Da coluna Eixo Capital/ANA MARIA CAMPOS
À Queima Roupa: Senador Fabiano Contarato (PT-ES), líder do PT no Senado)
“Não há pulsão reacionária que detenha a força poderosa e construtiva do amor. No fim, a Justiça vai vencer”
A Comissão de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família (CPASF) da Câmara dos Deputados aprovou o relatório do deputado Pastor Eurico (PL-PE), que proíbe o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Qual será o impacto na vida de quem está casado se esse texto virar lei?
A verdade é que essa minoria intolerante quer palanque eleitoral para destilar ódio e preconceito. Essa meia dúzia de fundamentalistas tenta retirar direitos e humilhar todos que pensam e vivem de forma diferente. Mas é bom lembrarmos que o Supremo Tribunal Federal já reconheceu o direito ao casamento homoafetivo, e não se trata de privilégio, mas de direito à igualdade, como deve ser para qualquer cidadão, independentemente de cor, raça, religião ou orientação sexual. Nenhum projeto de lei, nem mesmo uma lei ordinária, tem o poder de sobrepor a Constituição, e foi essa a decisão do STF: do princípio da dignidade da pessoa humana, da igualdade. Em resumo, esse projeto é inconstitucional e, ainda que já fosse lei, não teria o poder de sobrepor a Constituição.
E na vida de casais que têm planos de seguirem uma vida juntos?
Sem o reconhecimento legal à união homoafetiva, não há a possibilidade de o casal decidir individualmente sobre doação de órgãos do companheiro ou da companheira, fazer visitas em hospitais no leito de morte ou decidir sobre velório. Não há como adotar filhos ou constituir pensões. Mas a verdade é que o principal impacto que os preconceituosos e intolerantes querem é humilhar, retirar direitos, diminuir e criminalizar a população LGBTQIA+.
Por que esse tema surge agora? Consequência de termos um Congresso mais conservador?
Como falei, é uma minoria barulhenta que tenta usar pautas e ataques ao próximo como palanque eleitoral. Mas não há pulsão reacionária que detenha a força poderosa e construtiva do amor. No fim, a Justiça vai vencer. Não acredito que o Brasil e o Legislativo vão se curvar ao discurso de ódio e ao retrocesso. Esse projeto passou apenas por uma comissão, onde fundamentalistas dominam o espaço. Agora, tenho certeza que o tema será debatido com seriedade e, em breve, será derrotado.
A Comissão entendeu que a união entre pessoas do mesmo sexo não pode ser equiparada ao casamento civil por questões que envolvem a “perpetuação da espécie”. É a visão de que o sexo tem como objetivo único a procriação?
Não. Essa é a visão de quem usa a religião para tentar justificar o ódio destilado ao próximo. Mas é impossível falar em Deus sendo intolerante. É impossível ser cristão tentando impedir o amor. Essa minoria tenta reduzir a família a um sistema preconceituoso e intolerante. Eu tenho dois filhos, duas crianças que são a razão da minha vida. Temos uma família com amor, respeito, fé e empatia. Isso não é família? Se família não é lugar de amor, o que é então?
O senhor e seu marido sofrem preconceito?
Sim, com ataques de todas as formas e por todos os lados. Um dos mais rasteiros ocorreu durante o processo de adoção do nosso filho Gabriel. Um promotor, sem pensar no bem do meu filho e no amor que colocamos durante todo o processo, quis negar a adoção alegando que não era possível a dupla paternidade. Não desistimos. Lutamos pela adoção e pelo Gabriel. E conseguimos. Hoje, ele e Mariana, que também foi adotada por mim e pelo meu marido, Rodrigo, são os amores das nossas vidas. Depois do episódio, fomos ao CNMP e membros do Ministério Público não podem mais se manifestar contra adoção por casais homoafetivos.
Como seus filhos lidam com esses conflitos?
Nossos filhos, Gabriel e Mariana, são os amores das nossas vidas. São a razão da nossa luta diária por um país mais justo, fraterno e igualitário. Os dois recebem amor incondicional. Para mim, isso é família. Mas sigo sonhando com o dia em que eu não serei julgado pela minha orientação sexual, que os meus filhos não serão julgados pela cor da pele, que as mulheres não serão julgadas pelo gênero. Projetos como esse nos mostram que esse dia ainda não chegou, mas nos dão ainda mais força para lutar contra todo e qualquer tipo de intolerância e preconceito.