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Em delação, consultor para transporte confessa crimes em vários municípios menos no DF

Publicado em CB.Poder

Quem apostou que o depoimento do advogado Sacha Reck em delação premiada ao Ministério Público do Paraná descortinaria todas as supostas falcatruas cometidas na licitação do transporte coletivo do DF, ocorrida no governo de Agnelo Queiroz, vai se frustrar.

Os termos da colaboração do advogado, a que o Correio teve acesso com exclusividade, vão na contramão do que muita gente acreditava ser uma forma de elucidar irregularidades na escolha das concessionárias de transporte na capital do país.

Alvo de 13 ações judiciais no DF e de dois processos no Tribunal de Contas do DF, Reck disse aos promotores no Paraná que cometeu vários “erros” em sua carreira, mas em Brasília foi diferente.

No DF, como em municípios do Paraná, Santa Catarina e São Paulo, ele teve papel fundamental em todas as etapas da licitação.” Eu não sou mentiroso. É porque lá (no DF) estão caçando um crime que não foi cometido”, afirmou na delação prestada aos promotores Vitor Hugo Nicastro Honesko e Leandra Flores, que atuam em Guarapuava (PR).

O Distrito Federal tem um capítulo inteiro na delação, com 86 páginas.

Se mentir, pode perder benefícios
A delação premiada de Sacha Reck será usada pela defesa do advogado como uma espécie de salvo-conduto, um atestado de idoneidade para a sua atuação no Distrito Federal.

Como, em tese, um colaborador é obrigado a dizer a verdade, sem omitir ou esconder nenhum fato criminoso, o depoimento prestado no Paraná deve ser usado como uma das principais peças de defesa de Reck no DF.

Ao acertar o acordo com os promotores do Paraná, o advogado conquistou alguns benefícios no processo, como redução de pena, quando confirmou fatos que já eram do conhecimento do MP, ou a garantia de não ser denunciado, quando apresentou fatos novos. “Se ficar comprovado que o colaborador mentiu ou omitiu alguma informação sobre uma atuação como organização criminosa em Brasília, ele poderá perder os benefícios da delação”, explica a promotora Leandra Flores.

Denúncia por organização criminosa

O depoimento de Sacha Reck foi prestado em 13 de julho de 2016, mas se tornou público por decisão judicial na semana passada.

A Justiça levantou o sigilo, depois que o Ministério Público do Paraná apresentou, há uma semana, denúncia contra Sacha Reck como integrante de uma organização criminosa que atuava em vários municípios para fraudar licitações de transporte.

Ele é apontado como alguém destacado pelo esquema para viabilizar as fraudes nas concorrências e em desvios de recursos, atuando diretamente com os agentes públicos responsáveis pelas licitações.

Ele atuava desde a formulação do edital direcionado até o julgamento das propostas apresentadas pelas concorrentes, garantindo a contratação da empresa que pagava pelos serviços do seu escritório. As acusações foram confirmadas pelo próprio advogado.

Mesmos argumentos
A denúncia dos promotores do Paraná descreve uma conduta exatamente como o Ministério Público do DF apontou na ação penal proposta contra Sacha Reck pela consultoria dada na licitação do transporte coletivo do DF.

Mais uma coincidência: promotores do DF e do Paraná apontam que os serviços prestados por Sacha Reck usurpavam funções que deveriam ser exercidas por procuradores do estado e do DF, de elaborar pareceres e análises jurídicas sobre o processo de licitação.

O advogado participou de tudo, da preparação do edital para divisão do DF em bacias até a desclassificação ou não de concorrentes.

No DF, nada muda
Para os promotores de Justiça que atuam nos processos sobre a licitação do transporte público do DF, o depoimento de Sacha Reck na delação premiada do Paraná não tem valor para mudar a convicção de que ele atuou diretamente para fraudar a concorrência, de forma a beneficiar grupos econômicos.

A aposta é de que, sobre o DF, ele mentiu. O Ministério Público do Paraná está em contato com os promotores daqui e vai compartilhar informações. Por enquanto, o depoimento não chegou às investigações no DF.

Bomba que não explodiu
A deputada Celina Leão (PPS), que esteve no Paraná para apurar as irregularidades ocorridas nas licitações de transporte e foi a mentora da CPI na Câmara Legislativa para apurar o assunto, acreditava que o depoimento de Sacha Reck seria uma bomba no Distrito Federal. Uma confissão.

Isso fica claro nas conversas que ela manteve com assessores em seu gabinete e que acabaram sendo registradas pelas escutas ambientais da Operação Drácon.

Contato com ex-deputada do PT
Nas primeiras perguntas a Sacha Reck, os promotores Leandra Flores e Vitor Hugo Nicastro Honesko fazem um questionamento a respeito de um e-mail que o empresário Antônio Carlos Marquezetti, também denunciado como integrante da organização criminosa, enviou ao escritório do advogado em 2010.

Era fim do governo de Rogério Rosso, na fase de transição para a gestão de Agnelo Queiroz (PT). No texto, Marquezetti diz que manteve contato com a ex-deputada Lúcia Carvalho (PT), num jantar, e eles conversaram sobre a política do governo na área de transporte.

Segundo Marquezetti, Lúcia prometeu que o novo secretário, assim que assumisse, entraria em contato com o grupo. E ressaltou no e-mail: “A Lúcia é muito influente no PT, inclusive muito próxima de Lula. No DF, ela foi deputada distrital por três mandatos e presidente da Assembleia. Legislativa do DF”. Na denúncia, ajuizada pelos promotores do Paraná, há uma semana, Marquezetti é descrito como “contato junto às administrações públicas”.

Sem influência petista
Sobre esse e-mail, Sacha Reck, a princípio, disse não se lembrar. Depois, afirmou não ser factível uma ingerência de Lúcia Carvalho na licitação porque a área de transporte, no governo Agnelo, não estava sob o comando do PT. “Essas coisas que o Marchezetti tá falando aí, na verdade, de fato, depois não tiveram procedência nenhuma, porque o Zé Walter (então secretário de Transportes) não é do PT. Inclusive parece que ele foi secretário ou ministro do governo Fernando Henrique Cardoso, tinha uma ligação com o PSDB”, disse Sacha Reck.