Ana Viriato
Responsável pela gravação dos áudios que embasaram a deflagração da Operação Drácon, a distrital Liliane Roriz (PTB) depôs a portas fechadas como testemunha de acusação, nesta segunda-feira (19/02), à Justiça local. As declarações foram prestadas no âmbito do processo por corrupção passiva contra o ex-secretário-geral da Câmara Legislativa Valério Neves; o ex-diretor do Fundo de Saúde do DF Ricardo Cardoso; e o ex-secretário da 3ª Secretaria Executiva da Câmara Legislativa Alexandre Braga Cerqueira.
A audiência durou pouco mais de uma hora e apenas os advogados da parlamentar e dos réus receberam autorização para acompanhá-la. Após prestar esclarecimentos, Liliane deixou a 8ª Vara Criminal de Brasília sem conversar com a imprensa. Advogada da distrital, Daniela Tamanini declarou o depoimento não foi aberto para preservar a cliente e evitar constrangimentos.
A Drácon destrinchou um esquema de destinação de sobras orçamentárias do Legislativo local, na cifra de R$ 30 milhões, para a quitação de dívidas do GDF com prestadoras de serviço em UTIs, em troca de propina.
Supostos integrantes do conluio, os distritais Celina Leão (PPS), Bispo Renato Andrade (PR), Cristiano Araújo (PSD), Julio Cesar (PRB) e Raimundo Ribeiro (PPS) não constam na ação, porque detêm foro privilegiado e respondem às acusações no Conselho Especial do TJDFT. Eles tornaram-se réus, mas impetram sequenciais recursos em instâncias superiores para travar o andamento processual.
Os investigados foram denunciados duas vezes por corrupção passiva, pois a negociata sobre a propina aconteceu em duas oportunidades distintas. A princípio, em troca dos valores ilícitos, a emenda parlamentar seria destinada ao custeio de reformas de escolas públicas — o presidente da Associação Brasiliense de Construtores (Asbraco), contudo, teria negado o acordo. Dessa forma, a negociação da sobra orçamentária chegou à Saúde.
Outras testemunhas
Testemunhas de defesa também foram ouvidas na audiência desta segunda-feira. Chefe de gabinete da Terceira Secretaria Executiva do Legislativo local à época da deflagração da Drácon, Donizete dos Santos afirmou que encontrou, por diversas vezes, Afonso Assad para tratar da descentralização de emendas do distrital Bispo Renato Andrade, então titular do setor. Contudo, esclareceu que, em nenhum dos encontros, ele e Alexandre Cerqueira requisitaram ao presidente da Asbraco vantagens indevidas para si ou para o deputado.
Ex-coordenador de Orçamento da Secretaria de Saúde e testemunha arrolada por Ricardo Cardoso, o depoente Vanderlan Ribeiro Vieira afirmou que os pagamentos a prestadores de serviços de leitos de UTI obedeceram ao critério de proporcionalidade, para que um número maior de empresas fosse agraciada, em vez de quitar os débitos de forma integral, na ordem cronológica.
O “negócio” das UTIs
Duas gravações realizadas pela distrital Liliane Roriz são apontadas como essenciais pela acusação. Uma delas, travada com Celina Leão (PPS). O Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT) alega que, no diálogo, “a acusada se preocupou em dizer à testemunha que ela também estaria no ‘projeto’, referindo-se ao esquema que beneficiaria os deputados distritais”.
Ainda segundo a denúncia, nessa conversa, “a acusada acrescentou que foi esclarecida pelos demais acusados sobre a razão da troca da emenda, externando, de forma clara, seu propósito de também ser beneficiada pela negociata, pois ‘se ajudar, tem que ajudar todo mundo’, referindo-se aos membros da Mesa Diretora”.
O outro diálogo de Liliane é o gravado com o ex-secretário-geral da Câmara Legislativa Valério Neves. Para o MP, nessa conversa, Valério “detalha a trama criminosa, revelando que os acusados Bispo Renato e Júlio César foram os intermediários da solicitação de propina junto à testemunha Luiz Afonso Assad e que o ‘compromisso’ beneficiaria os membros da Mesa, mais o deputado Cristiano Araújo”.
Na conversa, Valério diz ainda que, diante da negativa do presidente da Abrasco em ‘contribuir’ com os acusados, Cristiano Araújo buscou um ‘canal’ para pagar os hospitais e que o negócio poderia render, a título de propina, entre 5% e 10% do valor destinado à Saúde.