Empresas não podem negar nota fiscal ao consumidor

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Nota fiscal é o documento que comprova consumo

Por Patrícia Nadir*

DA/CB Press

A emissão de nota fiscal, além de ser um direito do consumidor e de garantir o pagamento dos impostos pelos empresários, constitui uma garantia posterior de que o serviço foi prestado por determinada empresa ou até para trabalhadores que precisam solicitar ressarcimentos ou comprovar despesas perante órgãos públicos ou à Justiça. Apesar da previsão legal, são inúmeros os relatos de clientes que não recebem o documento.

A veterinária Marcella Adriene Pinho, 24 anos, enfrenta esse problema com frequência. Moradora de Santa Maria, ela tem a guarda provisória da avó Olinta Maria, 86, que tem demência senil. Ela conta que, por indicação de um promotor de justiça, guarda todas as notas fiscais de compras relacionadas à idosa para comprovar os gastos perante o juiz posteriormente. “Há mais ou menos um mês, eu tenho a guarda dela. Desde então, a dor de cabeça é grande quando o assunto é esse. Diversos estabelecimentos não entregam a nota. Sempre dão alguma desculpa”, relata.

Volta e meia, a jovem precisa discutir com os vendedores para garantir o direito dela. “Esses dias, eu pedi comida num foodtruck e deixei bem claro que precisava da nota. Na hora que o lanche chegou, veio sem. Eu falei com a vendedora, ela foi extremamente grossa, dizendo que estavam sem certificação e, por isso, não podiam emitir. Eu tive de pedir para falar com o gerente. Aí, ele ficou de levar em casa até o fim do dia. Foi uma situação bem chata, mas que, infelizmente, é recorrente”, desabafa Marcella.

Quem passou por um transtorno semelhante foi a secretária Izaura Santos, 32, que trabalha em um escritório de arquitetura no Setor Comercial Sul. Na semana passada, a funcionária precisou tirar cópias das plantas de um projeto desenvolvido pela empresa, mas teve dificuldades para conseguir o documento fiscal. “Como estava com pressa, tirei o dinheiro do meu bolso para pagar e, depois, o escritório me ressarciria. Por isso, precisava da nota para comprovar o valor e ficar tudo registrado. No entanto, a copiadora estava sem papel para emitir, daí combinamos de levarem ao meu trabalho no dia seguinte”, conta.

A brasiliense não imaginava o contratempo que estava por vir. “Demorou semanas até eu conseguir resolver a situação. Foi uma enrolação: o pessoal da papelaria ficava inventando desculpas e nunca entregava a nota. Chegou o momento de eu querer deixar para lá. Porém, meu chefe, vendo que meu prejuízo financeiro ia ser grande, interveio.” O caso só foi resolvido quando o patrão dela foi ao local e ameaçou recorrer à Justiça.

Garantia

É importante sempre exigir e guardar a nota fiscal, porque, além de ser um direito do consumidor, ela o resguarda em caso de problemas com o produto adquirido. Em maio deste ano, o professor Marcos Silvino, 40, ficou feliz por ter reivindicado o comprovante em uma compra. A fim de realizar um clareamento dental, ele procurou uma clínica odontológica em Taguatinga, região onde mora, mas o tratamento não deu o resultado esperado. “Quando o tratamento acabou, eu notei um efeito contrário: meus dentes ficaram amarelados. No dia em que fui reclamar, a clínica não quis se responsabilizar e negou qualquer ajuda. Tive de recorrer ao Juizado Especial. Ter a nota fiscal com certeza facilitou na hora de provar a injustiça”, lembra.

Para evitar contratempos indesejáveis, é preciso ficar atento às recomendações. O advogado especialista em direito do consumidor Kléber Gomes adverte que, nas situações em que o consumidor se sentir lesado, ele pode recorrer aos órgãos fiscalizadores. “Os clientes devem buscar proteção no Procon, ou até mesmo fazer uma denúncia na Secretaria de Fazenda, órgãos competentes para a fiscalização e a autuação de empresas que negam o direito”, aponta o integrante da Comissão de Direito do Consumidor da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no DF.

O Procon adverte que, além de fazer uma reclamação, o consumidor pode procurar o órgão para registrar uma denúncia. No segundo caso, representantes do órgão vão até o estabelecimento para fazer a fiscalização. O instituto lembra que a obrigatoriedade da emissão cabe em qualquer situação, desde aquisições de eletrodomésticos até compras em lanchonetes: não há valor mínimo para a emissão.

O especialista Kléber Gomes destaca, ainda, que negar esse direito ao consumidor é crime. “A Lei nº 4.729, de 1965, combate a prática ao prever penalização de pagamento de multa, que pode variar de duas a cinco vezes o valor da compra da nota fiscal não emitida, além de detenção de seis meses a um ano. Há ainda previsão de punibilidade na Lei 8.137, de 1990, que trata dos crimes contra a ordem tributária, onde há a possibilidade de punição de multa e pena de reclusão de dois a cinco anos”.

* Estagiária sob supervisão de Mariana Niederauer

Entenda como a crise brasileira pode colocar direitos dos consumidores em perigo

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O delicado momento político e econômico que o Brasil vive suscita dúvidas sobre os avanços na defesa do consumidor e possíveis retrocessos. Em tempos de incerteza institucional, a preocupação das principais entidades de defesa do país é sobre as questões em aberto e possíveis brechas para burlar direitos já conquistados. Além disso, os projetos favoráveis aos consumidores podem ficar engavetados. Atualmente são 1.467 projetos de defesa do consumidor na Câmara dos Deputados e 875 em tramitação. Há também as consultas públicas para mudar as resoluções das agências reguladoras.

O Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (Brasilcon) afirma que, a curto prazo, o momento é delicado e requer vigilância. “As mudanças propostas não são para beneficiar o consumidor. Em tempos de crise, a tendência é de limitação dos direitos do consumidor, como aconteceu na Europa”, defende Paulo Roque Curi, diretor do Brasilcon. O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) também tem um postura crítica sobre a influência da situação política no avanço das relações de consumo. “Temas e assuntos estão sendo colocados na agenda ou pauta de votações – e às vezes delas retirados – como que num balão de ensaio, sem consequências práticas. A agilidade em julgar assuntos pendentes há décadas, para os quais já há jurisprudência favorável aos consumidores nos tribunais superiores seria um deles”, analisa Carlos Thadeu, gerente técnico do Idec.

Para Ricardo Morishita, professor e diretor do Departamento Nacional de Defesa do Consumidor do Ministério da Justiça entre 2003 e 2010, em momento de crise, o acompanhamento da sociedade deve ser mais intenso sobre a proteção de direitos. Para ele, esse é o preço da democracia. “Quando há fartura e crescimento é evidente que a defesa do consumidor tende a ser aplicada de forma mais tranquila. Nos momentos de crise e escassez, esses direitos precisam ser observados e respeitados”.

Entre os temas que mais preocupam as associações de defesa é o endividamento dos brasileiros no momento de crise. Já são quase 60 milhões de inadimplentes em todo o país, segundo dados da Serasa Experian. Um dos projetos de lei de modernização do Código de Defesa do Consumidor (CDC) que está na Câmara dos Deputados prevê um limite para o endividamento de até 30% da renda familiar. “Ainda não temos legislação de proteção ao endividamento. Ela seria importante agora em uma crise que chega a um consumidor que foi incentivado pelo governo e pelos bancos a se endividar”, explica Paulo Roque, do Brasilcon.

As possíveis mudanças em regulamentações da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) também preocupam as associações de defesa. Uma consulta pública que vai até o próximo dia 10 propõe, entre outras medidas, o fim da assistência das companhias aos passageiros em caso de atraso ou cancelamento do voo. A ajuda pode ser suspensa em casos de força maior imprevisível (como mau tempo que leve ao fechamento do aeroporto) ou caso fortuito. Essa questão vem sendo pleiteada pelas companhias de aviação civil, que alegam altos custos para o cumprimento da norma atual.

A Proteste Associação de Consumidores se posicionou contra o regresso de direitos constituídos e entrou com uma reclamação no Tribunal Regional Federal da 3ª Região, em São Paulo, para retirar a consulta pública em andamento. “Nessa crise política e econômica o consumidor está tendo perdas muito grandes. A consulta pública da Anac, por exemplo, a Proteste insurgiu contra porque ela está revogando direitos”, avalia Maria Inês Dolci, coordenadora institucional da Proteste.

Outro tema em andamento é o bloqueio da internet. Para os aparelhos móveis, há uma intensa briga judicial entre as operadoras e órgãos de defesa do consumidor. Por liminar, as companhias estão autorizadas a cortar o serviço após o consumo do pacote de dados. Mas para as associações, há desrespeito do CDC, por mudar o contrato vigente sem aviso prévio, além do descumprimento de regras da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Na mesma onda, as operadoras de serviço de internet banda larga também querem limitar as franquias e cortar o serviço. A Net, Oi e Vivo foram notificadas pela Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), do Ministério da Justiça, no último dia 23 para apresentarem justificativas do corte sem comunicado prévio ao consumidor. “Tudo que isso que acontece no Brasil prejudica o consumidor. A Proteste também entrou na Justiça contra a banda larga fixa. Essa situação atenta contra o Marco Civil da Internet”, afirma Maria Inês.

A retirada do símbolo “T” de transgênicos das embalagens também é outro importante assunto em aberto. O projeto de lei está no Senado e preocupa as associações que acreditam no cerceamento do direito à informação previsto no CDC. “O pior é que a resposta que a classe política tem dado às questões do consumidor não parece atender se não a interesses partidários ou de facções, seja para arrancar concessões de um governo federal fragilizado, seja para conquistar aliados no parlamento”, acredita Carlos Thadeu, do Idec.

DIREITOS EM RISCO:

>> Fim da assistência ao passageiro em caso de atraso ou cancelamento de voo:
Uma consulta pública na ANAC propõe o fim do direito material (comunicação, alimentação e acomodação) em caso de atraso de voos. A assistência pode ser suspensa em casos de força maior imprevisível (como mau tempo que leve ao fechamento do aeroporto) ou caso fortuito.

>> Limitação da banda larga fixa e da internet móvel
As operadoras de telefonia bloqueiam o serviço após o uso do pacote. O caso está na Justiça. Na última semana, a Secretaria Nacional do Consumidor, do Ministério da Justiça, pediu explicação às empresas de banda larga que estão cortando o pacote dos usuários nos moldes da internet móvel.

>> Transgênicos:
O projeto que retira a obrigação das empresas de colocar o T de transgênico nas embalagens está no Senado.

>> Endividamento:
O projeto de modernização do Código de Defesa do Consumidor está parado na Câmara dos Deputados. Entre os benefícios está a fixação de 30% do orçamento familiar para endividamento máximo.