Da beira do caos ao ramonismo: à espera de projeto para a Copa, Brasil recupera hegemonia no Sub-20

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A festa do Brasil em Bogotá: 12º título no Sul-Americano Sub-20. Foto: Divulgação/CBF

 

Sem técnico há mais de dois meses e à espera de um projeto para a Copa do Mundo de 2026, daqui a três anos e meio, no Canadá, Estados Unidos e México, o Brasil tem uma nova safra vitoriosa na base que acaba de sair do forno. Só não sabe ainda o que fará com ela na transição para a principal. A Seleção não conquistava o Sul-Americano Sub-20 havia 12 anos. A última geração campeã, em 2011, no Peru, coincidentemente em uma decisão contra o Uruguai, teve quatro representantes na Copa do Mundo do Catar: os laterais Danilo e Alex Sandro, o volante Casemiro e o atacante Neymar. Daí a relevância de um programa inexistente.

 

Na base, todos foram comandados por Ney Franco, o técnico-cantor autor da música Na beira do caos. À época, o treinador de futebol profissional, inclusive com títulos da Copa do Brasil e da Sul-Americana no currículo, topou dar um passo atrás na carreira. Reviveu os tempos de professor das categorias de base para formar uma safra que ainda não foi capaz de brindar o país com o hexa. Ramon Menezes deu marcha à ré semelhante na carreira e levou o brasiliense Robert Renan, Vitor Roque, Andrey Santos e companhia ao título invicto do torneio continental neste domingo ao derrotar o Uruguai por 2 x 0 no Estádio El Campín, em Bogotá, na Colômbia.  

 

Assim como Ney Franco, Ramon acumulava experiência em times pequenos, médios e gigantes do futebol brasileiro. O ex-meia iniciou a carreira de treinador na Associação Esportiva Evangélica de Goiás, mas também teve nas mãos pranchetas de clubes badalados como o Vitória e o Vasco. Enquanto Ney Franco era lembrado pela composição da canção Na beira do caos nas conquistas do Sul-Americano e do Mundial Sub-20 em 2011, Ramon Menezes ficou marcado pela expressão “ramonismo”, o estilo de jogou que levou o Vasco à liderança na quarta rodada do Campeonato Brasileiro de 2020. O desafio, agora, é emular Ney Franco e reconquistar o Mundial Sub-20, de 20 de maio a 11 de junho, na Indonésia. 

 

Ramon levou à Colômbia uma seleção forte, mas pode ter um elenco ainda melhor. Clubes como Flamengo, Santos e Palmeiras se negaram a liberar joias como Matheus França, Ângelo e Endrick. Talentos como Victor Hugo, Giovanni, Beraldo, Marcos Leonardo e Matheus Martins também foram cortados em relação à lista original para o Sul-Americano. 

 

Quem ficou não decepcionou. Vítor Roque aproveitou a oportunidade. Sai do Sul-Americano maior do que entrou: artilheiro com seis gols ao lado de outra baita promessa. Como joga o volante Andrey Santos. Foi dele o primeiro gol no triunfo contra o Uruguai. Uma cabeçada consciente sem sair do chão. Impressionante a capacidade da cria de São Januário para desarmar, armar e se posicionar muito bem na área para finalizar. Recém-contratado pelo Chelsea, o jovem de 18 anos fez a mesma quantidade de gols de Vitor Roque. 

 

A base do Brasil continua conquistando títulos. O deste domingo é o 12º na categoria. O país é bicampeão dos Jogos Olímpicos — um torneio sub-23. Em 2011, a geração de Neymar e Philippe Coutinho ganhou o Sul-Americano e o Mundial Sub-20. Em 2015, Gabriel Jesus levou a amarelinha ao vice no Mundial Sub-20 da Nova Zelândia. A Seleção é a atual campeã mundial sub-17. Gabriel Verón foi um dos astros do tetra em Brasília. 

 

A questão é a transição das seleções de base para o profissional. Muitos jogadores ficam pelo caminho. Saem do radar da CBF. Alguns até se naturalizam para defender outros países mesmo tendo vestido o uniforme verde-amarelo nas categorias inferiores. 

 

Tão importante quanto a escolha do sucessor de Tite é a CBF elaborar um programa coeso para a Seleção Brasileira da base ao profissional. Um projeto semelhante ao que levou Espanha (2010), Alemanha (2014) e França (2018) ao título da Copa do Mundo. Todos trataram a base com seriedade. Os franceses alcançaram as últimas duas finais colhendo frutos do que foi semeado no centro de treinamento de ponta em Clairefontaine. Didier Deschamps encerrou a decisão contra a Argentina usando jovens para duas ou três copas. 

 

Sem técnico há mais de dois meses, a Seleção ainda não tem um projeto a três anos e meio do Mundial no Canadá, Estados Unidos e México. Falta um mentor para o plano que terá de ser tocado a toque de caixa. Carlo Ancelotti ou outro técnico estrangeiro assumirá o Brasil com a missão tão somente de bordar a sexta estrela no peito ou refundar a Seleção em longo prazo como tem feito, por exemplo, a sueca Pia Sundhage no futebol feminino?  

 

Essas e outras perguntas precisam ser respondidas urgentemente pelo presidente da CBF Ednaldo Rodrigues e seus escolhidos. Vão muito além do sucesso no Sul-Americano Sub-20 da Colômbia. O Brasil precisa de um norte. Especula-se até que Ramon Menezes seja técnico interino da Seleção principal na Data Fifa de março enquanto o dirigente ganha tempo para contratar o tão sonhado medalhão europeu. Não custa lembrar que o tri da Argentina começou assim. Lionel Scaloni, então técnico da seleção sub-20, assumiu o elenco principal como interino, foi ficando, ficou e brindou o país com o tri no Catar. 

 

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