A agenda do governo se esgota com as reformas da Previdência e tributária. E a sociedade brasileira não tem um projeto de futuro, caminha para o pleito de 2018 com os olhos no passado
A delação premiada dos acionistas e executivos do grupo JBS desnudou os males do nosso capitalismo de laços, prestigiado e ampliado durante os governos petistas por meio da estratégia dos “campeões nacionais” adotada pelo BNDES sob comando de Luciano Coutinho. Essa política lançou o país na maior recessão de nossa história, fracassou devido à redução de ritmo de crescimento da China e à crise mundial, que encerraram a grande onda de expansão da economia global. E também porque fracassou a tentativa de adensamento da cadeia produtiva nacional, em vez de sua transnacionalização, que serviu muito mais à formação de cartórios e à corrupção sistêmica do que à salvação da indústria nacional.
Essa é a base estrutural, digamos assim, do colapso do modelo de capitalismo de Estado adotado pelos ex-presidentes petistas Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. Apesar de ultrapassado pela chamada quarta revolução industrial, porém, o nacional desenvolvimentismo não morreu nos corações e mentes de uma parcela da população brasileira, que não associa esse fracasso ao impeachment de Dilma Rousseff. Vem daí o relativo sucesso da narrativa do golpe adotada por aqueles que não querem rever as ideias velhas. Há um caldo de cultura para isso.
Para a população mais pobre, o nacional desenvolvimentismo está profundamente associado à Era Vargas, aos direitos trabalhistas da antiga CLT de inspiração fascista. Para setores da classe média, às realizações econômicas dos anos dourados do governo de Juscelino Kubitschek, cujo estilo e simpatia marcaram o processo de industrialização do país. JK manteve a estabilidade política, alcançou uma taxa de crescimento real de 7% ao ano e dobrou a produção industrial.
Acontece que o nacional desenvolvimentismo nunca foi monopólio de Vargas e de Juscelino. Nos anos de chumbo, essa estratégia também foi adotada pelos militares, principalmente nos governos Médici e Geisel, cujas ideias sobre a relação do Estado com a economia, no essencial, não se diferenciavam muito da esquerda tradicional brasileira, inclusive de setores que chegaram ao poder com Lula.
Polaridades
Mesmo abalado por denúncias de corrupção e com baixíssima popularidade, o governo Temer realiza a toque de caixa uma desmonte da Era Vargas. E inaugura um novo ciclo de modernização pelo alto, com apoio das elites do país, no embalo da globalização e da chamada quarta revolução industrial. A outra face desse processo, diante dos níveis de desemprego, é a criação de uma espécie de espaço vazio no qual as promessas populistas ganham terreno. Isso explica a recidiva eleitoral do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mesmo condenado na Lava-Jato, e a polarização que estabelece com Jair Bolsonaro, porta-voz do velho “partido da ordem”.
No mundo, o avanço avassalador das novas tecnologias não pede licença pra passar. “Estamos a bordo de uma revolução tecnológica que transformará fundamentalmente a forma como vivemos, trabalhamos e nos relacionamos. Em sua escala, alcance e complexidade, a transformação será diferente de qualquer coisa que o ser humano tenha experimentado antes”, adverte Klaus Schwab, autor do livro “A Quarta Revolução Industrial”.
Diante dessa imprevisibilidade, a reação mais natural é se agarrar ao que já existe, ou seja, a tomada de atitudes conservadoras. É aí que está o nó da conjuntura política. As reformas aprovadas pelo Congresso para destravar os agentes econômicos não equacionam os problemas políticos e sociais do país. Em primeiro lugar, há um divórcio entre as forças políticas que protagonizam essas mudanças e a maioria da sociedade, que não compreende direito o que está acontecendo e repudia as práticas políticas dominantes. Em segundo, o custo social da recessão provocada pelo colapso do modelo econômico não será revertido a curto prazo, o que alimenta a insatisfação popular.
Para os partidos governistas, o impacto eleitoral da Lava-Jato será muito maior do que o das reformas econômicas, ainda que alguns dos seus integrantes se beneficiem dos cargos que ocupam no governo. Vem daí a ameaça do que poderíamos chamar de uma espécie de “nacional populismo”, tanto à direita e como à esquerda. As pesquisas mostram que a mistura do velho discurso nacional desenvolvimentismo com a promessa de soluções fáceis para os problemas sociais encontra um terreno fértil. A agenda do governo Temer, isto é, das forças que aprovaram o impeachment, se esgota com as reformas da Previdência e tributária. E a sociedade brasileira não tem um projeto de futuro, caminha para o pleito de 2018 com os olhos no passado.
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