canais abertos e fechados. Amistosos da Seleção também. O futebol feminino se mostrou para eles”, comemora o ex-funcionário da CBF.
Para Marco Aurélio Cunha, a maior conquista não tem preço: “Conseguimos quebrar o preconceito com o futebol feminino. Famílias têm orgulho de suas meninas serem jogadoras. Eu tenho recebido muitas mensagens de pais e mães relatando que têm craques em casa”, ri.
“Conseguimos quebrar o preconceito com o futebol feminino. Famílias têm orgulho de suas meninas serem jogadoras. Eu tenho recebido muitas mensagens de pais e mães relatando que têm craques em casa. Eu só carrego boas lembranças do futebol. As minhas saídas sempre foram muito boas, com legado moral sem questionamento, fazendo futebol bem feito, levando amigos. Não tem dinheiro, tem humanismo. Minha vida sempre foi unir pontos”
Independentemente de vencer (ou não) as eleições do São Paulo, Marco Aurélio Cunha fez uma promessa a Marta e companhia. “Tenha certeza de que se eu estiver livre no ano que vem, estarei nas Olimpíadas de Tóquio como torcedor. Pagarei tudo do meu bolso”, disse, descartando retornar ao cargo caso o Brasil seja eleito sede da Copa do Mundo de 2023. “Não, isso não, o plano é passar pela pré-candidatura no São Paulo”, desconversou.
Por falar no time do coração, o médico e ex-vereador de São Paulo não considera o maior desafio na vida. “A projeção do cargo é desafio para qualquer um que vá mexer com clube. Mas tive outros desafios. Ser campeão paulista pelo Bragantino (sob o comando de Vanderlei Luxemburgo) não é fácil. Ser campeão da Série B pelo Juventude. Catarinense com o Figueirense. Trabalhar no Japão como médico (Kashiwa Reysol e Verdy Kawasaki). Ser médico da Jamaica na Copa de 1998 (com o técnico Renê Simões). Eu só carrego boas lembranças do futebol. As minhas saídas sempre foram muito boas, com legado moral sem questionamento, fazendo futebol bem feito, levando amigos. Não tem dinheiro, tem humanismo. Minha vida sempre foi unir pontos e acho que consegui novamente isso ao fechar o ciclo na Seleção feminina”, disse.
“A projeção do cargo (de presidente do São Paulo) é um desafio para qualquer um que vá mexer com clube. Mas tive outros desafios. Ser campeão paulista pelo Bragantino não é fácil. Ser campeão da Série B pelo Juventude. Trabalhar no Japão como médico (Kashiwa Reysol e Verdy Kawasaki). Ser médico da Jamaica na Copa de 1998”
Antes do fim da entrevista, Marco Aurélio Cunha lembrou-se de Oswaldo Alvarez, o Vadão. O ex-técnico da Seleção feminina morreu no mês passado. “O Vadão me fez refletir bastante nesse momento. Ele teve uma participação importantíssima e decisiva. As críticas foram pesadas a ele. Fomos eliminados do Mundial pela França por detalhes. Aí na sequência vem esse momento de dor e muita tristeza que foi a morte dele”.
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