Na reta final do julgamento dos processos relacionados à Caixa de Pandora, o técnico em informática Francinei Arruda Bezerra, que editava os vídeos do delator da operação, Durval Barbosa, prestou depoimento ontem na 7ª Vara Criminal de Brasília. Durante a audiência, ele afirmou que Durval filmou outras autoridades recebendo dinheiro, além das que aparecem em vídeos entregues ao Ministério Público e veiculados pela imprensa. Entre os que teriam sido filmados está o deputado federal Rogério Rosso (PSD-DF). Francinei afirmou ao juiz ter editado “vários vídeos” em que Rosso recebia dinheiro das mãos do delator da Pandora. Essas imagens nunca foram repassadas ao MP, no acordo de delação premiada firmada por Durval. O parlamentar do DF repudiou as declarações e afirmou que o depoimento tem relação com o processo de sucessão na Câmara Federal.
Diante do juiz Paulo Carmona, titular da 7ª Vara Criminal, Francinei afirmou ter visto e editado vídeos de “Rogério Rosso, do Arthur, de um bem negrão e de um rapaz com crachá do Detran, que eu não sei quem era”. Segundo ele, em todos os casos havia recebimento de dinheiro. O técnico em informática não detalhou quem seriam as outras pessoas mencionadas. Mas, durante o depoimento, ele citou nominalmente Arthur Bernardes, secretário de Desenvolvimento Econômico e um dos principais assessores de Rogério Rosso. Segundo Francinei, Bernardes e o vice-governador do DF, Renato Santana (PSD), também aliado do deputado federal, frequentavam a casa de Durval Barbosa, quando o delator já estava sob a proteção da polícia, mas entravam por uma porta lateral, onde não havia o controle de policiais federais.
Muito explorado por advogados dos réus da Pandora, Francinei explicou como fazia o trabalho de edição dos vídeos de Durval Barbosa. Ele negou ter substituído áudios originais por outros, para simular conversas inverídicas. O técnico em informática disse que apenas separava as imagens em que havia recebimento de dinheiro, por meio do programa Vegas. Segundo Francinei, ele era o único que tinha acesso ao material captado pelas câmeras instaladas no gabinete e na casa do delator da Pandora.
Questionado se havia sofrido ameaças, o técnico em computadores de 35 anos contou que o seu carro foi incendiado em 2014, três dias depois de ele ter prestado um depoimento relacionado ao caso. A vizinha de Francinei avistou quando alguém colocou fogo no carro, que estava estacionado em frente à casa da testemunha, em Samambaia. O caso foi registrado na 21ª DP. “Eu tinha medo, ainda tenho muito medo. Quando vi na televisão sobre a morte de uma testemunha da Lava Jato, pensei que isso pode acontecer comigo”, afirmou.
No depoimento, Francinei afirmou à Justiça que Durval e Rosso “eram amigos íntimos” e que o deputado federal frequentava a casa do delator pelo menos duas vezes por semana. Quando Rosso virou governador tampão, em 2010, Arthur Bernardes é que passou a ir com frequência à residência de Durval, de acordo com o depoimento da testemunha.
Questionado se Durval usou a suposta gravação de Rosso para obter benefícios, o técnico em informática disse que o delator não extorquiu ou ameaçou o parlamentar. “Mas ele sempre teve poder sobre o Rogério. Ele tem um crédito com o Rogério”, afirmou Francinei, referindo-se a Durval Barbosa. “Rogério não gosta do Durval, mas tem que se reportar a ele”. A testemunha disse que depois de deixar o cargo de assessor de Durval no GDF, ele conseguiu um emprego no PSD, graças a Rosso. “Eu não tinha nenhum vínculo empregatício, recebia por fora. Às vezes, demorava dois meses para me pagar, mas aí o Durval chamava o Rosso e ele pagava”.
O deputado federal Rogério Rosso rechaçou as declarações de Francinei e afirmou que as afirmações são “uma tentativa sorrateira” de denegrir sua imagem no momento de discussão sobre a sucessão na Câmara. O líder do PSD é apontado como forte candidato à sucessão de Eduardo Cunha. “Repudio veementemente qualquer tentativa espúria, sórdida e reiterada de associar o meu nome a supostas práticas ilícitas e envolver pessoas honestas como eu, Renato e Arthur no rol de envolvidos neste processo”. “Tomaremos as medidas judiciais cabíveis que o caso exige”. Em nota, o PSD-DF afirmou que “repele com veemência as tentativas escusas de manchar o nome e a história política de seus principais quadros”.
O Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado do MPDFT declarou que essa é mais uma estratégia da defesa dos réus da Operação Caixa de Pandora. Afirmou ainda que a testemunha Francinei Arruda não tem credibilidade e entrou em várias contradições durante a audiência. Segundo o Gaeco, Francinei já havia afirmado em depoimento à procuradora da República Raquel Dodge que todos os vídeos editados já haviam sido entregues.
Antes de Francinei, o ex-distrital e ex-secretário de Justiça Alírio Neto também prestou depoimento como testemunha. A defesa de réus da Pandora questionaram o ex-deputado sobre fatos relacionados às eleições de 2006, quando José Roberto Arruda se elegeu governador do DF. A operação investigou um suposto esquema de compra de votos de parlamentares. Alírio afirmou à Justiça que “Durval é um grande mentiroso”. Segundo o ex-deputado, a base aliada de Arruda foi composta graças a negociações políticas, que envolveram nomeações de indicados de deputados distritais a cargos no governo.
Alírio disse nunca ter sido procurado por Arruda com a oferta de vantagens indevidas e declarou que o então governador também conseguia vitórias na Câmara Legislativa graças a um processo de debate com a sociedade. “A base aliada é construída com a oferta de espaço político dentro do Executivo. É só olhar agora para a formação do governo Temer. No Executivo estadual e municipal, também se faz assim”. Alírio disse ainda que Arruda sempre fazia uma análise técnica dos currículos dos indicados políticos. “Não é só cargo, é preciso apresentar à sociedade um bom trabalho para depois conseguir votos”, justificou.