A votação de ontem mostrou que o governo ainda tem capacidade de iniciativa política e maioria folgada na Câmara
A Câmara aprovou ontem por 287 votos a 144 o pedido de urgência para acelerar a tramitação da reforma trabalhista. A tendência agora é tramitar a galope: na comissão especial, deverá ser aprovada na terça-feira, para ir ao plenário já na quarta, antes do 1º de Maio. Eram necessários, pelo menos, 257 votos favoráveis. Na noite de terça, requerimento idêntico foi rejeitado porque recebeu 230 votos a favor — 27 a menos do que precisava. Na ocasião, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), encerrou a votação antes que todos os parlamentares da base tivessem votado.
Entre os principais pontos da reforma estão: flexibilização da jornada; fragmentação de férias; remuneração por produtividade; formação de banco de horas; e regulamentação nas modalidades de trabalho por home office (trabalho em casa) e intermitente, no qual os trabalhadores são pagos por período trabalhado. Além disso, o fim da chamada contribuição sindical. Segundo o deputado Rogério Marinho (PSDB-RN), relator da reforma trabalhista, o “imposto” movimenta R$ 3,6 bilhões por ano e alimenta a atual estrutura sindical do país, que tem mais de 16 mil sindicatos.
Ontem, Rodrigo Maia admitiu que tentou um acordo com o PT para votar o projeto em 3 de maio, mas não teve sucesso. Talvez isso explique a estranha atitude que tomou na votação de terça-feira, quando deixou que a deputada Luíza Erundina (Rede-SP), na presidência da sessão, desse inicio à votação da reforma trabalhista de forma tumultuada. Depois, ao reassumir o comando da Casa, Maia encerrou abruptamente a votação, derrotando o governo. O presidente da Câmara tem um acordo de bastidor com o PT desde a sua primeira eleição.
A derrota gerou estresse no governo, mas serviu para reagrupar a base e formar uma nova maioria, que ontem aprovou com folga a urgência. De tudo o que está em discussão, o que mais importa para as centrais sindicais é a manutenção da contribuição. Talvez o governo esteja interessado num acordo para manter a cobrança compulsória de um dia de salário de todos os trabalhadores em troca de apoio das centrais sindicais à aprovação da reforma da Previdência. O fim da contribuição sindical obrigatória faria os sindicatos viverem de acordo com a realidade de suas categorias.
A votação da reforma trabalhista também serviria como um teste de força para aprovação da reforma da Previdência, logo a seguir. Esse é o cálculo que está sendo feito pelos articuladores do Palácio do Planalto, que já pressionam ministros e líderes para que garantam o apoio de suas respectivas bancadas, que sofrem pressões crescentes das corporações de funcionários públicos, que abominam a reforma da Previdência. A votação de ontem, porém, mostrou que o governo ainda tem capacidade de iniciativa política e maioria folgada na Câmara.
As negociações para aprovação da reforma da Previdência avançaram bastante nesta semana. Ontem, o relator da reforma, Arthur Maia (PPS-BA), apresentou seu parecer. Anunciou que proporá uma idade mínima progressiva para a aposentadoria de homens e mulheres. Começará em 53 anos para mulheres e 55 anos para os homens e será elevada gradativamente para 62 anos, no caso delas, e 65 anos para eles. A proposta original do governo previa uma idade mínima de aposentadoria de 65 anos para homens e mulheres. Essa regra seria aplicada para todos os homens com menos de 50 anos e para todas as mulheres com até 45 anos. Os demais entrariam em uma chamada regra de transição, que cobraria um pedágio em tempo de contribuição, para que as pessoas se aposentassem em uma idade intermediária entre a proposta do governo e a regra atual.
Protestos
Cresce no governo a preocupação com os protestos programados pelos petistas para 3 de maio em Curitiba, quando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva prestará depoimento ao juiz Sérgio Moro sobre o envolvimento na Lava-Jato. Um dos constrangimentos de Lula é a suspeita de que realmente seja proprietário do sítio de Atibaia (SP), o que ele nega categoricamente. O engenheiro civil Emyr Costa contou à Procuradoria-Geral da República (PGR), na delação premiada, que ajudou a elaborar um contrato falso para esconder que a Odebrecht havia executado a reforma da propriedade rural. O sítio está registrado em nome dos empresários Jonas Suassuna e Fernando Bittar, sócios do filho do ex-presidente Fábio Luís Lula da Silva. Segundo Costa, a Odebrecht gastou R$ 700 mil em dinheiro vivo com a obra.
Costa usava o dinheiro para pagar, semanalmente, engenheiros e operários e comprar materiais de construção para reforma do sítio. O engenheiro auxiliou o advogado Roberto Teixeira — amigo do ex-presidente — e o ex-dirigente da Odebrecht Alexandrino Alencar a redigir um contrato falso para maquiar o envolvimento da construtora na reforma do sítio. Outra dor de cabeça é a suposta delação premiada do ex-ministro da Fazenda Antônio Palocci, que já estaria em curso. Caso seja confirmada, a situação de Lula e da ex-presidente Dilma Rousseff ficará mais complicada, pois Palocci operou o caixa dois das campanhas dos dois, movimentando mais de R$ 130 milhões, segundo Marcelo Odebrecht.