“Desconhecimento completo”, diz sobrinho de Niemeyer sobre críticas ao projeto do Memorial da Bíblia

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À QUEIMA-ROUPA
Paulo Sérgio Niemeyer, presidente do Instituto Niemeyer e bisneto de Oscar Niemeyer

Como foi feito o projeto do Memorial da Bíblia, cuja pedra fundamental foi lançada na semana passada? Seu bisavô, Oscar Niemeyer, deixou o projeto concluído?
Foi feito na década de 1980 e virou lei aprovada pela Câmara Legislativa. Depois de virar lei, faltavam os projetos básico e o executivo.

Quem encomendou?
O projeto sempre foi uma demanda da frente evangélica e dos católicos, porque reverencia e presta uma homenagem à bíblia, que é tombada como patrimônio histórico da humanidade. Há dois museus (com o mesmo enfoque), um em Washington e outro no interior de São Paulo. O projeto desse museu para Brasília é nacional, único e original, criado por Oscar Niemeyer.

Em que é inspirado?
Acredito que possa ter inspiração numa bíblia aberta. O Oscar, muitas vezes, gostava de ter alguma referência na questão do mimetismo, da arquitetura numa representação como nas curvas da mulher, nas nuvens, como ele gostava de dizer. E, como ele descreve numa frase no croqui original, o Museu da Bíblia tinha que surgir do chão como obra da natureza. Entendo também que ele pode ter se referenciado na questão da flor, numa obra de arquitetura que brota do solo. Considero também importante a referência ao Le Havre, na França, projeto muito emblemático do Oscar, que tem todas as características do Museu da Bíblia, como a praça rebaixada para a proteção dos ventos.

Como recebe as críticas do presidente do CAU de que o desenho seria apenas um rabisco adaptado para ter a assinatura de Niemeyer?
Recebo como um desconhecimento completo sobre a importância do croqui para Niemeyer. Todo arquiteto minimamente familiarizado com a obra de Niemeyer sabe que, quando ele fazia croqui, ali havia um projeto. E o Oscar gostava de dizer que quando a estrutura estava projetada ali estava a arquitetura. Ele tinha muita reverência à engenharia, a arquitetura da estrutura. Foi assim no museu de Niterói, foi assim com o Congresso Nacional, com a Catedral Metropolitana de Brasília. Foi assim com a Igrejinha Nossa Senhora de Fátima, foi assim com a Ermida Dom Bosco, com o Itamaraty, que é uma obra fantástica. Então, o Museu da Bíblia só tem a confirmar a genialidade do Oscar, com um balanço inédito incrível, uma audácia estrutural, como ele gostava de fazer. Esse projeto é muito forte e muito emblemático porque sintetiza o pensamento do Oscar na forma da arquitetura que ele faz.

Há um embate entre os herdeiros de Niemeyer pelo legado do grande arquiteto?
Não existe um embate. Eu sou o único arquiteto herdeiro do Oscar que continuou projetando. Trabalhava com Oscar e sou coautor em vários projetos de arquitetura, com o Centro de Arquitetura de Minas, como o Museu Luís Carlos Prestes, que terminamos após o seu falecimento, em 2012. Quase todos os projetos eram desenhados por Oscar e por mim. Hoje sou herdeiro do Oscar e responsável pelo inventário da minha mãe, Ana Elisa, junto com meus irmãos. Estamos tentando chegar num acordo sobre como dividir a herança. Mas estamos chegando numa solução que vai ser boa para todo mundo, com certeza. Afinal, todo trabalho deixado por Oscar é dos herdeiros.

E há embate partindo de arquitetos que reclamam de uma reserva de mercado para Niemeyer?
Existem arquitetos que reclamam da reserva de mercado para Niemeyer. Só que a maioria são grandes arquitetos que reverenciam o trabalho do Oscar. Ele é o maior arquiteto do mundo, na minha opinião e de vários arquitetos. É como ter uma obra do Picasso, do Salvador Dali, do Portinari, do Michelângelo, do Brunelleschi. A arquitetura do Niemeyer é estudada no mundo todo. Não tem como se formar em arquitetura sem entender a importância da arquitetura dele. E ele é brasileiro. Oscar nasceu no Rio de Janeiro, mas trabalhou no Brasil inteiro e no exterior. O país tem a obrigação de reverenciar e apoiar para que possamos realizar as obras inacabadas de Oscar. Estamos tentando criar em Brasília, com apoio da Secretaria de Turismo e do governador Ibaneis, um guia turístico para conhecer as obras de Niemeyer. Virá gente do mundo todo, para conhecer essa obra e entender como era o trabalho e o processo criativo dele. O Brasil ganha com o fim das obras inacabadas.

Qual a importância do Memorial da Bíblia?
Acredito que será um importante ícone de arquitetura da obra de Niemeyer e com grande visitação de pessoas do Brasil e do mundo, além de atender a um público cada vez maior de gente simples, temente a Deus, que acredita na Bíblia, Transforma Brasília numa cidade mais ecumênica.

Acredita que haverá recursos para a obra num momento em que se busca verba para a reforma do Teatro Nacional, fechado há mais de quatro anos?
Acredito. A maior parte virá de emenda da bancada evangélica. Então, evangélicos do Brasil inteiro vão captar recursos. O GDF apenas deu continuidade a uma lei de 1995 que já destinava o terreno para a construção do museu. Acho importante também deixar claro meu agradecimento ao (governador) Ibaneis e a toda a sua equipe. Só um governador com a qualidade dele é capaz de entender a importância de um projeto desse, concluindo e complementando o Eixo Monumental. O empenho do governador e de sua equipe para alinhar e fazer com que tudo dê certo tem sido fenomenal.

Ana Maria Campos

Editora de política do Distrito Federal e titular da coluna Eixo Capital no Correio Braziliense.

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