Nas Entrelinhas: Renúncia com estilo

compartilhe

A proposta de um acordo com Dilma para antecipar as eleições e evitar o impeachment mostra a existência de setores do PT que dão a derrota como certa e tentam uma saída

A decisão do PMDB de deixar o governo, tomada ontem, numa reunião que durou apenas três minutos, pôs um ponto final no casamento de conveniência da legenda com o PT, que durou 12 anos. Foi o sinal para que as demais legendas da coalizão de governo iniciassem um movimento semelhante, como é o caso do PP, do PTB e do PR. A situação mais esquizofrênica é a do PSD, cujo presidente, o ministro das Cidades, Gilberto Kassab, liberou a bancada para votar como quiser e permanece no ministério, numa das pastas mais importantes.

Hoje, a expectativa de poder já gravita em torno do anexo do Palácio do Planalto, onde fica o gabinete do vice-presidente Michel Temer. A essa altura do campeonato, o baixo clero da base do governo na Câmara já fez a baldeação para o impeachment, à revelia ou com apoio tácito de seus líderes. Dilma conta de verdade com o PT, enquanto for conveniente para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e com o PCdoB, que estreita sua relação com a presidente da República para ocupar mais espaços na Esplanada. O PDT ainda apoia Dilma, mas já tem seu próprio projeto: Ciro Gomes. A estratégia do Palácio do Planalto de distribuir os cargos ocupados pelo PMDB entre os pequenos partidos é de eficácia duvidosa. Temer pode trucar e prometer os cargos atualmente ocupados pelos petistas àqueles que apoiarem o impeachment.

Entre os partidos de esquerda, o PPS forma na primeira fila dos defensores do impeachment — ao lado do PSDB, do DEM e do Solidariedade — desde quando a propostas parecia inviável e sem apoio popular. O PSB recentemente decidiu apoiar o impeachment, sem subterfúgios, após se afastar definitivamente do governo. O primeiro deve apoiar o governo de transição de Michel Temer, talvez até dele fazer parte, se o vive assumir de fato. O segundo tende a se manter à distância regulamentar e tentar articular uma coalizão com Marina Silva, cujo partido, a Rede, deve ser abster na votação do impeachment. A mesma posição é adotada pelo PSOL, que se opõe ao impedimento com certa estridência e, por isso, é acusado de linha auxiliar do PT pelos demais partidos de oposição.

Parlamentares do PT, PSB, PSOL, Rede e até do PPS, porém, articulam uma proposta de acordo para antecipação das eleições, por meio de emenda constitucional, em troca da não-aprovação do impeachment de Dilma Rousseff. Marina Silva, seria a maior beneficiária da redução do mandato de Dilma e acompanha as conversas por meio do líder da bancada, Alexandre Molon(RJ), sem se comprometer com a proposta.

Desconfiança
A proposta de um acordo com Dilma para antecipar as eleições e evitar o impeachment mostra a existência de parlamentares do PT que já dão a derrota como certa e tentam uma saída de olho no futuro, que pode ser até o surgimento de um novo partido. São esses setores que estão discutindo a desfiliação do PT e somente continuam na canoa do governo por causa da forte influência do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva nas suas bases eleitorais. Além da redução do mandato de Dilma, defendem sua desfiliação do PT e a formação de um governo técnico para conduzir o país até que as eleições aconteçam.

A tese é vista com desconfiança por gregos e baianos. Reflete certa dificuldade da esquerda não-petista em relação ao pós-Dilma, ou seja, ao governo de Michel Temer, caso o vice-presidente venha a assumir o poder. Além disso, ao contrário do impeachment, dependeria de uma decisão da presidente Dilma Rousseff, pois implicaria na renúncia à metade do mandato e no envio de uma proposta de emenda constitucional convocando as eleições.

Dilma tem reiterado que não pretende renunciar. Mesmo que o fizesse, dificilmente reuniria forças no Congresso para aprovar a antecipação das eleições, porque isso não interessa ao ex-presidente Lula, nem ao vice-presidente Michel Temer. Somente o presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG), e Marina Silva (Rede) se beneficiariam da proposta. Por isso, a tendência é que a articulação pró-antecipação das eleições morra na praia.

Isso não significa, porém, que elas não possam ocorrer. Assim como o processo de impeachment anda a passos de gazela na Câmara, o processo de cassação da presidente Dilma Rousseff e do vice-presidente Michel Temer no Tribunal Superior Eleitoral também pode ganhar velocidade. Depende apenas da Corte. O ponto de aceleração será o acolhimento do pedido de impeachment pela comissão especial, que deve precipitar a data de votação em plenário, provavelmente o dia 15 de abril.

Luiz Carlos Azedo

Jornalista

Posts recentes

Brasil fica mais perto da nova Rota da Seda

Os chineses tentam atrair a adesão do Brasil ao programa há anos. Até agora, os…

19 horas atrás

Plano era matar Lula, Alckmin e Moraes

As evidências colhidas por STF e PF apontam que o segundo documento-chave do plano, intitulado…

2 dias atrás

Lula ri por último na reunião do G20

O presidente brasileiro defendeu a taxação de operações financeiras de super-ricos, para financiar o combate…

3 dias atrás

Trump joga Lula nos braços de Xi Jinping

Vitória do republicano nas eleições americanas aproxima o petista do presidente chinês. Reposicionamento deve ficar…

5 dias atrás

Bomba implodiu a anistia de Bolsonaro

O uso da violência por extremistas de direita no Brasil pode, sim, ser enquadrado como…

7 dias atrás

Motta unifica o “Centrão” com desistência de Brito

Consolidou-se a hegemonia do chamado Centrão na Câmara, mas é um erro tratar as forças…

1 semana atrás