Marcos Senna Marcos Senna defende perda de pontos, mando e rebaixamento. Foto: Vincenzo Pinto/AFP Marcos Senna defende perda de pontos, mando e rebaixamento. Foto: Vincenzo Pinto/AFP

Entrevista: Marcos Senna | Campeão da Euro-2008 com a Espanha, brasileiro fala sobre o Caso Vini

Publicado em Esporte

Ele é negro. Foi campeão da Euro-2008 vestindo a camisa da Espanha. Ídolo do Villarreal, time duas vezes semifinalista da Liga dos Campeões, o paulistano Marcos Senna da Silva, 46 anos, mora a 500m do estádio Mestalla, palco dos atos racistas de parte da torcida do Valencia contra Vinicius Junior. Em entrevista ao blog, o volante aposentado, hoje diretor de relações internacionais do Villarreal, fala sobre a crise aberta com os constantes ataques ao principal jogador do Real Madrid na temporada. Senna sugere punição severa aos agressores, afirma que a Espanha não é um país racista e cobra autoridades da Fifa, Real Federação Espanhola de Futebol, La Liga e Real Madrid.

 

Qual é sua opinião sobre o caso?
Lamentável. Uma situação que não deveria acontecer em nenhuma parte do mundo. Estamos no século 21. Não é a primeira vez, mas essa foi um pouco mais gritante. O que acontece aí no Brasil acontece aqui. Aí de uma forma menor. Foi muita gente gritando de uma maneira asquerosa, racistas fdp.

 

Acha que a reação do Vini é um marco no combate ao racismo?
O que a gente espera é que, a partir de agora, mude. Não tenho fé de que vai estancar, mas pelo menos que abra os olhos. Chegamos no ponto que não cabe mais. O vaso está cheio. Por mais que se proteste, quem tem que decidir são os grandes. Fifa, federações, presidente do Real Madrid. Eles precisam tomar decisões.

 

Qual é a sua sugestão?
A solução é radical. Perda de pontos, mando de campo e, em último caso, rebaixamento.

 

Você mora a 500m do Estádio Mestalla e sente o clima dos jogos. Qual é o perfil dos agressores?
É uma torcida bem fervorosa, vai ao estádio, mas tem essa parte de imbecis. São pessoas que vêm para o campo desafogar o que acontece na casa deles em alguém. O alguém dessa vez é o Vinicius. De uma maneira muito cruel.

 

É a mais radical do Valencia?
São os ultras. Influenciam o jogo com essa atitude. Há risco de o Valencia cair (para a segunda divisão) e o duelo com o Real Madrid era relevante nessa briga. Quiseram criar um clima (hostil). Mas nada disso justifica. Foi um ato terrível. Tem que punir. Tenho certeza de que os próprios dirigentes estão com uma pulga atrás da orelha sobre o que vai acontecer. Provocação pode ser feita, agora, insultando, xingando de macaco, é crime. Todo mundo apontando o dedo apenas para um é puro e duro racismo.

 

Por que o alvo é o Vinicius?
Aqui, quem não é Real Madrid, é contra, e tem um plus de ódio. O Vinicius, com a alegria dele, a irreverência, o jeito, irrita. Hoje, ele é o protagonista do Real, mais que o Benzema. Um menino de personalidade. Não se enruga. Por isso acontece. Como parte da torcida acha que pode desestabilizá-lo: chamando de macaco. Tem que punir severamente. Não tem outra solução. Esses que gritaram podem ser identificados. Foi escandaloso. Ninguém se escondeu. Quem estava ao lado deveria ajudar. Tinha que prender todos.

 

Como avalia o posicionamento do presidente da Liga, Javier Tebas?
Foi errônea a atitude dele. Tentar justificar o injustificável. Equívoco completo. Mas nós que estamos aqui sabemos. Existe um jogo de interesses. La Liga e Federação Espanhola não se cruzam. Vini está no meio de uma guerra política.

 

Você é um cara empático. Difícil se colocar na posição do Vini?
Eu estava super feliz com a temporada dele. Veio para cá e foi vítima de chacota. Seguiu trabalhando, tampou as orelhas e olha onde chegou. No patamar dos melhores. Deveria ter entrado na lista dos finalistas ao prêmio de melhor do mundo, mas deve estar na próxima com Haaland e De Bruyne. Ele superou o Benzema.

 

Você vive na Espanha. Considera o país racista?
Tenho muitos amigos. Sinto o carinho enorme. Ando de cabeça erguida. Não sofri (racismo), portanto, não quero generalizar. O povo do Villarreal me ama. Acontece tudo ao contrário comigo. Seria injusto dizer que é um país racista. Há problema de valores que a gente aprende em casa. Não existe punição e as pessoas se sentem livres. Vão para casa felizes. No meu entorno, não conheço nenhum que teria essa conduta. Repito em letrar garrafais: seria injusto dizer que o povo espanhol é racista. Injustiça com o carinho que me deram na seleção.

 

O episódio em que uma banana é atirada no campo e o Daniel Alves come foi no campo do Villarreal. Como o clube combateu o racismo?
A gente repudia qualquer ato racista. Isso é crime. Estou vinculado lá (como diretor de relações internacionais). Aconteceu um fato lá no campo do próprio Villarreal. Jogaram uma banana no Daniel Alves. Aquele menino foi expulso e nunca mais voltou ao estádio. Nunca mais teve sequer ruído imitando macaco. Aconteceu e depois disso nunca mais. É preciso identificar o indivíduo, punição financeira boa e, principalmente, cadeia.

 

Como tem sido a repercussão do Caso Vini?
O dia inteiro. Acompanhei em nível nacional. O que eu vejo aqui é que eles se deram conta da gravidade. Sabem que nós, como brasileiros, estamos consternados com a situação. Eles apertaram bastante que tem que sancionar, Isso não pode acontecer. Consideram uma mancha. A imprensa está em cima. Acontece que eles podem tomar decisão.

 

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