ENQUANTO ENGOMA A CALÇA

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Ana Maria Braga começou a entrevista dizendo pra Luísa Sonza que as pessoas criticam gente como ela, Luísa, que, com apenas quatro meses de relacionamento, já havia se declarado apaixonada publicamente e lançado a música de amor “Chico”, em homenagem ao então namorado Chico Moedas, que logo a traiu, o que também se tornou público. Aliás, na vida das chamadas celebridades, quase nada acontece em particular.

Acrescentou que ela, Ana Maria, casou-se com muito menos tempo de relacionamento e que só não fez música na ocasião porque não é compositora. Finalizou suas reflexões dizendo que as pessoas precisam respeitar a intensidade do amor, a capacidade de se entregar de cada um. E, desejando que quem sofreu por amor nunca perca o poder de se apaixonar, pediu que Luísa lesse um texto, um desabafo, que a própria Luísa escreveu quando soube da traição do namorado.

Antes de começar a ler, a compositora explicou que aquele escrito não era apenas sobre aquela situação que ela estava vivendo, mas sobre tudo o que ela havia visto desde criança. Não se tratava de algo isolado, mas de uma história que ela viu se repetir muitas vezes, com muitas mulheres como a mãe dela, como as tias dela. O texto fala que, lamentavelmente, cada vez mais, a traição, a quebra de confiança, as faltas de respeito, de zelo, de cuidado são consideradas normais. E fala da dor, da dúvida, da insegurança, do sofrimento, do sonho destruído, do sentimento de se sentir uma idiota.

Uma traição é algo muito doloroso, que muito nos afeta, especialmente numa relação amorosa que ainda está começando, cercada de fantasias, de encantamento, recheada de juras fadadas ao não cumprimento nas quais adoramos acreditar. Mas a verdade é que não dá para conhecer ninguém em quatro meses. Aliás, como me disse um professor quando eu ainda era estudante de Psicologia, só conhecemos realmente o parceiro quando dele nos separamos. É nesse momento que as máscaras caem e o caráter da pessoa se revela.

Não estou dizendo que as pessoas devem abrir mão de curtir a fase da “paixonite aguda”. Mas, atirar-se de cabeça é arriscado demais. Não podemos jamais esquecer que mal conhecemos a criatura que nos acompanha naquele vertiginoso looping. Por isso, precisamos ter todo o cuidado. E uma importante dica é ficar atenta não apenas ao que é dito pelo parceiro, mas, principalmente ao que não é dito. Precisamos observar se as atitudes e o discurso dele combinam.

Sei que, no começo de um relacionamento, quando nosso raciocínio está embotado, a nossa cabeça está nas nuvens e o nosso corpo está pegando fogo, tudo o que não queremos é ficar analisando aquele que imaginamos que pode ser o grande amor da nossa vida. Mas o nosso coração avisa quando há algo estranho, quando algumas peças não se encaixam de forma suave no quebra-cabeça que está sendo montado, quando precisamos forçar um pouquinho a barra ou nos fazer de bobas para que pareça que a coisa está fluindo.

E, para aquelas que vêm de famílias em que as mulheres colecionam desilusões amorosas, tenho a dizer que, em lugar de nos conformarmos com essa repetição de dissabores, como se fosse uma sina nossa repetir aquela história, como se nada pudéssemos fazer, como se esse enredo fosse algo inevitável, devemos procurar conhecer cada narrativa, cada biografia, cada percurso dessas mulheres, para identificar qual foi a participação de cada uma no que lhes sucedeu. Porque, por mais incrível que nos possa parecer, temos responsabilidade em tudo o que nos acontece, de bom e de ruim. E observem que não falei em culpa, mas em responsabilidade.

A verdade é que ninguém é de ninguém e que ninguém é fiel a ninguém, mas aos próprios sentimentos. Só que, no momento em que iniciamos um relacionamento e fazemos aqueles combinados, eles devem ser respeitados. Sempre há opções à traição, além da escolha de não trair, como, por exemplo, ser sincero com o parceiro e romper antes que aconteça o que aconteceu com Luísa e Chico que, provavelmente, também estaria se sentido um idiota se ela o tivesse traído de forma tão desrespeitosa.

Espero que Luísa aproveite esse episódio para aprender com ele. Espero que seja mais cuidadosa daqui pra frente. Espero que comece a ouvir a voz do seu coração e a observar os sinais, porque as pessoas sempre nos dão pistas de quem elas realmente são, desde o primeiro encontro, por mais maravilhosas que elas pareçam ser. Aliás, encontros maravilhosos com homens maravilhosos devem ser considerados pelas mulheres como um sinal de alerta, não para elas desistirem do relacionamento, mas para ficarem espertas! Muitos relacionamentos que começaram maravilhosos terminaram em muita dor ou, o que é pior, em feminicídio.

Eu também acho um horror que haja pessoas detonando a compositora por esse episódio. Mas, do ser humano, podemos esperar todo tipo de coisa. Então, o que tenho a dizer a Luísa sobre isso é o que costumo dizer nos meus textos: Tenha sempre em mente que os cães ladram, mas a caravana não se detém, ela passa.

E cante, Luísa! Cante muito! Como disse Ednardo no delicioso baião “Enquanto engoma a calça”,

“Porque cantar parece com não morrer
É igual a não se esquecer
Que a vida é que tem razão.”

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MARACI SANT'ANA

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