Da “alegria nas pernas” aos “perninhas rápidas”: o risco de o Brasil sobrecarregar os novos “Bernards”

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Em 2014, o então treinador do Brasil, Luiz Felipe Scolari, batizou um dos xodós dele, o meia-atacante Bernard, de “alegria nas pernas”. O jovem ponta do Atlético-MG virou alternativa de velocidade, dribles, um contra um na Copa das Confederações e na Copa do Mundo. A comissão técnica só não contava que Bernard passaria de acessório a peça principal depois da grave lesão de Neymar nas quartas de final contra a Colômbia. Aos 21 anos, Bernard foi escolhido para substituir o camisa 10 na semifinal contra a Alemanha, no Mineirão, não deu conta e o restante da história eu e você conhecemos muito bem…

Oito anos depois, Tite escolheu a expressão “perninhas rápidas” para celebrar o cardápio variado de pontas para solucionar demandas ofensivas da Seleção na reta final de preparação para a Copa do Qatar. Embora a definição seja simpática e midiática em relação a opções como Vinicius Junior, Raphinha, Antony e Gabriel Martinelli, há um peso implícito. A crítica e os torcedores passaram a interpretar que esses caras chegaram para acabar com o samba de uma nota só — leia-se, a dependência do fora de série Neymar.  Há quem veja Vinicius Junior com status para dividir o protagonismo. Pra mim, ainda não. Basta lembrar que ele é coadjuvante de Benzema, Modric, Kroos, Casemiro, Courtois…

Aqui mora o perigo. Os “perninhas rápidas” ainda não têm costas largas nem corpo marcado como o de Neymar para suportar as chicotadas. São coadjuvantes de um time que continua refém de apenas um protagonista. Neymar precisa jogar como fora de série para elevar o patamar dos pontas. E os meninos precisam de atuações no limite para dialogar com Neymar. Isso leva tempo. Não funcionaria em um estalar de dedos no amistoso contra o Japão.

Raphinha, Vinicius Junior, Neymar e Lucas Paquetá jogaram juntos pela primeira vez nesta segunda-feira, no Estádio Nacional de Tóquio. Foram testados durante 75 minutos. Havia sido assim, também, na goleada por 4 x 0 contra o Chile, no Maracanã, pelas Eliminatórias. Como Raphinha estava lesionado, Antony compôs o quarteto. Independentemente de nomes, os “perninhas rápidas” não devem ser vistos como fim dos problemas da Seleção Brasileira, mas meios de fortalecê-la.

O gol da vitória contra o Japão saiu seis minutos depois de o quarteto ser totalmente desfeito para a entrada de um centroavante. O time era o seguinte aos 31 minutos do segundo tempo: Alisson; Éder Militão, Marquinhos, Thiago Silva e Guilherme Arana; Casemiro e Lucas Paquetá; Gabriel Jesus, Neymar e Gabriel Martinelli; Richarlison. Havia um falso ponta na direita, um autêntico na esquerda e um homem de referência dentro da da área.  Os perninhas rápidas Raphinhas e Vinicius Junior já estavam no banco.

Encurralado, o Japão cometeu pênalti e Neymar decretou a vitória. Tenho a impressão de que, hoje, Tite sente-se mais seguro com a Seleção escalada com um “perninha rápida”, ou seja, Raphinha aberto na direita, e um falso ponta na esquerda: o versátil Lucas Paquetá. Com isso, Neymar pode atuar centralizado atrás de um centroavante — não como falso nove, papel que tentou desempenhar durante 75 minutos na partida deste sábado. Funcionou nos 4 x 0 sobre o Chile porque a marcação do adversário era frouxa comparada à do Japão.

Portanto, quando Tite pede calma na empolgação com os “perninhas rápidas”, é porque ele sabe exatamente qual é o papel hierárquico dos pontas na engrenagem da Seleção. Eles chegaram para dar uma nova dinâmica ao sistema de jogo do Brasil, mas o peso da decisão continua nos ombros dos mais experientes, os chamados homens de confiança. Richarlison, Neymar, Philippe Coutinho e Gabriel Jesus saem fortalecidos dessa data Fifa. Fizeram o que Tite espera deles nas vitórias contra Coreia do Sul e Japão. Responderam quando foram acionados.

Tite está certo ao blindar os “perninhas rápidas”. Tenta evitar ao máximo que a crítica os veja como enxergou Bernard no fatídico 8 de julho de 2014. Hoje, Vinicius Junior, Raphinha, Antony, Gabriel Martinelli e outros são acessórios em um elenco que até outro dia sofria com a falta de jogadores como eles. Todos chegaram para somar, não para resolver.

Não é informação. Mero palpite. Se a Copa do Mundo começasse hoje contra a Sérvia, Tite escalaria: Alisson; Danilo, Marquinhos, Thiago Silva e Alex Sandro; Casemiro e Fred; Raphinha (Gabriel Jesus), Neymar e Lucas Paquetá; Richarlison. Acho que Vinicius Junior começaria no banco.

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Marcos Paulo Lima

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