Empate com Palmeiras faz o Flamengo reviver dilema da era Renato: “quem tudo quer nada tem”

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Em outubro do ano passado, Renato Gaúcho comprou briga com deuses rubro-negros e o mundo ao perder para o Fluminense, desperdiçar a chance de se aproximar do Atlético-MG e justificar com uma polêmica tese: “Quem tudo quer nada tem”. Houve revolta generalizada nas redes sociais pelo fato de o técnico ter nas mãos o tão sonhado elenco de R$ 200 milhões. O desfecho da história você sabe: o Flamengo ficou sem Copa do Brasil, Brasileirão e Libertadores. Além de priorizar as copas, acumulava problemas físicos, técnicos e clínicos. Basta lembrar que Arrascaeta voltou a campo contra o Internacional, no Beira-Rio, na última partida antes da final da Libertadores,  e  jogou a decisão, em Montevidéu, no sacrifício.

Bem mais comedido do que Renato Gaúcho, Dorival Júnior não repetirá o discurso “sincerão” do colega ao pé da letra, mas nas entrelinhas agiu de forma parecida ao optar pelo time reserva em uma partida tão relevante como a desse domingo contra o Palmeiras. Assumiu o papel de gerenciador de risco. O treinador rubro-negro temeu, sim, perder jogadores para o que foi estabelecido como prioridade depois da chegada emergencial ao clube para assumir os problemas deixados por Paulo Sousa: avançar nas copas e, se possível, conquista-las.

Para mim, o empate no Allianz Parque era o placar óbvio. De um lado estava Abel Ferreira em situação confortável. A vantagem de nove pontos dá maleabilidade ao português para negociar resultados na maratona pelo título. Perder dois pontos em casa não seria prejudicial à saúde alviverde nos pontos corridos. Do outro, havia Dorival Júnior administrando o traumático dilema “quem tudo quer nada tem”. Escalar força máxima e assumir o risco de perder peças importantes para os duelos com São Paulo e Vélez Sarsfield ou guardar as melhores cartas na manga para ser rei de copas.

Dorival Júnior tem um plano e escolheu ser fiel não somente a ele, mas a um elenco que comprou a ideia. O time considerado principal disputa as copas. O reserva é responsável pela corrida de recuperação na Série A. Algo parecido com o que fez o próprio Palmeiras na conquista do Brasileirão de 2018 durante a gestão de Luiz Felipe Scolari. O Flamengo foi catapultado pelo time B do 14º lugar para a vice-liderança. A igualdade em São Paulo recuou o time carioca para a terceira colocação. Portanto, como abrir mão do segundo time? Como usar a formação de gala em dois jogos consecutivos em estádios com gramado artificial, tema abordado em uma matéria do Correio Braziliense na semana passada, e sair ileso antes da semifinal com o São Paulo? Parece simples. Só que não.

Dizer que o Palmeiras sofreria mais ou menos com o time principal ou reserva do Flamengo é especular. Abel Ferreira tem o elenco dele nas mãos. Estava pronto para as duas possibilidades. Mais do que isso: o time dele é o que mais se reinventa e se molda às dificuldades impostas por qualquer adversário com a partida em andamento. Soube se virar com um — e depois dois a menos — em casa contra o Atlético-MG nas quartas de final da Libertadores. Foi reprogramado no início no segundo tempo diante do Flamengo e empatou o jogo.

No primeiro tempo, Abel Ferreira errou ao dar muito espaço para Ayrton Lucas oferecer ao Flamengo o que tem de melhor: campo para apoiar o ataque. Guardadas as devidas proporções e comparações, ele é o Rodinei do time reserva, um dos pontos fortes, a válvula de escape. O lateral-esquerdo deitou, rolou e até deixou no chão Marcos Rocha no lance do belo cruzamento para Victor Hugo abrir o placar no Allianz Parque.

A avenida “Marcos Rocha” acabou quando Abel Ferreira inverteu seus pontas, colocou Dudu aberto na direita, controlou os avanços de Ayrton Lucas e obrigou o jogador a se dedicar muito mais ao papel defensivo — virtude de Filipe Luís, não dele. Mesmo assim, o lateral comportou-se muito bem e teve uma excelente atuação em diferentes papéis. Se houve falha no lance do gol de empate do Palmeiras, podemos atribuí-la a Thiago Maia. O volante acompanhava o meia e deveria ter travado o belíssimo e indefensável chute de Raphael Veiga.

Para mim, Dorival Júnior demorou a perceber a mudança de postura do Palmeiras no apito inicial da segunda etapa. Estava claro desde os primeiros minutos que Ayrton Lucas não teria mais espaço e a pressão cresceria. Quando finalmente decidiu adicionoar jogadores capazes de reter a bola a fim de dosar o ímpeto dos anfitriões era tarde demais para buscar o segundo gol. Muito mexido com as entradas de Pedro, Everton Ribeiro, Arrascaeta e Vidal, o time demorou a se achar. Teve chances, principalmente no primeiro tempo, de fazer o segundo, com Matheuzinho e Pablo, mas também escapou da derrota no lance de Wesley perto do fim do confronto no Allianz Parque. O empate foi justo.

Dorival Júnior pode ter exagerado na escolha da escalação, mas não tem culpa se Paulo Sousa deixou um passivo no Brasileirão difícil de ser administrado. Enquanto isso, Abel Ferreira caminha para conquistar o título pessoal inédito com a sabedoria de um monge tibetano. Ele sabe que não precisa ganhar todos os grandes jogos. Logo, negocia resultados. Exemplo: o Palmeiras pode ser campeão sem vencer os principais concorrentes. Empatou duas vezes com o Flamengo (0 x 0 e 1 x 1) e uma com o Atlético-MG em casa (0 x 0). Três pontinhos preciosos dos oito que tem de vantagem na liderança isolada.

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Marcos Paulo Lima

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