A Formalização de um Movimento Social

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Cosette Castro & Natalia Duarte

Brasília – Quem Cuida de Quem Cuida?

Há quatro anos criamos um coletivo que se propôs a ir além das questões relacionadas apenas à doença, mas que levasse em consideração os desafios cotidianos de quem cuida.

Sobrevivemos à pandemia e aos cortes de verbas para a saúde. Nos reinventamos no mundo virtual. Tudo informalmente. Ao completar quatro anos, é preciso dar mais um passo: a formalização.

A convidada de hoje é a professora da UnB Natalia Duarte, co-cuidadora do pai que escreve sobre a formalização de movimentos sociais, como o Coletivo Filhas da Mãe.

Natalia Duarte – “Nas últimas semanas Ana e Cosette têm escrito sobre as dezenas de ações que o Coletivo Filhas da Mãe realiza intensa e regularmente. Sobre os reconhecimentos e premiações que o Coletivo recebeu, as constantes participações em diversos fóruns de debate sobre políticas de cuidado, sobre envelhecimento, sobre pessoas com demências, sobre cuidadoras familiares e profissionais.

Estamos em tempo de inventariar as ações de mãos-dadas para o bem-viver porque estamos comemorando os quatro anos do Coletivo. Toda vez que a gente para e lista o que fizemos, ficamos boquiabertas: “como foi que a gente fez tudo isso?”

Essa é uma pergunta que tem múltiplas respostas.

Os movimentos sociais são grupos de pessoas que defendem, demandam e lutam por uma causa. É a forma com que grupos se organizam, acolhem, expressam seus anseios, suprem demandas, lutam por seus direitos. Mas mais do que isso. Alguns também se tornam uma rede de apoio, onde as pessoas crescem juntas.

Eles estão enraizados no tempo e resultam de lutas sociais que transformam a sociedade. A potência do movimento social nasce por estar perto das pessoas e ouvi-las. São os movimentos sociais que respondem necessidades silenciadas e não atendidas pela sociedade e pelo Estado.

No caso do Coletivo Filhas da Mãe, são demandas de cuidado e autocuidado. Demandas invisibilizadas, desvalorizadas e impostas a algumas pessoas, em sua maioria mulheres.

Ou sobre as demências, entre elas o Alzheimer. Diariamente escutamos e debatemos sobre o tema, orientamos como cuidar de pessoas idosas com demências. Conversamos sobre demências precoces, que acometem pessoas por volta de 40 anos. E sugerimos, a partir da própria experiência e nas evidências científicas, soluções para problemas nunca enfrentados pela pessoa que solicita ajuda.

Entre esses desafios, posso exemplificar dois, que eu mesma vivenciei: o que fazer quando o pai sai sozinho sem dizer para onde vai. Ou o que fazer frente a um bicho imaginário que ele enxerga na parede.

Temos buscado ouvir com sensibilidade e acolhimento temas sobre como lidar com surtos paranóicos da mãe que deu para esconder as coisas ou melindrar-se com gastos. Ou que não quer tomar banho.

Foi dessa forma que nasceu o Coletivo, levando em consideração Quem Cuida de Quem Cuida.

Primeiro com cinco mulheres lideradas por duas cuidadoras familiares experientes que apoiavam as cuidadoras iniciantes. Elas passaram por todo o processo amoroso, mas dolorido, invisibilizado e muitas vezes exaustivo de cuidar. Além do cuidado, é  preciso estimular o autocuidado.

Mas a grandeza das ações, regulares ao longo desses 04 anos, algumas semanais, são realizadas apenas e tão somente com trabalho voluntário. E é penosa! Não é à toa que algumas de nós adoecemos física e emocionalmente no caminho. E a demanda só aumenta. Diariamente.

O Coletivo tem múltiplas ações e chega a tanta gente que hoje está presente em boa parte do território nacional. Para alcançar ainda mais pessoas e políticos, se propõe a ajudar a construir uma Sociedade do Cuidado.

O Coletivo tem muitos projetos. Quer realizar mais pesquisas, dar cursos e palestras, ter mais programas nas mídias, escrever e publicar mais, promover mais debates, mais prevenção de saúde, promover a arte e a cultura como espaços de saúde mental. E aprender mais.

Mas isso só é possível com nossa institucionalização. Muitos editais que queríamos participar não podíamos porque o Coletivo não tem CNPJ. Muitas premiações não participamos por essa mesma razão. Quantos Conselhos e Fóruns Distritais e Federais nos convidaram para ingressar, mas sempre havia a exigência de existência legal. Então, que seja!

O Coletivo quer atuar para construir a Sociedade do Cuidado propondo políticas públicas, influenciar a opinião pública, conquistar a adesão das pessoas e pressionar as instituições. Sobretudo chamar a atenção do Estado para a centralidade do cuidado como componente da política de Estado.

Essa transformação é fundamental para escaparmos do individualismo e consumismo que comprometem nossa convivência comunitária e familiar.

Queremos visibilizar o cuidado como um direito humano: o direito de cuidar, de ser cuidada e ao autocuidado, lembrando que cuidado não tem gênero. O cuidado deve ocorrer com condições objetivas e apoios públicos que permitam transformações sociais profundas e produtoras do bem-viver. Isso é o que nos move.

Por tudo isso esperamos você na comemoração de 04 anos do Coletivo Filhas da Mãe. Sábado, 16/12, das 12 às 14h. Vamos fazer um almoço compartilhado (cada pessoa leva algo de comer ou beber).  A partir das 14h, ocorrerá nossa assembleia híbrida (presencial e virtual) de formalização do Coletivo Filhas da Mãe.

Local: SQS 108, Bloco B, Salão de Festas, em Brasília. Online na plataforma Zoom, clique aqui.”

PS: Há quatro anos escrevemos no feminino. Há quatro anos homenageamos as mulheres de todas as idades que cuidam sem remuneração.

PS2: Hoje é o último dia para participar da consulta pública sobre política nacional de cuidados. Sugerimos participar e enviar as propostas do Coletivo.

Cosette Castro

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