Meu Pai Quer Voltar para Casa. E Agora?

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Ana Castro & Cosette Castro

Brasília – Um dos temas mais recorrentes nos grupos de apoio sobre demências diz respeito aos familiares que pedem para “voltar para casa”.

Mesmo que se trate de uma casa imaginária, que existe apenas no mundo das lembranças da infância ou da adolescência, as famílias em geral, e as cuidadoras familiares em particular,  tendem a ficar sem ação ou resposta frente ao pedido.

Algumas cuidadoras ficam magoadas e até ofendidas com o familiar. É comum dar  uma resposta automática: “mas você está em casa”. E tentar convencer a pessoa doente de que está “tudo bem”. Mesmo que ela tenha esquecido e siga sem reconhecer a casa onde mora ou mesmo o seu quarto.

Você pode imaginar o pavor da pessoa com demência ao escutar que esse lugar irreconhecível é o seu lar, mesmo que seja dito por alguém que ela tem carinho, como uma cuidadora?

Sugerimos não tentar convencer, argumentar ou rebater a pessoa com demência. Ela não está mentindo. Não reconhece mais esse lugar como a sua casa.

Uma opção para evitar o sofrimento dos dois lados é desviar a atenção mudando de assunto.

Você pode falar de parentes e amigos que a pessoa ainda lembre. Ou mostrar álbuns de fotografias. Pode comentar casos engraçados que ocorreram na família. Convidar parentes (previamente avisados) a fazer vídeochamadas para “combinar a viagem”.

Outra possibildiade é combinar de “voltar para casa” depois do almoço, depois do lanche da tarde. Ou a noite, pois o trânsito é mais tranquilo.

Se o grau de ansiedade do paciente for grande e não for possível contornar a situação com outras histórias,  desça até o térreo com a pessoa doente, caso more em apartamento. Combine previamente com o porteiro ou uma vizinha, de avisar sobre uma tempestade fictícia que está por cair e sobre o risco de acidentes da estrada. E recombine a viagem para outro dia.

A desorientação espacial faz parte das características das demências e pode ocorrer no estágio inicial. Ela acontece quando o paciente não reconhece onde está. Neste caso, não é raro que a pessoa enferma tente fugir  para voltar ao “verdadeiro lar”.

Quando os pacientes moram  em uma casa, a possibilidade de sair é maior,  ainda mais se a pessoa possui níveis de independência. Às vezes,  a rua está ao alcance da porta ou de uma porta e um portão. Diferente dos apartamentos que, em geral, possuem portarias e câmeras de segurança.

O risco é que esses pacientes se percam na rua e não saibam voltar, pois não reconhecem mais trajetos que costumavam fazer sozinhos ou com outros familiares.

Vamos contar alguns exemplos. A Cosette tem um tio com Alzheimer.

É um dos irmãos da mãe, que também tinha Alzheimer. Ele conseguiu “sair” três vezes.  Foram mais cinco horas de desespero na família com buscas. Em uma delas, ele chegou ao centro da cidade até ser resgatado pela família. Outra vez, o filho recorreu à ajuda de taxistas do bairro para localizar o pai. A partir daí, a segurança foi reforçada e ele não ficou mais sozinho.

O padrasto da Ana saía de carro dizendo que ia a algum lugar e se perdia. A família ficava rodando o Lago Norte atrás dele. Já a mãe da Ana  escapava de carro, o que obrigou a família a tirar peças do veículo para que não funcionasse mais. O passo seguinte foi vender o carro.

A mãe de uma das participantes do Coletivo na semana passada fugiu mais uma vez, deixando a cuidadora trancada em casa. A sorte foi que o porteiro viu a paciente pela câmera de segurança e avisou o filho a tempo.

Outra participante, cuja mãe tinha Alzheimer, também fugia. Em uma ocasião,  escapou de camisola, foi atropelada e levada ao Hospital de Base em Brasília como indigente. Demorou para que fosse localizada.

Consideramos importante que os pacientes levem sempre consigo uma pulseira com dados pessoais e contatos dos familiares. Os dados e contatos também devem estar disponíveis na carteira, na(s) bolsa(s) e junto ao documento de identidade.

A portaria do prédio,  do condomínio, os vizinhos e atendentes de lojas próximas podem ser  bons aliados no cuidado. Podem ser contactados, sensibilizadas e receber (nos diferentes turnos) cartazes com fotos da pessoa com demência, assim como os contatos telefônicos de familiares.

O mais importante é não se desesperar e utilizar diferentes estrategias, de acordo com o perfil da pessoa. E lembrar: os pacientes não fazem isso contra você. Na medida que vão perdendo a memória, passam a viver em um mundo paralelo, perdidos em memórias entrecortadas.

PS: Nesta quinta-feira, 06/04, teremos Roda de Conversa On Line das 19 às 20h30 sobre temas relacionados às demências. Coordenação da fonoaudióloga Manoela Dias.

Cosette Castro

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