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Mesmo após 23 anos da decisão do Superior Tribunal de Justiça, que estabeleceu a responsabilidade da empresa que guarda o estacionamento pela reparação de dano ou furto de veículo ocorridos no local, maioria dos usuários desconhecem o seu direito
Por Érika Manhatys* e Flávia Maia
Ao parar o carro em qualquer estabelecimento em que seja oferecido estacionamento para o uso dos clientes, é comum ver o alerta: “Não nos responsabilizamos por objetos deixados no interior dos veículos”. Esse aviso é tão utilizado que o consumidor, muitas vezes, crê que todo e qualquer dano que ocorra no seu automóvel será imputado apenas a ele. Porém, de acordo com a lei, a culpa recai sobre o comércio que mantém o estacionamento, seja ele pago ou gratuito.
A justificativa para questionar a responsabilidade ao estacionamento por avarias e furtos é complexa. Todavia, a jurisprudência complementa a discussão. E é ela quem garante a proteção do consumidor em uma disputa “empresa contra cliente”. A súmula n° 130, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), estabelece: “A empresa responde, perante o cliente, pela reparação de dano ou furto de veículo ocorridos em seu estacionamento”. O julgado é de 1995, mas até hoje, os estacionamentos se valem de alertas quanto à sua isenção. A determinação baseia-se em 10 decisões precedentes que datam de 1990 a 1993. Nessas, há as mais variadas situações de responsabilização civil do prestador de serviço.
O estabelecimento comercial, na função de estacionamento, é um prestador de serviços. Então, pode ser enquadrado no artigo 14, do Código de Defesa do Consumidor (CDC), que diz: “O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços”.
Ainda no parágrafo 1° e inciso II do mesmo artigo, está explicitada a razão da culpabilidade. “O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais: II — o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam”.
Além disso, o consumidor está amparado pelo Código Civil brasileiro. Ao deixar o carro aos cuidados de um estacionamento, o consumidor e o responsável pela guarda do veículo estão firmando um contrato chamado de “contrato de depósito”, em que o empresário se compromete entregar o bem conforme lhe foi entregue. Como é um contrato de adesão – em que o consumidor não tem como discutir as cláusulas -, a lei é expressa em dizer que, em caso de dúvidas, prevalece a cláusula que beneficia o contratante.
Amparado nesse embasamento legal e com aporte jurídico, a relação de consumo se torna mais justa e o usuário do serviço tem seus direitos resguardados. A proteção vale para a prevenção de equívocos gerados pelos avisos que eximem a culpa dos estacionamentos.
O advogado e especialista em Código de Defesa do Consumidor, Vinícius Cardoso, fundamenta-se no artigo 37 do CDC para explicar que “é enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação capaz de induzir ao erro o consumidor. Desse modo, poderá ser ajuizada ação para que esse aviso não seja mais exposto nos estabelecimentos. Contudo, esse assunto desrespeita o direito coletivo e, para impetrar uma ação na Justiça, há legitimados específicos, como o Ministério Público e os entes federados, ou seja, a União, estados, municípios e o Distrito Federal.
Três perguntas para Vinícius Cardoso, especialista no Código de Defesa do Consumidor
Além do tíquete, o que mais pode ser usado como prova pelo dano no veículo quando em um estacionamento?
Podem ser utilizados todos os meios de provas admitidas, como o boletim de ocorrência, fotografias do local, além de eventuais testemunhas. É importante também que o consumidor lesado procure a administração do estacionamento para obtenção do circuito interno de tevê. Se for o caso, deve fazer isso por escrito e guardar uma cópia da solicitação.
Há um prazo para o consumidor apresentar a reclamação?
O Código de Defesa do Consumidor registra, em seu artigo 27, que o prazo para reparação de danos é de cinco anos. Contudo, é prudente que o consumidor busque a Justiça o quanto antes, principalmente, para que sejam preservadas as provas.
Caso o estabelecimento negue a responsabilidade pelo dano, o que o consumidor pode fazer?
Em caso de estacionamento privado, o consumidor pode procurar a Justiça, tendo em vista que é entendimento dos nossos tribunais que a empresa responde, perante o cliente, pela reparação de dano ou furto de veículo ocorridos em seu estacionamento, nos termos da súmula 130 do Superior Tribunal de Justiça. Na hipótese de o dano ter ocorrido em estacionamento público e externo ao seu estabelecimento, a empresa não possui responsabilidade pelo ocorrido, tendo em vista que a utilização do local não é restrita aos seus consumidores.
* Estagiária sob a supervisão de Margareth Lourenço (especial para o Correio)