Denise Fraga, as Demências e Outras Narrativas Reais

Compartilhe

Cosette Castro

Brasília – Eu não tenho o costume de tietar, mas fui fazer fila para assistir o primeiro dia da peça “Eu de Você” que estreou quinta-feira na Capital Federal.

O monólogo de Denise Fraga, baseado em narrativas reais de 35 pessoas, é dirigido por Luiz Villaça, diretor de cinema e de teatro, de séries para TV e documentários. A obra, que estreou em 2019, chega pela segunda vez na Capital Federal totalmente gratuita para a população.

Há dois requisitos importantes para assistir ao espetáculo que ficará em cartaz até o dia 28 de janeiro na Caixa Cultural.

O primeiro é enfrentar a longa fila que, segundo testemunhas, começou a se formar por volta de 15h da quinta-feira, com direito a cadeira de praia, lanchinho, água e livro debaixo do braço. Tudo isso para assistir uma obra marcada para iniciar às 20h.

O segundo requisito é a pontualidade. A peça começa exatamente às 20h e as portas são abertas 10 minutos antes para dar tempo ao público encontrar os lugares marcados. Quer tentar entrar depois desse horário? Não tem negociação.

Denise Fraga dispensa apresentação. É uma atriz consagrada e querida pelo público. E não apenas porque ficou conhecida na Globo, mas pela bela carreira que construiu na televisão, no cinema e no teatro.

O texto é baseado em relatos da vida real de pessoas anônimas e conhecidas. Pequenas histórias que mostram dores, medos, desamores, abandonos e outras experiências da infância e da vida adulta. Essas dores individuais, quando levadas ao teatro ganham, através da arte, uma dimensão coletiva. E muito mais força, com potencial de gerar empatia e solidariedade no público.

Denise Fraga está do nosso lado. Literalmente. Ela brinca, canta, dança, conversa com o público, sempre contando histórias reais costuradas com a ajuda de poetas, escritores, músicos e da banda de mulheres que a acompanha. E o público adora, mesmo quando se trata de relatos duros, difíceis de escutar.

Nem sempre é fácil se olhar no espelho. Ver no outro a própria dor. Se colocar no lugar do outro e tentar sentir uma dor que não vivemos. Ou simplesmente acolher. Esse é o convite de “Eu de Você”.

Histórias como a que mostra a tristeza de ver uma mãe perder a memória, mas que ainda consegue se conectar através da música. E da filha tentando a conexão, como fazem diariamente as filhas cuidadoras de pessoas com demência, entre elas o Alzheimer, pelo Brasil afora. Ainda mais quando descobrem que a música é a última memória que se perde.

Há muitas outras histórias nos 90 minutos de espetáculo. O tempo passa rapidamente sem que o público se dê conta. Enquanto isso, Denise nos oferece pequenas pílulas de vida como um convite à reflexão.

Em meio a dor, há muita risada. E um público apaixonado, que se deixa seduzir pelas brincadeiras da atriz mesmo quando ela fala sério.

O espetáculo tem alta qualidade. E não por acaso foi aplaudido de pé.

PS: Cada pessoa tem direito a dois ingressos. Como os lugares são numerados vale a pena aproveitar para assistir as exposições, também gratuitas, que estão acontecendo na Caixa Cultural.
PS 2: A sessão de 21 de janeiro contará com libras e audiodescrição.

Cosette Castro

Posts recentes

Em Defesa de uma Sociedade do Cuidado

Cosette Castro Brasília - A semana passada foi intensa em todos os sentidos. Hoje destacamos…

3 dias atrás

O Indizível em Ainda Estou Aqui

Cosette Castro Brasília - Às vezes, quando ficamos sem palavras frente a uma situação ou…

7 dias atrás

O Dinheiro Público e o Corte de Gastos Sociais

Cosette Castro & Vicente Faleiros Brasília - A disputa pelo dinheiro público do orçamento da…

1 semana atrás

O Quarto ao Lado de Todos Nós

Cosette Castro Brasília - Em tempos de negação constante da morte, o filme O Quarto…

2 semanas atrás

O Brasil e a Herança Africana

Cosette Castro Brasília - Este foi um fim de semana especial. Começou o novembro negro…

2 semanas atrás

Enfim a Justiça Chegou

Cosette Castro Brasília - Seis anos, sete meses e 17 dias. A Justiça é lenta,…

3 semanas atrás