“Se não estamos em colapso, estamos perto”, diz defensor público que pede aumento de restrições

Publicado em Eixo Capital

Entrevista com Alexandre Cabral, defensor público da União, autor da ação civil pública que pede a decretação de lockdown no DF. Por Ana Maria Campos

Arquivo Pessoal

Desde que a ação civil pública com pedido de medida cautelar para decretação do lockdown foi ajuizada, a taxa de transmissibilidade do DF caiu. Ainda é preciso adotar mais restrições para evitar a circulação das pessoas?

A taxa de transmissibilidade cair é uma boa notícia, mas ela precisa estar abaixo de 1 pra sinalizar equilíbrio e, depois, redução da curva. Se ainda está acima disso, é alta e mostra crescimento da pandemia. Por isso, o entendimento é de que mais restrições, pontuais, podem melhorar esse desempenho salvando vidas e protegendo a saúde de todos.

 

Há muitas queixas de filas para leitos de UTI, falta de vagas em enfermaria e pacientes dividindo equipamentos de ventilação. Podemos dizer que chegamos a um colapso na saúde pública do DF?

Se não estamos em colapso, estamos perto e a ideia é justamente evitar isso. Os profissionais de saúde, nosso heróis nessa crise, estão esgotados, pergunte a qualquer um da linha de frente. O governo faz esforços, criando leitos de UTI, mas é preciso lutar nas duas pontas, ampliar leitos e reduzir o contágio.

 

Como atingimos essa situação?

A pandemia tem dinâmica própria, mutações do vírus e outras características que resultaram na “segunda onda” no mundo todo. Ocorre que aqui pecamos pela falta de coordenação entre os entes públicos a permitir que esse novo agravamento, anunciado, nos antingisse tão fortemente. Faltaram: comunicação com o público, interação entre esferas de governo e planejamento de medidas.

 

Academias e escolas estão funcionando. Igrejas, não. Acha coerente?

Na nossa ação, pedimos o fechamento temporário dessas atividades (academias, escolas e locais de culto) até a inversão da curva de contágio e o equilíbrio do sistema de saúde (em especial de UTIs X demanda).

 

Como compatibilizar a saúde e o emprego numa pandemia?

O Estado precisa intervir com medidas ágeis. O auxílio emergencial não deveria ter sido suspenso, nem deve ser reduzido se o pior momento é agora. Também é preciso apoiar o empreendedor. O GDF prorrogou prazos para pagamento de impostos e promoveu a desoneração da taxa de ocupação de área pública. Acreditamos que é possível evoluir nisso. O principal para retomar emprego e lucro, porém, será sempre estar vivo e ter saúde, e não o contrário.

 

O toque de recolher funciona?

O toque de recolher é medida extrema e deve ser excepcional e temporário, apenas no ápice da crise. Tem sido adotado em inúmeros países e cidades, o que fala por sua eficácia. O que não parece lógico é impor uma medida tão grave no geral e permitir tantas atividades abertas como exceções individualizadas ou o transporte público lotado noutros horários.

 

Qual é a sua expectativa sobre a decisão da Justiça?

Espero uma decisão equilibrada e baseada em fatos e dados técnicos. Solicitamos desde o início uma audiência de conciliação para o debate e eventual acordo, outra possibilidade. A única pretensão da ação é resguardar a vida e saúde de todos no DF, da melhor e mais rápida forma possível.

 

A Defensoria pensa em adotar alguma medida jurídica para tentar acelerar a vacinação?

Não posso falar pela Defensoria do DF, nem por toda Defensoria Pública da União, cada membro age na sua atribuição com independência funcional. O que posso afirmar é que a DPU já acompanha o processo de vacinação em todo o Brasil e já atuou, por exemplo, via recomendação do nosso Defensor Geral Federal, dr. Daniel Macedo, para que as prioridades do plano nacional de vacinação sejam efetivamente observadas, evitando “fura-filas”. Não há, porém, como judicializar tudo que gostaríamos de ver acontecer. No tema das vacinas, por exemplo, é preciso que existam e estejam já no Brasil para que se pense, com alguma efetividade, em otimizar as medidas práticas de imunização.