Cosette Castro
Brasília – Enquanto organizamos e participamos de lives para chamar atenção nacional sobre a campanha do Setembro Roxo, no grupo de WhatsApp do Coletivo FIlhas da Mãe, as demandas são outras. Mais concretas.
Estamos no mês mundial de conscientização sobre as demências, entre elas o Alzheimer. Mas nem sempre as campanhas mundiais traduzem a dura realidade cotidiana e as necessidades de quem cuida um familiar.
O Relatório Mundial sobre Demências 2024 revela, por exemplo, que 65% dos profissionais de saúde e de cuidado acreditam – incorretamente – que a demência é uma parte normal do envelhecimento. Não é!
A partir dessa desinformação e preconceito, um exemplo da violência estrutural contra pessoas idosas, os profissionais da saúde deixam de informar ou tratar pacientes a tempo. Com isso deixam também de oferecer qualidade de vida para as pessoas com diagnóstico e para seus familiares.
A falta de informações corretas, inclusive sobre a diferença entre envelhecimento natural e sintomas de demências, alimenta a circulação de fake news gerando outros problemas e estigmas.
A Comissão Lancet, formada por especialistas de diferentes países, listou no ano passado 10 itens diferenciando envelhecimento saudável dos sintomas de demências. E o Coletivo Filhas da Mãe disponibiliza online esse folheto, além de distribuir a versão impressa nos parques da Capital Federal. Mas essa ação deveria ser multiplicada para todo o país.
Estamos propondo e esperando políticas públicas urgentes voltadas para a formação permanente dos profissionais de saúde de todos os níveis, inclusive médicos.
Também aprovamos por unanimidade a Lei Distrital 6926/2022 que cria a Política Distrital sobre Alzheimer e Outras Demências. Mas o governador até hoje não implementou a Lei, mantendo a população na escuridão, sem informações e ações de prevenção.
De acordo com o Relatório Mundial sobre Demências, 88% das pessoas diagnosticadas na primeira fase relatam vivências de discriminação, seja no âmbito familiar, entre vizinhos, na rua, clínicas e hospitais.
Essas discriminações se manifestam na forma de infantilização da pessoa idosa, tratadas no diminutivo, como se já não conseguissem entender o que escutam. Ou no apagamento da pessoa diagnosticada em consultas, em lojas ou nos bancos quando os profissionais só falam com a pessoa acompanhante.
Outro ponto importante do relatório é a urgência de diagnósticos em tempo hábil, algo praticamente inexistente em países como o Brasil. Isso evitaria que as demências sejam descobertas a partir da segunda fase, quando a pessoa diagnosticada já está perdendo a autonomia total.
A falta de informações sobre as demências se espalha entre diferentes públicos.
80% da população acreditam que a demência é uma parte normal do envelhecimento, um aumento da desinformação dramático em relação aos 66% apontados no Relatório Mundial de 2019. Ou seja, a falta de campanhas nacionais permanentes e de políticas públicas aumentou o quadro de desconhecimento, confusão e medo.
A falta de informações têm consequências diretas na vida de quem recebeu diagnóstico e também de seus familiares. Principalmente no que diz respeito ao preconceito e ao estigma contra demências. Sem conhecer os sintomas, muitas pessoas se afastam da pessoa doente e da família.
No mundo todo, mais de 1/4 das 40 mil pessoas entrevistadas em 166 países e territórios no Relatório de 2024 acreditam, incorretamente, que não há nada a se fazer para prevenir as demências. Esse número aumentou de 20% em 2019 para 37% em 2024 em países com rendas baixas e médias, como o Brasil.
Para reduzir a desinformação, o Coletivo Filhas da Mãe distribui gratuitamente, online e no formato impresso nos parques de Brasília, folheto sobre os 14 Fatores Evitáveis para Prevenir as Demências. O material, produzido pela Comissão Lancet, deveria estar disponível para toda população, de Norte a Sul do país.
Enquanto a Política Nacional de Demências não é aprovada nem tem orçamento definido no Brasil, seguiremos fazendo o trabalho diário de acolhimento de quem cuida e informando a população sobre envelhecimento natural, ativo e saudável, sobre projetos de cuidado e autocuidado, e, principalmente, informando a população sobre o que são as demências, para reduzir o desconhecimento, o medo e o estigma.
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