Conversando sobre Vinho

Aplicação da Teoria das Peneiras na escolha de um vinho

Estão decretando o fim das cartas de vinho impressas, sempre gostei mais das que vinham encadernadas em couro. Não sei qual moda veio primeiro se a do QR-Code, para ficarmos procurando no celular, ou a de não ter nada, nem QR nem carta, restando apenas a orientação do Sommelier ou a de percorrer as prateleiras de vinho do restaurante.

Aconteceu comigo. Nas suas mídias o restaurante de culinária portuguesa em Ipanema, Rio de Janeiro, propagava ter 1200 rótulos à disposição do freguês. E lá estavam todas as 1200 garrafas espalhadas por várias paredes em diversas prateleiras climatizadas. E eu só queria um único vinho! E não tinha carta!

Para solucionar minha charada chamei o Sommelier e apliquei com ele o método da Teoria das Peneiras. Quando você passa algo numa peneira o objetivo é deixar de fora tudo que não deseja e com peneiradas sucessivas poderemos reduzir as opções oferecidas.

* Peneira 1: Tipo de Vinho: qual deseja tomar: tinto, branco, rosé, espumante, fortificado? (Quando respondi que era branco reduzi, de cara, as opções a menos da metade)

* Peneira 2: Região: Qual é o país de origem do vinho? França, Itália, Espanha, Chile? Ainda pode acrescentar a região. Cada uma tem suas características e estilos de vinho. (no meu caso acompanhei a culinária da casa e fui de Portugal, baixando para uns 300 rótulos de brancos)

* Peneira 3: Estilo do Vinho: jovem, barricado, mais ou menos ácido, mais ou menos taninos, teor alcoólico, tipo de uva, etc. (Selecionei Vinho Verde)

* Peneira 4: Preço: Estabeleça um limite de preço máximo e mínimo para reduzir as opções. (Fui de menos de R$200,00 e mais de R$150,00)

Dos 1200 rótulos iniciais as peneiras deixaram passar apenas 6 vinhos. Aí pude utilizar a peneira final, que possui algumas opções.

* Peneira 5: Conhecimento:

–  já provou e gostou de algum deles?

– Recomendação de amigos ou de especialistas;

– Análise das informações do rótulo;

– pesquisa em aplicativos;

– e, a minha opção predileta, conversar com o Sommelier da casa e chegar a um consenso.

A escolha de um vinho é muito subjetiva, mas as peneiras sucessivas, reduzem as opções e permitem a escolha de um rótulo que atenda aos nossos critérios e preferências.

Uma garrafa de vinho, selecionada dentre mais de um milhar de outras ganha o mesmo status do pé de milho da crônica do Rubem Braga, que nascido “sozinho, em um canteiro, espremido, junto do portão, numa esquina de rua (em Ipanema) — não é um número numa lavoura, é um ser vivo e independente”. Era igual aos milhares e milhares de outros pés de milho que brotam em centenas de milharais. Igual, mas, ao mesmo tempo, era diferente. Aquele solitário pé de milho, naquele momento, ao alcance do seu olhar e do cuidado das suas mãos, era especial por ser único. Da mesma forma observar apenas uma garrafa de vinho é diferente de observar milhares.

Há muitos vinhos bons no mundo, e o que escolhi não seria o melhor de todos. Mas aquele líquido de cor, aromas e sabores intensos, que teve suas uvas beijadas pelo vento do mar, veio enriquecer minha refeição vulgar com uma força e uma alegria que fazem bem. *

*Parágrafo “inspirado”, quase que copiado, numa homenagem a Rubem Braga.